Resumo: |
No colonialismo tardio, a imprensa moçambicana marcou-se por uma heterogeneidade de publicações, voltadas sobretudo ao público das classes dominantes da então província portuguesa. Uma exceção constituiu a segunda fase do jornal Voz Africana, editado na Beira a partir de 1962 e distribuído por todo o território, direcionado - a despeito das muitas dificuldades - às camadas subalternas da população. Logo após o seu ressurgimento, a seção de cartas do semanário adquiriu o protagonismo da atenção do leitorado, ensejando a impressão de cartas com desabafos, denúncias e discussões acerca das brutalidades diuturnas da situação colonial e do racismo. Mais do que isso, naquele espaço impresso pessoas de diferentes localidades procuravam compreender e sugerir mudanças capazes de ampliar os seus direitos e os de seus semelhantes, tomando por base as tímidas reformas liberalizantes colocadas em marcha pelo Estado Novo salazarista. Apesar da revogação do Estatuto dos indígenas em 1961, a cidadania, supostamente estendida à toda a população das colônias, não se concretizou na empiria cotidiana. Em busca de respeito por parte das autoridades coloniais, e articulando os novos direitos presentes no papel, missivistas ocuparam o segmento epistolar do jornal para demandar por uma dignidade historicamente vetada, constituindo, assim, uma comunidade impressa bastante polifônica e ativa. Nesta pesquisa, o foco recairá sobre os dois primeiros anos da nova roupagem do semanário, período prolífico por se situar entre o estopim da guerra de libertação em Angola, a separação de Goa e o próprio início das lutas armadas em território moçambicano. |
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