\'Recantilados\', entre o direito e o rentismo: grilagem judicial e a formação da propriedade privada da terra no norte de Minas

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2017
Autor(a) principal: Costa, Sandra Helena Gonçalves
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8136/tde-09012018-154704/
Resumo: A questão agrária em Minas Gerais é permeada por conflitos e por uma estrutura fundiária concentradora, cujas raízes encontra-se no processo de formação da propriedade privada da terra. Buscando compreender essa questão, a partir de uma leitura geográfica, analisei processos de divisão e demarcação de terras particulares, que tramitaram na antiga Comarca de Grão Mogol, no Norte de Minas Gerais. Esses processos tiveram amparo jurídico no Decreto Nº 720 de 05 de setembro de 1890 promulgado durante o Governo Provisório e insere-se no conjunto de medidas legais que permearam a transferência do controle das terras devolutas para os Estados. A divisão e demarcação de terras foi uma estratégia geopolítica utilizada pelas elites fundiárias locais e regionais para se apropriarem das terras públicas devolutas. Nas décadas de 1920 e 1930, quando tramitaram os processos de divisão e demarcação de terras no Norte de Minas Gerais, teve início a grilagem judicial que transformou grileiros em proprietários de terras. Esse processo desigual de apropriação privada das terras públicas envolveu a extração da renda fundiária, em diferentes contextos, que se somaram ao longo do avanço do modo de produção capitalista sobre as terras soltas, terras livres, de uso comum nos gerais. A partir da década de 1960, em decorrência de mais uma aliança entre o Estado e os rentistas (elites locais e empresas de plantio de madeira para produção de carvão para as siderúrgicas), através da SUDENE e RURALMINAS, na fração do território estudada, por meio de contratos de arrendamentos foram entregues mais de 500 mil hectares de terras devolutas a empresas, que desmataram o Cerrado e a Caatinga e invadiram as terras de morada, trabalho e reprodução da vida das famílias camponesas geraizeiras. O pacto rentista, segue em curso, com a territorialização dos monopólios das empresas monoculturas de árvores e de exploração mineral. Como consequência desse processo desigual e contraditório, iniciado com a adjudicação de terras na década de 1930, desdobrou-se a retaliação fundiária, conceito que utilizo para explicar dois movimentos: de um lado, realiza-se o confinamento das famílias geraizeiras em porções recortadas de terras alheias às suas práticas costumeiras de uso, submetendo camponeses ao trabalho nas carvoarias ou no plantio de eucalipto e até a expulsão de suas terras de morada. De outro lado, as lutas geraizeiras pela conquista e retomada de suas terras de uso tradicional, ao qual se somam as lutas territoriais indígena e quilombola. Esta tese também tem o propósito de evidenciar o embate dialético colocado entre o direito e o rentismo, a partir da análise da disputa também judicial pela autodemarcação do Território Tradicional Geraizeiro do Vale das Cancelas, abrangendo terras nos municípios de Grão Mogol, Josenópolis, Riacho dos Machados e Padre Carvalho, atualmente distribuídos na jurisdição das Comarcas de Grão Mogol, Porteirinha e Salinas, cujas terras têm sido alvo da prática da grilagem judicial e do processo de retaliação fundiária, iniciado com as ações de divisão e demarcação de fazendas, dentre as quais, algumas sequer existiram, mas que tiveram sua origem documental judicialmente legitimadas.