Impacto do Diabetes Mellitus Gestacional na funcionalidade dos músculos do assoalho pélvico avaliada pelo US-3D durante a gestação e após o parto

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2021
Autor(a) principal: Pinheiro, Fabiane Affonso
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: eng
Instituição de defesa: Universidade Estadual Paulista (Unesp)
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: http://hdl.handle.net/11449/214670
Resumo: Introdução: Os músculos do assoalho pélvico (MAP) representam elemento fundamental no suporte dos órgãos pélvicos, fornecendo suporte ativo tanto em repouso quanto durante a atividade. A contração coordenada e eficaz da MAP está relacionada à manutenção das funções de micção, evacuação e função sexual. Além disso, distensão adequada dos MAP pode favorecer o parto e provavelmente reduzirá a incidência de lesões nos músculos elevadores do ânus. A disfunção dos músculos do assoalho pélvico (DMAP) é distúrbio que afeta tanto a capacidade de contrair, distender, relaxar, controlar e coordenar os MAP, e está associada a sintomas como à incontinência urinária (IU), incontinência urinária de esforço, síndrome da bexiga hiperativa, prolapso de órgão pélvico, incontinência anal, dor pélvica, disfunção sexual, constipação e resulta em impacto negativo na qualidade de vida. Estudos de pesquisa associaram o Diabetes Mellitus Gestacional (DMG) com a DMAP. O DMG é definido como distúrbio de tolerância à glicose com início durante a gravidez e é cada vez mais comum em mulheres, afetando aproximadamente 8,3% das gestações em todo o mundo. A interação entre gravidez e DMG impacta na saúde materna precoce e de longo prazo. O DMG está associado a miopatia diabética, que se refere a alterações funcionais, metabólicas e estruturais que são induzidas pelo diabetes mellitus (DM) no músculo esquelético. Estudos clínicos demonstraram que o DMG impacta negativamente na atividade eletromiográfica dos MAP ao longo da gestação e, além disso, também altera a morfologia das estruturas dos MAP quando avaliada pela ultrassonografia tridimensional (US-3D). A DMAP em mulheres com DMG mostrou-se fator de risco independente para Incontinência Urinária Específica na Gestação (IU-EG) e fator de risco para IU dois anos após parto cesárea. Lesão que acomete o músculo reto abdominal durante a gestação também foi relacionada ao DMG. Estudos translacionais mostraram impactos prejudiciais tanto de hiperglicemia leve de longo prazo quanto de hiperglicemia severa de curto prazo no músculo de ratas grávidas uretrais como atrofia, adelgaçamento, desorganização, ruptura das fibras musculares e perda de tipos específicos de fibras de localizações anatômicas normais, denotando conexão entre os níveis de glicemia níveis e estrutura do MAP. Recentemente, protocolo de estudo clínico estabeleceu pesquisa de biomarcador bem desenvolvida em novo modelo conceitual do papel da integração da tríade DMG, IU-EG e miopatia hiperglicêmica como preditora de IU de longo prazo e DMAP. A avaliação do desempenho dos MAP é recomendada pela International Continence Society e International Urogynecological Association, e pode ser realizada por ultrassonografia (US) transperineal. A avaliação deve incluir o desempenho dos MAP em repouso e em atividades dinâmicas, como contração e distensão. A ultrassonografia tem sido relatada como método simples, não invasivo, de fácil execução e amplamente utilizado na prática clínica obstétrica como ferramenta de avaliação dos MAP. A técnica é de acesso fácil, sem radiação, desconforto mínimo, tem boa confiabilidade interobservador e interdisciplinar e permite avaliação dinâmica. Justificativa: Aprofundar e preencher lacunas do conhecimento sobre a repercussão do DMG e da miopatia diabética na gestação e a longo prazo. Não foram encontrados estudos que investigassem e avaliassem a funcionalidade dos MAP com US-3D durante a gravidez e acompanhamento no pós-parto de longo prazo, de gestantes expostas ao DMG. Também não foram encontrados estudos com proposta de avaliação do desempenho das atividades dos MAP (relaxamento, contração e distensão) de forma dinâmica e sequencial, assim como medidas de repouso intermediárias entre todas essas atividades realizadas e, fórmulas específicas para sua interpretação. Nesse contexto, analisar o desempenho da função dos MAP com medidas ultrassonográficas em tempo real é método dinâmico, valioso, objetivo e alternativo para orientar a prática clínica e científica nos cuidados preventivos e terapêuticos. Objetivos: 1) Analisar o efeito do DMG na funcionalidade dos MAP em dois momentos da gestação e no pós-parto avaliados pela US-3D. 2) Desenvolver modelo dinâmico ultrassonográfico para avaliação do desempenho dos MAP; e propor fórmulas para o cálculo dos índices de repouso, relaxamento, contratilidade, distensibilidade e mobilidade dos MAP. Além disso, desenvolver protocolos baseados no modelo e demonstrar sua aplicação e interpretação. 