O papel dos análogos do GLP-1 na função de ilhotas pancreáticas e na morte encefálica

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2018
Autor(a) principal: Lemos, Natália Emerim
Orientador(a): Crispim, Daisy
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Não Informado pela instituição
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: http://hdl.handle.net/10183/188946
Resumo: O diabetes mellitus tipo 1 (DM1) é caracterizado pela destruição autoimune das células-beta pancreáticas, o que causa a deficiência total da produção de insulina e a necessidade de administração de insulina exógena para a sobrevivência. A terapia intensiva com insulina é capaz de reduzir o surgimento e a progressão das complicações crônicas do diabetes. Entretanto, as hipoglicemias severas associadas a este tratamento constituem um grave efeito colateral, especialmente em uma fração dos pacientes com DM1 que apresentam controle metabólico instável e episódios frequentes de hipoglicemias graves sem sintomas adrenérgicos de alerta. Para estes pacientes, o transplante de ilhotas pancreáticas é uma terapia efetiva em restabelecer a secreção de insulina, controle glicêmico e a percepção das hipoglicemias. No entanto, ao longo do processo do isolamento de ilhotas do pâncreas de um doador em morte encefálica (ME) e posterior enxerto no receptor ocorrem perdas importantes no número e qualidade das ilhotas, as quais impactam o desfecho do transplante. Dessa forma, frequentemente, são necessários transplantes de ilhotas de dois ou mais doadores para se atingir a independência à insulina, limitando o número de pacientes que podem se beneficiar dessa terapia. Neste contexto, diversos estudos têm buscado desenvolver estratégias capazes de minimizar a perda das ilhotas durante o isolamento ou cultura das ilhotas a serem transplantadas. As ilhotas são mantidas em cultura por até três dias antes do transplante, período no qual são realizados testes de viabilidade, função, esterilidade, pureza e contagem do número de ilhotas (islet equivalents – IEQs). Diversos estudos avaliaram se o uso de diferentes aditivos no meio de cultura ou cultura das ilhotas sobre componentes da matriz extracelular (ECM) ou outros dispositivos (scaffolds) foi capaz de melhorar 15 desfechos das ilhotas, com resultados bastante variados. Sendo assim, no nosso primeiro artigo, realizamos uma revisão sistemática com o objetivo de sumarizar os resultados desses estudos nos seguintes desfechos: IEQs, viabilidade e função (índice de estimulação de secreção de insulina - SI) das ilhotas. A busca foi feita nos sites PubMed e Embase e 37 artigos preencheram os critérios de elegibilidade e foram incluídos na revisão sistemática. Após a extração dos dados, esses artigos foram divididos nos seguintes grupos: 1) “antiapoptótico/anti-inflamatório/antioxidante”; 2) “hormônios”; 3) “sulfoniluréias”; 4) “soro”; e 5) “scaffolds ou componentes da ECM”. De uma forma geral, aditivos do grupo "antiapoptóticos/anti-inflamatórios/antioxidantes” parecem diminuir a apoptose das ilhotas e melhorar o SI, calculado após estimulação com concentrações normal e alta de glicose. Além disso, a cultura de ilhotas em scaffolds ou sobre componentes de ECM foi capaz de melhorar o SI. Os efeitos dos outros grupos de aditivos sobre os desfechos analisados foram heterogêneos, tornando difícil uma conclusão. Dessa forma, novos estudos são necessários para definir o real impacto desses aditivos na qualidade das ilhotas isoladas e nos desfechos do transplante. A avaliação da viabilidade das ilhotas é um critério importante para a liberação dessas células para transplante. O teste atualmente utilizado para a avaliação da viabilidade pela maioria dos centros de transplante é a coloração com acetado de fluoresceína (FDA) / iodeto de propídeo (PI). Entretanto, esta técnica apresenta algumas limitações, sendo dependente da experiência dos pesquisadores que vão estimar a porcentagem de células vivas (marcadas pela fluorescência verde – FDA) e mortas (fluorescência vermelha – PI) por ilhota. Neste contexto, um método quantitativo pode ser mais adequado para determinar a viabilidade das ilhotas. Então, no nosso segundo artigo, comparamos a viabilidade das ilhotas estimada com a coloração FDA/PI com 16 aquela obtida pela citometria de fluxo, usando-se o fluoróforo 7-Aminoactinomycin D (7AAD) e o anticorpo Anexina V-APC. Ilhotas isoladas de 10 ratos Wistar machos foram usadas para avaliar a viabilidade pelas duas técnicas. Na coloração FDA/PI, 50 ilhotas por animal foram analisadas por dois pesquisadores em um microscópio de fluorescência e, então, calculou-se a viabilidade média para as 50 ilhotas/experimento. Para