Sem olhos ao entardecer: reminiscências de uma identidade e o enfrentamento do estigma

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2022
Autor(a) principal: Alves, Ana Paula Ribeiro
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade Estadual Paulista (Unesp)
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: http://hdl.handle.net/11449/238552
Resumo: A descrença acerca das capacidades de pessoas com deficiência é resultante da interpretação negativa da sociedade, ao que o sociólogo Erving Goffman denominou Estigma. Para a teoria goffmaniana, a deficiência significada como um atributo profundamente depreciativo torna o estigmatizado inferior, incapaz e menos humano. Desta forma, aprende a desempenhar na sociedade o papel que lhe cabe e permanece marginalizado como consequência da identidade deteriorada. Nesta perspectiva, o objetivo deste estudo foi identificar e analisar as estratégias de enfrentamento do estigma, a partir da história de vida de uma mulher com cegueira adquirida após sofrer uma brutal agressão. A hipótese é que a pessoa com deficiência pode não se constituir passiva diante da estigmatização, mas construir uma identidade de resistência por meio de estratégias de enfrentamento que contrarie as expectativas da sociedade e legitime a própria humanidade. Utilizamos o método História de Vida composto por diferentes instrumentos além do relato oral. Beatriz, em primeira pessoa, narrou a sua trajetória dentro dos padrões de normalidade e os caminhos percorridos para a construção de nova identidade ou ressignificação sob a perspectiva dos estigmatizados. Para além de mera narrativa, Beatriz participou de todas as fases da pesquisa, desde as tomadas de decisões sobre a construção de sua história até a análise dos dados. De forma pouco habitual em estudos que utilizaram o método História de Vida no Brasil, o protagonismo de Beatriz enquanto participante do estudo e não apenas objeto de pesquisa, demonstrou o crescimento em criticidade, empoderamento e transformação da personagem, assim como da pesquisadora. A análise narrativa compreendeu o modelo omnicompreensivo em que o pesquisador direciona cinco olhares para a história contada, que garantam o respeito, fidedignidade e sensibilidade às suas particularidades. Os resultados revelaram a luta silenciosa e solitária no enfrentamento do estigma e construção da identidade social diferente da imposta pela sociedade. Estrategicamente, a protagonista escolheu a profissão que pode realizar de forma autônoma e que lhe concebeu um novo status, de mulher independente e capaz. Manipulou a tensão deste encontro com pessoas sem deficiência, escondeu a desfiguração para não os afastar, não se retraiu ou confrontou de forma agressiva aqueles que duvidaram das suas capacidades como pressupôs Goffman, antes, preferiu conceder-lhes momentaneamente as respostas sanando curiosidades e demonstrando tudo o que é capaz de realizar. Operou com signos e símbolos demonstrando a importância que tais códigos possuem nas interações humanas e que são esquecidos ou desconhecidos pelas pessoas com cegueira. A escolha estratégica do que poderia realizar sem a visão, a manipulação das informações e tensões, o acobertamento da desfiguração e a adoção dos códigos em interação social permitiram que por meio do trabalho se distanciasse da imagem deteriorada, incapaz, menos humana, aproximando-se daquela capaz de ajudar, realizar, ter independência, autonomia e acima de tudo, humanidade. Consideramos que a transformação de Beatriz nos afeta a todos, os ditos normais, levando-nos à reflexão sobre qual tem sido também o nosso papel no enfrentamento. A história de Beatriz nos conduz a um novo olhar para a sociedade e para a teoria. O leitor encontrará neste estudo, um diálogo com Goffman por meio da protagonista, um método democrático e emancipatório de fazer pesquisa e uma história de resistência à identidade deteriorada no enfrentamento do estigma.