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As personagens Myriel, Enjolras, Jean Valjean e Javert, em Les Misérables, de Victor Hugo: reações à concepção de justiça legalista

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2020
Autor(a) principal: Pereira, Maria Júlia [UNESP]
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Dissertação
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade Estadual Paulista (Unesp)
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: http://hdl.handle.net/11449/192712
Resumo: O distanciamento entre a justiça em sentido ético e a lei jurídica é fruto da racionalidade iluminista e engendrou o legalismo, notadamente no contexto francês da primeira metade do século XIX, consolidando socialmente a concepção de justiça legalista, isto é, a ideia da lei jurídica como lídima expressão do justo. Contudo, esse fetichismo legal torna-se questionável ao se constatar que a lei não somente contradiz o justo, como também engendra injustiças. Tal questão aparece nas obras política e literária de Victor Hugo por meio da querela entre o direito – expressão de uma ideia de justiça enquanto ideal – e a lei, expressão de uma sociedade iníqua e, assim, reprodutora de desigualdades. As consequências desse embate são denunciadas na obra hugoana nos discursos político e narrativo e, em Les Misérables (1862), é assinalado o ananké – necessidade ou fatalidade – das leis como uma imposição da vida em sociedade. Diante disso, considerando a importância das personagens na relação entre história e narrativa, o presente trabalho busca demonstrar como se dá, estrutural e tematicamente em tal obra, a reação à concepção de justiça legalista por meio da trajetória – construção, ação e transformação – das personagens Myriel, Enjolras, Jean Valjean e Javert. O bispo Myriel revela, por meio de suas ações, uma concepção de justiça fundamentada na equidade. As transformações na comunidade em que vive, assim como as da narrativa, resultam dessa concepção, na medida em que ele busca reparar as desigualdades locais. Nesse sentido, o tratamento fraternal e igualitário dado a Valjean desencadeia sua jornada por redenção. O jovem líder insurgente Enjolras, por sua vez, também almeja a reparação e transformação do mundo, mas pela via da Revolução que exprime a ruptura absoluta com a lei, negando a forma de governo e a ordem social vigentes. Seu sentimento de justiça, expresso em seu discurso e agir, tem fundamento na utopia revolucionária, no amor à pátria e na virtude política que visam à instauração de uma república justa, capaz de contemplar os desiguais. Jean Valjean é o protagonista que, condenado, injustiçado e vilanizado pelo poder judiciário, comete seu último crime por causa de um sentimento de vingança oriundo da injustiça. Ao ser transfigurado após o gesto de altruísmo do bispo, Jean Valjean busca se redimir, vivendo à margem da lei jurídica para reparar os desvalidos. Assim, suas ações engendram importantes transformações na narrativa, encadeando logicamente os acontecimentos do início ao fim do romance. Javert, por outro lado, é a personagem que antagoniza o herói: encarnação da ideologia legalista, o inspetor de polícia compreende a lei jurídica como única expressão do justo e obedece cegamente a seu dever para concretizar a punição legal devida ao antigo forçado. Contudo, ao ser salvo por aquele que perseguia, é confrontado por uma forma superior de justiça e compreende que a lei jurídica pode engendrar injustiças. O legalismo se mostra, portanto, insustentável e a ruptura de Javert com essa ideologia se encerra na autodestruição expressa pelo suicídio.