3) Interpretar o desempenho dos MAP de gestantes com ou sem IU-EG aplicando diferentes análises pelo PFM-US Diamater’s Protocol. Métodos: 1) Trata-se de estudo de coorte prospectivo realizado no Centro de Pesquisas em Diabetes Perinatal (PDRC) da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Medicina de Botucatu, Brasil. A declaração STROBE foi usada como guia para relatar este estudo. Os dados foram coletados em três momentos: 24-30 e 38-40 semanas de gestação e 6-12 meses pós-parto de março / 2016 a julho/2020. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CAAE 82225617.0.0000.5411). As gestantes foram recrutadas para participar do estudo durante a rotina de rastreio do DMG na 24-30 semanas de gestação no PDRC. Os critérios de inclusão foram gestantes com 24-30 semanas de gestação, 18-40 anos de idade, primigesta, gestação única, normoglicêmica e DMG com tratamento não medicamentoso. Foram excluídas as participantes com DM tipo I ou II, uso de hipoglicemiantes, triagem ou diagnóstico inadequado de DMG, tratamento farmacológico após falha no controle da glicose com modificação do estilo de vida e dieta, gestação anterior, doença do tecido conjuntivo, distúrbios neurológicos, prolapso ou cirurgia de incontinência, distúrbio hipertensivo gestacional ou pré-existente, incapacidade de realizar a sequência de contração dos MAP ou manobra de Valsalva máxima, limitações que impediram a conclusão total ou parcial em qualquer dos momentos de coleta, parto prematuro, morte fetal intrauterina, evolução para parto vaginal, diagnóstico de DM no pós-parto e nova gravidez antes de completar o acompanhamento. O diagnóstico do DMG foi realizado de acordo com os critérios da American Diabetes Association (ADA) e quando confirmado estas participantes foram alocadas no grupo DMG. As participantes com resultado negativo foram alocadas no grupo não DMG. As participantes foram submetidas a avaliação dos MAP pela US-3D considerando a área do hiato do levantador, entre 24-30 e depois com 38-40 semanas de gestação e respeitando o critério de ter decorrido no mínimo 10 semanas entre a primeira e a segunda avaliação durante a gravidez. Todas foram também avaliadas no terceiro momento entre 6 e 12 meses pós-parto. Todas as participantes forneceram consentimento informado previamente ao início da coleta de dados. 2) O modelo foi proposto para avaliar o desempenho dos MAP em suas diferentes atividades por meio da US e desenhado com base na importância de incluir, além da medida de repouso inicial, as medidas de repouso antes e depois de cada atividade realizada. Este conceito permitirá análise ampliada e detalhada do desempenho dos MAP entre os repousos, entre as atividades e repousos, bem como entre atividades semelhantes e/ou opostas. Além disso, consideramos que o modelo PFM-US Diamater’s Protocol é dinâmico, pois suas etapas podem ser organizadas de acordo com a necessidade do avaliador, bem como utilizado por pesquisador ou clínico. Adicionalmente, foram desenvolvidas fórmulas para calcular os índices de variação de repouso, relaxamento, contratilidade, distensibilidade e também o índice de variação de atividade entre atividades semelhantes e o índice de mobilidade relacionado à excursão muscular entre atividades opostas. Essas fórmulas podem ser aplicadas para qualquer medida obtida pela ultrassonografia, incluindo a área hiatal do elevador e diâmetro anteroposterior e transverso. Nesse contexto, os índices podem ser calculados em valores absolutos para medidas lineares (cm) e / ou valores percentuais (%) para medidas de área (cm2). Vale ressaltar que a versão final do PFM-US Diamater's Protocol foi obtida após revisão de três avaliadores voluntários externos: um com expertise clínica (M.G.O.), um com expertise em pesquisa (C.B.P.) e outro sem expertise em avaliação ultrassonográfica dos MAP (A.A.P.). Para demonstrar a avaliação e a aplicação das fórmulas foi realizado estudo transversal no Centro de Pesquisas da FMB, Botucatu, SP, Brasil. (CAAE 82225617.0.0000.5411) Quinze mulheres caucasianas assintomáticas entre 20-30 anos foram incluídas no tutorial demonstrativo para aplicação e interpretação do US no PFM-US Diamater’s Protocol. 