Peso flutuante de uma fala: o Brasil narrado em Leite derramado, de Chico Buarque

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2018
Autor(a) principal: Bonis, Maria Luisa Rangel de
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8151/tde-14022019-103826/
Resumo: A pedra de toque do bom falar de Eulálio, narrador de Leite derramado, romance de Chico Buarque publicado em 2009, está nas reminiscências desse oligarca cuja família sempre teve o Brasil nas mãos. À primeira vista, a narrativa poderia ser lida, portanto, como uma espécie de romance de formação da nação brasileira a partir do olhar de um respeitável membro de sua elite. A deriva dos pensamentos de Eulálio, porém, cujo vai e vem começa logo nas primeiras páginas do romance, já demonstra minimamente que na formação do Brasil nunca houve nada linear e, em especial, que o poderio da elite familiar ao narrador foi mudando de mãos ao longo dos séculos, por mais que ele teime em manter potente sua voz de mando no presente narrativo. Não é possível ignorar o lugar de onde Eulálio narra sua história: a cama de um hospital público e decrépito. Leite derramado está, então, mais próximo de uma história do país a contrapelo, montada a partir dos dizeres de um senhor outrora poderoso que, no hoje, é todo mambembe. O que se encontra entre a potência das memórias de um oligarca e seu lugar no hoje, ao lado de toda a sorte desvalidos de quem não se veem os rostos, mal se escutam as vozes, mas cuja presença se faz, de alguma forma quase surda, também potente ao redor do narrador? É o modo como se estrutura a sobreposição entre a memória cheia de posses e a emergência do pronto-socorro (a televisão ligada; as vozes sem rosto que rodeiam Eulálio; toda violência que tenta empurrar os que nunca tiveram lugar para uma marginalidade cada vez mais distante), um dos grandes problemas críticos do livro. Tal sobreposição, cristalizada na forma do romance, joga luzes sobre o nosso tempo contemporâneo. Neste trabalho, abordaremos especialmente o que se concentra entre dois polos: o modo como o Golpe Militar de 1964 é narrado por Eulálio de Assumpção, como atinge a ele e a seus herdeiros; a maneira como a força de trabalho é retratada. A não ser pelo narcotráfico, ela é também um vulto sem forma acompanhando aqueles que rodeiam o narrador cambaio mas que, afinal, teve berço.