Resumo: |
O acidente no trabalho (AT) continua sendo um importante problema de saúde pública no Brasil e no mundo. As freqüentes campanhas promovidas no país e pelas organizações internacionais mostram que o problema envolve preocupação crescente, principalmente em decorrência das novas formas de organização mundial do trabalho. A melhoria desse quadro depende de medidas de intervenção e existe um amplo consenso que estas decorrem do estabelecimento das causas do AT. Contudo, os métodos em uso para investigação dessas causas têm mostrado um consenso controverso sobre a sua natureza (predomínio dos fatores humanos). As argumentações colocadas nessa controvérsia atêm-se às refutações dos resultados em contrário, conforme as teorias e métodos de investigação, sem questionar nenhum dos pressupostos assumidos e limitando o entendimento possível. Com isso, colocou-se como problema de pesquisa a necessidade de revisão crítica dessas teorias e métodos, tanto em relação aos seus pressupostos, como em relação às suas possibilidades de configuração das condições empíricas. Para essa revisão crítica tomou-se como referencial teórico o pensamento de F. Nietzsche (1844-1900) relativo aos conceitos de ordem, causa, livre-arbítrio e ascetismo. As diferentes proposições de causalidade no AT foram revistas e confrontadas com resultados empíricos colhidos entre trabalhadores acidentados e não acidentados em 4 empresas do setor petroquímico. Para cada proposta de causalidade de AT foram estabelecidos os seus pressupostos metateóricos (ontológicos, lógicos e epistemológicos). Os resultados foram apresentados em 3 perspectivas diferentes de causalidade (tecnológica, não-científica e racionalista clássica). A perspectiva tecnológica analisou 17 proposições teóricas e 17 métodos de investigação diferentes. A perspectiva não-científica examinou a forma de inferência causal no AT conforme o pensamento primitivo. A perspectiva racionalista clássica examinou o mesmo problema sob a concepção aristotélica de causa. Ficou demonstrado que as teorias e métodos de investigação estudados têm pouca diferença nos pressupostos. A maioria converge no realismo. Todas compartilham várias contradições, tanto a nível interno como externo. A falta de rigor científico na prática da perspectiva tecnológica aproxima o seu processo heuristico daqueles observados na prática não-científica (mágico-supersticioso e mítico- religioso). As concepções aristotélicas tem sido usadas de forma intuitiva e incompleta. Pelas 3 perspectivas analisadas pôde-se concluir que (a) teorias e métodos de investigação da causalidade de AT examinados estão voltados à viabilização das condições perigosas de trabalho; (b) teorias e métodos sustentam-se no ideal ascético, promovem a disciplina e inviabilizam a redução do sofrimento; (c) para tanto, a causalidade do AT é construída sob um referencial mítico que fomenta a indistinção entre causa, culpa e responsabilidade; (d) embora se disponha de um grande número de teorias, essas diferem pouco nos seus pressupostos; (e) a falta de teorias sob novos pressupostos e dos respectivos métodos contribui para a falta de transformações e para o não atendimento das aspirações coletivas por equidade e justiça. (507 ref., 345 pag., 20 tab., 19 fig.). |
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