3) Estudo transversal realizado no Centro de Pesquisas Perinatal (CPP) da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Medicina de Botucatu, Brasil, pelo Grupo de Estudos Diamater. A coleta de dados foi realizada entre novembro de 2019 a fevereiro de 2020. No total, 49 gestantes foram incluídas nesta análise e distribuídas em dois grupos: mulheres com IU-EG (n = 23) e sem apresentar IU-EG (n = 26). Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista (UNESP), Botucatu, Estado de São Paulo, Brasil (CAAE: 82225617.0.0000.5411). As mulheres foram convidadas a participar durante a sala de espera para rotina do pré natal a partir da 24ª semana de gestação no (CPP) e foi obtido o termo de consentimento livre e esclarecido de todas as participantes incluídas. Os critérios de inclusão foram gestantes maiores de 18 anos, continentes ou incontinentes com início específico na gestação atual. Mulheres com IU pré-gestacional, diabetes conhecido tipo 1, tipo 2 ou DMG e aquelas que se recusaram a participar não foram incluídas neste estudo. Foram excluídas também as participantes que durante a avaliação do assoalho pélvico não conseguiram realizar uma correta contração ou uma manobra de Valsalva máxima dos MAP e aquelas em que as imagens ultrassonográficas apresentaram falha técnica. Foi aplicado um questionário para coletar os seguintes dados: etnia, tabagismo na gravidez, atividade física na gravidez, escolaridade, idade na gravidez, semanas de gestação, índice de massa corporal (IMC) pré-gravidez e na gravidez e também ganho de peso materno. O exame físico foi realizado por uma fisioterapeuta (Pinheiro, FA) com 8 anos de experiência em treinamento e exame dos MAP. Na primeira etapa do exame físico todas as participantes foram orientadas sobre como realizar a seguinte sequência: repouso, contração dos MAP e distensão dos MAP pela manobra de Valsalva. Um experiente investigador (Sartorão Filho, CI) adquiriu as imagens pela ultrassonografia tridimensional transperineal (US-3DTP) dos MAP. O conjunto de dados de imagem foram obtidos seguindo o PFM-US Diamater’ Protocol 1. Para avaliar o desempenho dos MAP em repouso e durante as suas diferentes atividades, 5 imagens diferentes em sequência e cores foram coletadas. Ao final, as imagens foram salvas de forma anônima e analisadas offline em uma ordem aleatória por números de código anônimos. Além disso, fórmulas matemáticas foram aplicadas para calcular os índices de variação da área do hiato do levantador (HL) em valores absolutos (cm2) e percentuais (%). Resultados: 1) 48 participantes foram incluídas na análise final, sendo 20 no grupo DMG e 28 no grupo não-DMG. A comparação entre os grupos em cada momento de avaliação em relação as medidas obtidas pelo US-3D dos MAP, mostrou diminuição em todas as variáveis nos valores absolutos e diminuição na variação da contração e mobilidade no segundo momento no grupo DMG. No pós-parto apresentou diminuição do repouso e da contração nos valores absolutos das medidas quando comparado ao grupo não-DMG. Na presença de efeito de interação dos grupos dentro dos momentos e dos momentos dentro dos grupos em relação às medidas dos MAP demonstrou em repouso que o comportamento do grupo não-DMG no segundo momento foi significativamente maior quando comparado ao primeiro e terceiro momentos. Na distensão, o grupo não-DMG no primeiro momento teve medida menor que o segundo momento, e o primeiro e segundo momentos tiveram medidas significativamente maiores quando comparados ao terceiro momento. No grupo DMG, o segundo momento teve medida significativamente maior quando comparado com o terceiro momento. O grupo não-DMG também apresentou maior medida que o grupo DMG no segundo momento. Na ausência de interação, os grupos foram comparados independentemente dos momentos e momentos foram comparados independentemente dos grupos. Foi observada na contração, medidas menores no não-DMG e segundo momento medidas maiores que primeiro e terceiro momento. A variação entre a contração em repouso demonstrou no grupo não-DMG medida menor do que no grupo DMG e a variação entre distensão em repouso no primeiro e no segundo momento foi significativamente maior do que no terceiro momento. A análise de interação da variação mobilidade apresentou maior medida no grupo não-DMG em relação ao grupo DMG. O primeiro e o segundo momentos tiveram mobilidade maior do que o terceiro momento. 