a citometria de fluxo, as ilhotas foram primeiramente dissociadas. Após, 100.000 células dissociadas por animal foram incubadas com 7AAD (marcador de células necróticas ou apoptóticas tardias) e Anexina V-APC (marcador de células em apoptose precoce) e avaliadas no citômetro FACSCanto II. Uma correlação moderada foi encontrada entre as médias de viabilidade obtida pelas duas técnicas (r= 0,6, p= 0,047). A média da viabilidade medida pela citometria de fluxo foi mais alta do que a média estimada pela coloração FDA/PI (95,5 ± 1,4% vs. 89,5 ± 5,0%; p= 0,002), também demonstrando uma menor variação entre os experimentos. Embora a citometria de fluxo seja mais cara e mais demorada do que a coloração FDA/PI, é uma técnica quantitativa e não subjetiva. Sendo assim, deve ser a técnica de escolha para uma determinação mais eficaz da viabilidade das ilhotas. Muitos estudos demonstraram que os análogos do glucagon-like peptide-1 (GLP-1), como a exenatida (EXE) e liraglutida (LIRA), possuem propriedades anti-inflamatórias, pró-proliferativas e antiapoptóticas em células-beta. A adição de EXE ao meio de cultura das ilhotas parece ser capaz de melhor a viabilidade e o SI de ilhotas humanas. No nosso terceiro artigo buscamos confirmar se a adição de EXE ou LIRA ao meio de cultura das ilhotas isoladas de ratos melhora a viabilidade e função dessas células, protegendo-as de danos inflamatórios decorrentes do isolamento e cultura. Para isto, ilhotas isoladas de ratos Wistar machos foram cultivadas nas seguintes condições, por 72h: 1) Controle; 2) Pool de citocinas pró-inflamatórias (TNF, IFN-γ e IL-1β; adicionadas nas últimas 48h de cultura); 3) EXE; 4) EXE + citocinas; 5) LIRA; e 6) LIRA + citocinas. Após 72h de cultura, foram avaliados o SI e a viabilidade das ilhotas, a qual foi quantificada por citometria de fluxo, utilizando-se 7AAD/Anexina V-APC. O tratamento com EXE melhorou o SI das ilhotas submetidas à inflamação (grupo 4) comparado ao grupo tratado somente com citocinas (grupo 2): 1,21 ± 0,40 vs. 0,60 ± 0,22 (p= 0,037). Já a LIRA não influenciou o SI das ilhotas na presença ou ausência de citocinas (p= 0,469). A viabilidade das ilhotas não foi modificada pela presença de EXE ou LIRA (p >0,05). Em conclusão, a EXE parece possuir um papel protetor sobre a função das ilhotas de ratos frente a um estresse inflamatório direto. Estamos realizando experimentos adicionais de expressão gênica para avaliar por quais mecanismos essa melhora do SI acontece. Um estudo prévio do nosso grupo demonstrou que a administração de EXE a ratos com morte encefálica (ME) foi capaz de aumentar a viabilidade e o SI das ilhotas isoladas. Esses efeitos foram devidos a modificações em genes relacionados ao estresse oxidativo, estresse do retículo endoplasmático e inflamação. Sendo assim, hipotetizamos que a administração de EXE a doadores de órgãos em ME poderia melhorar a qualidade das ilhotas humanas para transplante. Entretanto, antes que isso possa ser testado, precisa-se demonstrar que esse hormônio também melhora (ou pelo menos não piora) parâmetros associados a outros órgãos a serem doados. Recentemente, relatamos que a administração de EXE a ratos com ME também melhora marcadores de dano hepático (aspartato aminotransferase e lactato desidrogenase), também reduzindo a apoptose dos hepatócitos. Na presente tese, avaliamos se o tratamento com EXE também pode diminuir danos renais após o desenvolvimento da ME em ratos. Ratos Wistar machos foram divididos em três grupos: 1) controle (sem lesão do sistema nervoso central); 2) ME (morte encefálica induzida experimentalmente); e 3) ME+EXE 18 (ME induzida experimentalmente, seguido pela administração intraperitoneal imediata de EXE). A partir das amostras de rins coletadas após 6h de ME, realizou-se a extração de RNA total e proteínas. Também se avaliou os níveis plasmáticos de um marcador de dano renal (creatinina). Ratos tratados com EXE tiveram níveis menores de creatinina comparado aos controles (p 0.05). A ME induziu estresse oxidativo nos rins através do aumento da expressão de Ucp2, Sod2 e Inos, enquanto a administração de EXE foi capaz de reduzir a expressão desses genes. A ME também aumentou a expressão de Tnf e do inflamasoma Nlrp3 comparado aos controles (p 0.05), mas a EXE não teve nenhum efeito na expressão desses genes (p 0.05). Além disso, o tratamento com EXE aumentou a expressão de Bcl2, um gene antiapoptótico. As expressões de Il-1β, IL-6 e Nfkb1a foram similares entre os grupos. Conclui-se que a administração de EXE a ratos com ME pode reduzir danos renais induzidos pela ME através da diminuição da expressão de genes relacionados ao estresse oxidativo e aumento de Bcl2.