De palmo em palmo a terra muda de jeito: diálogos sobre qualidade do solo

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2015
Autor(a) principal: Calixto, Juliana Sena
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade Federal de Viçosa
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: http://www.locus.ufv.br/handle/123456789/10338
Resumo: A manutenção da qualidade dos solos tem sido um desafio para cientistas, técnicos e agricultores. Dados da FAO apontam que 25% dos solos agrícolas do mundo estão degradados, o que fez com que a ONU decretasse 2015 o Ano Internacional dos Solos, buscando sensibilizar a sociedade mundial para este problema, que compromete a sustentabilidade do planeta. A avaliação dos solos se faz com o uso de indicadores, atributos do solo que permitem avaliar e concluir sobre a sua qualidade. Esses indicadores são desenvolvidos por cientistas e por agricultores. O desafio posto é promover um diálogo entre os indicadores acadêmicos e os etnoindicadores, para orientar o manejo do solo de forma a potencializar suas funções e a sustentabilidade da agricultura. O objetivo geral desta tese foi identificar e sistematizar, de forma dialogada com os/as agricultores/as familiares, etnoindicadores de qualidade do solo e, a partir deles, constuir uma base de avaliação sobre a qualidade do solo e estratégias de manejo sustentável dos agroecossistemas. O referencial teórico-metodológico utilizado foi a pesquisa participante, com a utilização de técnicas participativas para o reconhecimento e valorização do saber dos agricultores, com base nos princípios da Etnopedologia e da Agroecologia. Os etnoindicadores de qualidade do solo utilizados pelos agricultores de duas comunidades rurais dos municípios de Araponga (Sítio Oito de Março) e Muriaé (Associação Bonsucesso) foram identificados e sistematizados. Tais comunidades se localizam na Zona da Mata de Minas Gerais, Brasil. Realizou-se em conjunto com os agricultores a estratificação ambiental e a espacialização dos ambientes, utilizando etnoindicadores de qualidade do solo, e avaliou-se também com os agricultores a qualidade dos diferentes ambientes estratificados. A análise química foi o ponto de partida para uma discussão sobre formação de solo e manejo integrado da fertilidade com ênfase nas práticas agroecológicas de manejo do solo, que compreendem a fertilidade do solo de forma holística e não apenas como um balanço de nutrientes presentes no solo. Levantaram-se vinte e dois indicadores, sete deles referentes a aspectos biológicos do solo, dois a atributos químicos, sete referentes aos aspectos físicos e seis indicadores visuais. Os resultados demonstraram a riqueza de conhecimentos dos agricultores/as sobre o solo e as diversas interações que ocorrem em seus agroecossistemas. Os agricultores de Araponga estratificaram a área do Assentamento Sítio Oito de Março em treze ambientes diferentes e os agricultores de Muriaé estratificaram a área da Associação Bonsucesso em quinze ambientes distintos. A partir das informações dos agricultores foi construída uma chave de identificação de ambientes para cada assentamento, sendo a pedoforma o principal atributo de estratificação. A estratificação realizada pelos/as agricultores/as foi similar às classificações científicas no que se refere à pedoforma, mas incorporou outros atributos do solo, como a estrutura e a exposição do terreno ao sol, o que permitiu maior detalhamento, possível nesta escala de trabalho. Com o uso de uma metodologia participativa e de campo, os agricultores aprenderam a avaliar os diferentes ambientes dos assentamentos, atribuindo-lhes notas. Com isto, os agricultores podem, com suas adaptações, aperfeiçoar ainda mais sua capacidade de observação, monitoramento e avaliação de seus ambientes e melhorar o manejo de seus agroecossistemas. A riqueza de informação sobre os etnoindicadores de qualidade do solo aliada à estratificação ambiental demonstrou o enorme conhecimento dos agricultores sobre o solo e as diversas interações que ocorrem em seus agroecossistemas. Este conhecimento não é estático, pelo contrário, está em constante transformação, pois eles aprendem na medida em que manejam e observam suas áreas, assim como quando interagem com outras pessoas. Muitos indicadores apontados pelos agricultores são encontrados na literatura científica internacional, demonstrando assim que o conhecimento dos agricultores é mais cosmopolita do que sugere algumas literaturas. Em muitos casos os indicadores apontados pelos agricultores coincidiram com os indicadores técnicos de qualidade do solo, mas em alguns casos suas avaliações são mais detalhadas porque utlizam indicadores mais sensíveis. Por exemplo, os solos de diversas áreas não apresentaram diferenças quando utilizada a análise química de rotina como indicadora, mas com base nas plantas espontâneas, tais áreas diferenciadas e estratificadas em mais detalhes. Considerou-se que o uso de indicadores técnicos e etnoindicadores foram complementares e ambos foram importantes para avaliar a qualidade do solo com mais precisão. O processo de troca de conhecimentos entre técnicos e agricultores foi imensamente rico, com todos aprendendo e ensinando e contribuiu para ressignificar a avaliação da qualidade do solo, muitas vezes feita com base exclusivamente na análise química de rotina dos solos. Esta também foi ressignificada durante os estudos, onde os agricultores tiveram a oportunidade de aprender como interpretar seus resultados. Uma metodologia denominada “Feira de Solos” foi utilizada para devolver os resultados da pesquisa sobre etnoindicadores de qualidade do solo. Durante a feira foi possível trocar outras experiências e aprofundar ainda mais o conhecimento sobre manejo agroecológico do solo com agricultores e agricultoras participantes da pesquisa. A devolução dos resultados das pesquisas foi entendida como um compromisso social e ético assumido pelo pesquisador, e parte da pesquisa participante. O seminário de defesa da tese foi entendido também como parte do processo de intercâmbio entre o saber local e o conhecimento científico e por isto foi acompanhado pelos agricultores participantes da pesquisa.