A voz da professora não pode calar: sentidos, ações e interpretações no contexto da integralidade em saúde

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2015
Autor(a) principal: Brasil, Christina Cesar Praca
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Não Informado pela instituição
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://biblioteca.sophia.com.br/terminalri/9575/acervo/detalhe/102572
Resumo: As mulheres denotam maior predisposição ao desenvolvimento de alterações vocais do que os homens, por suas características anatômicas, fisiológicas e psicológicas. Pensou-se, pois, em estudar a voz, na perspectiva da saúde da mulher, observando-se a necessidade de as mulheres, especialmente as profissionais da voz, serem cuidadas. As professoras constituem um grupo numeroso entre as profissionais da voz, que faz uso intenso dessa função na vida pessoal, social e profissional; recebe influências do ambiente externo e não adota medidas de prevenção e promoção da saúde vocal de forma sistemática, fazendo com que o problema tenha baixa resolubilidade. Este trabalho objetivou compreender os sentidos da voz para as professoras do Ensino Fundamental, com base nas suas interpretações e ações ante a ocorrência de alterações vocais e os impactos na vida pessoal, profissional e social. Utilizou-se a metodologia qualitativa, por esta ser capaz de incorporar o significado e a intencionalidade como inerentes aos atos, às relações e às estruturas. O estudo também exprime dados quantitativos, de natureza analítica e transversal, que se unem aos qualitativos, em razão da possibilidade de complementação que as abordagens proporcionam. Para a coleta de dados quantitativos, aplicou-se um questionário semiestruturado, com 351 professoras do Ensino Fundamental de Fortaleza, dos seis distritos de educação, com idades de 24 a 66 anos. Na segunda etapa, foram realizados três grupos focais, incluindo um total de 26 professoras, de 19 escolas. Os dados foram coletados de dezembro de 2013 a junho de 2014. A análise quantitativa realizou-se por meio do programa SPSS versão 20.0, empregando-se a Estatística Descritiva e testes de associação. A análise qualitativa foi feita à luz da Análise de Conteúdo, identificando-se as temáticas de análise e os núcleos de sentido, cuja interpretação fundou-se no Interacionismo Simbólico. A caracterização sociodemográfica e profissional mostrou que a maior parte das professoras (75,8%) tem idade igual ou superior a 40 anos; 65,3% atuam em sala de aula há mais de dez anos; 71,8% têm carga horária semanal de trabalho em sala de aula começando com 40 horas, atuando principalmente (70,9%) em dois turnos. As condições de saúde das participantes revelaram que 54,1% já se afastaram de sala de aula por problemas de saúde; sendo os problemas vocais associados ou não a outros (36%) e os problemas psicológicos, os principais motivos de afastamento. Dentre as participantes, 53,8% têm mais de seis sintomas vocais; 45,9% consideraram-se expostas a mais de seis fatores de risco vocal; 55% denotam de um a três problemas crônicos de saúde; 89,7% nunca participaram de programa de saúde vocal promovido pela Secretaria de Educação de Fortaleza. Entre os problemas crônicos mais referidos, o refluxo/gastrite (43,6%), os quadros de sinusite/ rinite (30,5%), o estresse (29,1%) e os quadros de ansiedade/ nervosismo (26,2%) foram os mais evidentes. Quanto aos sintomas vocais mais frequentes, encontram-se garganta seca (77,8%), rouquidão (76,4%), aperto/ tensão na garganta (63,5%) e cansaço ao falar (62,4%). Considerando-se os fatores de risco, a indisciplina dos alunos (76,9%), o abuso vocal (72,9%), o estresse (58,1%), a temperatura desconfortável (57,5%) e o ruído ambiental (56,7%) configuram entre os mais apontados. O fonoaudiólogo é visitado anualmente por apenas 17,9% das participantes; porém, 98,9% consideram importante a inclusão deste profissional nas Secretarias Municipais de Saúde e de Educação de Fortaleza para a realização de ações de prevenção e promoção da saúde vocal. Quanto às percepções sobre a voz, 97,4% a consideram muito importante; porém, apenas 51,3 % relataram cuidar da voz no dia a dia, o que é realizado, principalmente, por meio da hidratação contínua (40,7%). As associações encontradas nos cruzamentos dos dados quantitativos mostraram que a manifestação dos problemas vocais não ocorre por causas isoladas, mas em razão da interferência conjunta de vários fatores sobre a saúde das professoras - dentre elas, as condições anatômicas e fisiológicas femininas, as interferências do ambiente e das condições gerais de saúde física e mental. A Análise de Conteúdo dos grupos focais favoreceu a definição de três temáticas, as quais coincidem com as três premissas do Interacionismo Simbólico ("conhecimentos e sentidos da voz para as professoras", "ação" e "interpretações e suas influências na mudança de comportamentos relativos à saúde vocal") e dez núcleos de sentido. Estes dados correlacionam-se entre si e mostram a visão das professoras sobre a saúde vocal. Nessa análise, verificaram-se fragilidades no conhecimento, ações baseadas na cultura popular, além de interpretações que podem conduzir a soluções a serem aplicadas para o enfrentamento do problema. Não foi observada a ideia de prevenção e promoção da saúde vocal sem algum vínculo ideológico com o tratamento ou os riscos de alteração. Conclui-se que o olhar das professoras revelou que o conhecimento e os sentidos atribuídos à voz são limitados e que elas consideram a voz como importante instrumento de trabalho e de interação social; porém, desconhecem aspectos relacionados à anatomia e fisiologia vocais, o que compromete a sua utilização. Essa visão oferece riscos à saúde vocal, uma vez que muitas delas consideram o adoecimento como um processo "normal" no exercício da docência. O comportamento e as ações das professoras em relação à voz advêm das interpretações pessoais e das relações com o ambiente e a comunidade escolar. Por isso, considera-se necessária a criação de estratégias que fortaleçam as ações voltadas à saúde vocal das professoras, levando-se em conta a sua condição feminina, seu ponto de vista e sua subjetividade, no sentido de fazer com que essas abordagens sejam significativas e possam ser incorporadas à vida diária. Verificamos, ainda, que a relação entre as três premissas do Interacionismo Simbólico (temáticas) acontece de forma cíclica, influenciando que as condutas relacionadas à saúde vocal sejam baseadas nas relações interpessoais, nas reflexões pessoais e nas influências do ambiente. Esse ciclo nos permitiu concluir que o sentido que as professoras atribuem à voz, a forma como agem em relação à sua saúde e como redirecionam seus comportamentos devem ser aprimorados por meio da mediação de profissionais capacitados em saúde vocal.