2) PFM-US Diamater’s Protocol foi desenvolvido e é possível visualizar o modelo no desenho esquemático. A sequência de atividades dos MAP a serem realizadas estão apresentadas em balões e com setas conectando os balões e indicando as fórmulas a serem aplicadas, tanto. em valores absolutos para medidas lineares (cm) quanto em valores percentuais (%) para diferenças entre as medidas. Desta forma, nosso modelo apresenta a possibilidade de calcular a variação de repouso, relaxamento, contratilidade, índices de distensibilidade, índice de variação de atividade e índice de mobilidade. Além disso, quatro protocolos foram desenvolvidos como exemplos do PFM-US Diamater’s Protocol, considerando diferentes combinações de atividades dos MAP em repouso, contração e distensão. Desta forma, siglas e números foram substituídos de acordo com cada protocolo proposto. Foram desenvolvidos 4 protocolos demonstrativos seguindo o desenho esquemático do modelo. Os resultados relacionados à aplicação e interpretação do tutorial demonstrativo, de um dos 4 protocolos, dessa amostra hipotética, demonstrou que não houve variabilidade nesta população considerando a análise em valores absolutos, contudo houve variabilidade nos resultados quando considerada a diferença em todas as atividades, nas proporções em diferenças percentuais. Dependendo da atividade realizada e da fórmula aplicada, os resultados podem gerar resultados positivos ou negativos e estão relacionados ao aumento ou diminuição da área do hiato do elevador. 3) 49 gestantes foram alocadas em um grupo sem IU-EG (n = 26) e em um grupo com IU-EG (n = 23). As informações demográficas da população do estudo, foram semelhantes entre os grupos. A comparação das medidas da área do hiato do levantador (HL) em valores absolutos (cm2) entre os grupos, mostrou que as variáveis dos MAP (repouso basal, contração, repouso pós-contração, distensão, repouso pós-distensão) foram significativamente maiores no grupo IU-EG. A comparação dos índices de variação da área do HL em valor absoluto (cm2) entre os grupos, apresentou menor índice de variação do repouso 2 para o repouso 1 e do repouso 2 para o repouso basal no grupo IU-EG, bem como um índice de relaxamento mais negativo após distensão quando em comparação com o grupo sem IU-EG. Realizando os mesmos cálculos com as medidas da área do HL em porcentagem (%), encontramos diferenças mais significativas entre os grupos. O grupo IU-EG apresentou menor índice de variação do repouso 2 ao repouso 1, índice de variação mais negativo do relaxamento após distensão, menor índice de mobilidade da distensão à contração e da contração à distensão, menor índice de distensibilidade em relação ao repouso basal e menor índice de variação do repouso 2 ao repouso basal quando comparado ao grupo sem IU-EG. A comparação intragrupos da área do HL em valor absoluto (cm2) nos três momentos de repouso (repouso basal, repouso 1- pós-contração e repouso 2- pós-distensão) apresentou menor medida de área de HL em repouso basal e repouso 1 (pós -contração) em comparação ao repouso 2 (pós-distensão) no grupo sem IU-EG e medição de repouso basal maior do que o repouso 1 no grupo IU-EG. Por fim, a comparação da área do HL em valor absoluto (cm2) entre os grupos e para os três momentos de repouso demonstrou que, no grupo sem IU-EG, todas as medidas de repouso da área do HL (repouso basal, repouso 1 e repouso 2 foram significativamente menores em relação ao grupo IU-EG. Conclusão: 1) A disfunção da musculatura do assoalho pélvico no final da gestação e pós-parto de longo prazo, determinada pela US-3D, está relacionada ao Diabetes Mellitus Gestacional. 2) PFM-US Diamater’s Protocol foi desenvolvido com sucesso para avaliar o desempenho dos MAP pela ultrassonografia. O tutorial demonstrativo sobre como aplicar e interpretar diferentes índices de desempenho dos MAP também foi demonstrado por meio de um dos quatro protocolos de avaliação. 3) Gestantes com IU-EG apresentaram diferente desempenho dos MAP avaliados pelo US-3DTP. A interpretação dessas diferenças é distinta dependendo das fórmulas aplicadas. Os resultados do índice de variação em porcentagem demonstraram diferenças em mais variáveis quando comparados ao índice de variação em valores absolutos. Os resultados obtidos por meio deste estudo indicam que gestantes com IU-EG apresentam maior área do HL em todas as atividades avaliadas, bem como pior desempenho para relaxamento, contração e distensibilidade dos MAP.