A ineficácia e a revogação de negócios jurídicos na insolvência: uma análise da sua racionalidade e dos seus limites no direito brasileiro

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2023
Autor(a) principal: Gadig, Bárbara Felix Fazzano
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2132/tde-11032024-091217/
Resumo: A presente tese analisa os fundamentos da ineficácia e da revogação de negócios jurídicos no direito brasileiro. A base da análise será a lei 11.101 de 2005 (LRF). O esquema de proteção dos credores, que é o cerne deste estudo, só pode ser compreendido por meio dos fundamentos jurídicos e da racionalidade econômica do sistema de insolvência. Portanto, é essencial entender as diferentes razões para a existência de um direito de proteção dos credores no período que antecede a abertura do procedimento de insolvência. A natureza jurídica da ineficácia e da revogação de negócios jurídicos não pode ser corretamente situada sem a abordagem dos princípios do direito da insolvência. A falta de clareza sobre as razões para a ineficácia objetiva (art. 129) e a revogação de atos (art. 130) leva a antinomias sistemáticas que serão problematizadas ao longo deste estudo. Além do mais, as justificativas jurídico-morais (no caso da constante referência à fraude) e a referência ao princípio da igualdade de tratamento dos credores não são suficientes para justificar a existência destas regras no regime de insolvência. Assim, buscar-se-á problematizar os fundamentos além das suas bases históricas, ainda muito enraizadas no delito civil e na ação pauliana. A análise da evolução da matéria na insolvência foi necessária para compreender em que momento a fraude e as preferências foram aproximadas, e em que contexto isso ocorreu. Adicionalmente, ao longo dos anos, com o desenvolvimento da matéria e os debates acadêmicos que surgiram, a partir dos anos 80, no direito norte americano, a teoria econômica foi aproximada do direito da insolvência. Essa aproximação influenciou o tratamento da matéria no direito brasileiro, o que fica claro no tratamento da recuperação judicial, como será referido neste trabalho. Contudo, alguns aspectos importantes do regime de falências, como, por exemplo, a Seção IX da LRF, que trata a ineficácia e da revogação de atos praticados antes da falência, receberam menos atenção. O estudo sobre o desenvolvimento da matéria no direito brasileiro desde o Código Comercial de 1850 mostrou que, substancialmente, as razões para a ineficácia e para a revogação de atos são fundamentalmente as mesmas desde o Decreto 917 de 1890. Assim, tanto quanto foi possível constatar, os artigos 129 e 130 da Lei 11.101 de 2005 estão obsoletos e não refletem os objetivos do direito da insolvência. Nesse contexto, procedeu-se ao estudo crítico de ambas as hipóteses legislativas para apontar suas lacunas, deficiências e sugestões de melhoria. A importância da proteção dos credores à luz da situação de insolvência e do direito da insolvência com relação a políticas econômicas são pontos de partida necessários para a compreensão destas normas e da sua função que não pode se distanciar dos objetivos da lei. Esta consideração não pode obnubilar o fato de que os credores não são os únicos interessados, bem como o tratamento da falência pelo direito também tem implicações econômicas e sociais. Como ponto de partida, o foco é colocado nos atos jurídicos que são praticados antes da abertura do procedimento concursal e que têm efeito prejudicial sobre os credores. A análise foca nos aspectos materiais do direito da insolvência, buscando conexões com o direito da empresa. Aspectos processuais foram referidos, mas não são objeto deste trabalho. A abordagem foi feita sob o prisma jurídico e econômico, o que permitiu uma análise tridimensional destas regras e sua funcionalidade no ordenamento jurídico e no mercado. No contexto de interdependência econômica em que o Brasil está situado, a análise não pode ser efetuada sem o auxílio do direito comparado. A perspectiva comparada não serve o propósito de descrever como estas regras funcionam em outras jurisdições, mas sim de auxiliar para encontrar os fundamentos jurídicos destas regras e possíveis soluções para os problemas encontrados. O direito alemão e o direito inglês são os principais sistemas de comparação. O direito alemão por ser um sistema baseado na Civil Law e pelo tratamento das regras de proteção aos credores orientados para a satisfação dos credores. Além do mais, o direito alemão teve forte influência sobre o direito português, que também será analisado no estudo comparado. O direito inglês em razão do destacado papel na evolução histórica da matéria por meio com o contributo da sua jurisprudência. Outros sistemas jurídicos, como o italiano, francês, espanhol e norte americano, também foram referidos ao longo desta tese. Na primeira parte do trabalho, foi feito um escorço sobre os fundamentos do direito da insolvência e os seus princípios. Foram ainda analisadas algumas teorias sobre lógica econômica do tratamento da insolvência, seu papel no mercado e suas funções no sistema. A discussão serviu de base para a análise a seguir sobre os princípios do direito da insolvência e a importância da igualdade de tratamento entre os credores. Com base nestes pontos, seguiu-se para uma breve referência sobre a determinação jurídica do conceito de insolvência, e a importância do momento de abertura do procedimento. Estas discussões serviram de base para seguir com o aprofundamento do estudo sobre a ineficácia e a revogação de negócios jurídicos. No Capítulo segundo, foi traçada uma linha histórica sobre o desenvolvimento da fraude contra credores na insolvência. O papel da jurisprudência inglesa no desenvolvimento e aproximação da fraude às preferências foi destacado, bem como a recepção e o desenvolvimento da matéria no direito brasileiro desde o Código Comercial de 1850. A discussão sobre os efeitos jurídicos, centrada na dicotomia entre a anulação e a ineficácia foi referida, mas não foi aprofundada. A tônica foi analisar as sucessivas alterações legislativas e seu reflexo no tratamento da matéria até os dias atuais. Na segunda parte deste estudo, a partir do Capítulo terceiro, os princípios e fundamentos das regras de ineficácia e revogação foram aprofundados e buscou-se indicar as diversas teorias sobre a natureza jurídica destas regras no tratamento da insolvência. Embora a proteção aos credores deva ter características próprias do regime da insolvência, o papel da ação pauliana na moldura destas regras é evidente. Também se procedeu a análise do papel ex ante e ex post para apontar a função destas regras como mecanismo para mitigar o risco de oportunismo do devedor, regular a assimetria de informação e evitar a destruição de valor no período que antecede a falência. No penúltimo capítulo, foi feita a análise crítica da ineficácia objetiva e da revocatória falimentar no direito brasileiro. Como ponto de partida, os pontos em comum entre a revocatória falimentar no direito da insolvência e a ação anulatória (ou pauliana) no direito civil foram analisados, assim como a análise sistemática dos institutos. No entanto, o trabalho não tem como objetivo uma comparação entre a revocatória falimentar e a ação pauliana, servindo a análise apenas para clarificar os princípios do direito da insolvência. Assim, como será demonstrado, a conclusão foi de que o rol de atos ineficazes do art. 129 precisa ser ampliado, e o elemento subjetivo do art. 130, confinado à prova do conluio fraudulento entre o devedor e o terceiro, deve dar lugar à critérios mais objetivos e técnicos, como o conhecimento da insolvência. Feita a análise crítica, foram apontadas as lacunas legislativas. No último capítulo, foram apontados problemas estruturais e o direito comparado serviu como ponto de apoio para a análise e sugestões de melhoria dos problemas apontados. O Guia Legislativo da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (UNCITRAL) e a Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu para harmonizar certos aspectos do direito da insolvência, inclusive o tratamento das regras de anulação de negócios (COM 2022 / 702), serviram como referencial para as sugestões de lege ferenda que foram feitas.