O direito das plataformas: procedimento, legitimidade e constitucionalização na regulação privada da liberdade de expressão na internet

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2020
Autor(a) principal: Ramos, Carlos Eduardo Vieira
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Dissertação
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2139/tde-02052021-222935/
Resumo: Esta é uma dissertação sobre o papel que os atores privados exercem na regulação da liberdade de expressão. Em específico, ela investiga o funcionamento da moderação de conteúdo das plataformas da internet, o mecanismo decisório estruturado pelas empresas que estão por trás de espaços como o Facebook, o YouTube e o Twitter para controlar aquilo que as pessoas podem dizer. Para fazer isso, o trabalho parte, no Capítulo 1, de um problema, baseado em duas constatações. Primeiro, a de que as transformações tecnológicas que fizeram com que as pessoas utilizassem redes sociais como o Facebook para se expressar não criaram apenas novos espaços de manifestação - as plataformas da internet -, mas também se traduziram em novos espaços de decisão - estruturas que, integradas às plataformas, são mantidas pelas empresas que as criaram para exercer poder sobre aquilo que as pessoas dizem ali. Segundo, a de que esse mecanismo privado de regulação da liberdade de expressão tem se transformado de um modo que desafia, com sucesso, a forma como ele é compreendido. Em particular, as plataformas da internet têm transitado de um modelo decisório antes caracterizado pela opacidade, pela ausência de participação dos seus usuários e pela irrecorribilidade de suas decisões, para outro, marcado por procedimentos transparentes, que viabilizam a participação dos usuários e que tornam possível questionar - até mesmo para instâncias externas e independentes - suas decisões. Que razões existiriam para que as plataformas, depois de desenvolverem um sistema próprio de moderação de conteúdo - construído para que tivessem o total controle sobre os espaços virtuais que administram - agora se empenhassem em transformá-lo, perdendo, com isso o domínio que têm sobre o que é dito na internet? Por que essas empresas estão abrindo mão do seu poder? A dissertação se propõe a responder a essas perguntas em dois passos: primeiro, no Capítulo 2, empreendendo uma investigação a respeito de como os mecanismos de moderação de conteúdo funcionam, sistematizando-os para lançar luz à forma como essas decisões são tomadas. Segundo, utilizando a sociologia jurídica - e, em particular, a Teoria dos Sistemas, justificada e reconstruída, respectivamente, nos Capítulos 3 e 4 - para entender as razões por trás desse movimento de transformação. Para isso, o trabalho acopla o funcionalismo estrutural de Niklas Luhmann - capaz de identificar o papel que essa forma de tomar decisões tem em seu lugar de origem, o Estado - com o aporte feito à teoria por Gunther Teubner - que, reinterpretando o pluralismo jurídico sob uma perspectiva sistêmica, tornou a Teoria dos Sistemas capaz de analisar o direito também como um fenômeno não-estatal. Construída essa estrutura analítica, o Capítulo 5 da dissertação sustenta que a utilização de técnicas procedimentais estatais para tomar decisões nas plataformas tem dois significados: primeiro, essa é uma solução para um problema de falta de legitimidade decisória, porque procedimentos transparentes e participativos levam as pessoas - tanto nos Estados, quanto nas plataformas - a aceitarem as decisões, mesmo que lhes sejam desfavoráveis. Segundo, ela é parte de um movimento mais amplo, uma manifestação da constitucionalização do mundo digital, pela qual as plataformas da internet se mobilizam para adotar formas procedimentais capazes de imunizar as decisões da moderação de conteúdo da intervenção de outros atores institucionais que atuam regulando a liberdade de expressão, como o Estado. O trabalho conclui, portanto, que por trás dessa transformação inexplicada há um tradeoff oculto que a justifica: quanto maior a autonomia que as plataformas conferem à moderação de conteúdo, construindo procedimentos que a aproximam do modelo decisório do Estado, mais ela se constitui como um direito propriamente dito - o Direito das Plataformas - vocacionando-se a ser legítimo e independente em relação às influências tanto internas quanto externas à estrutura empresarial que o criou.