A morte de si por escrito: análise fenomenológica de cartas e bilhetes deixados por pessoas que se mataram

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2019
Autor(a) principal: Rabelo, Elizabeth Avelino
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/47/47131/tde-22112019-114147/
Resumo: Com o objetivo de analisar a experiência vivida do suicídio elegeu-se como objeto de estudo cartas e bilhetes deixados por pessoas que se mataram. A execução da pesquisa e a análise de vivências compartilhadas nas mensagens teve como referencial teórico e metodológico a Fenomenologia Clássica (Husserl) e desdobramentos e apropriações (Landsberg) desse campo de conhecimento. A partir do acesso a inquéritos de suicídios arquivados no Tribunal de Justiça de São Paulo foram selecionados, intencionalmente, escritos de seis pessoas, com um recorte temporal de 1913 a 2009. Para a seleção das pessoas utilizou-se como critério reunir exemplos de tempos diferentes e de histórias que explorassem campos diversos de experiências humanas. Na análise compreensiva das cartas e bilhetes acompanharam-se dinâmicas vivenciais relacionadas a uma noção de si e aos vínculos entre autor, destinatário e o conteúdo da mensagem. Foram consultadas, ainda, outras peças do inquérito para a apreensão do desenlace do acontecimento dos seis suicídios. As análises das histórias de suicídio e de experiências reveladas nas mensagens indicam variações sem fim diante da decisão entre o continuar a viver e o decidir morrer, coexistindo afetos ambíguos, intensos e contrastantes. Enfrentando essas variações, emergiram quatro estruturas constitutivas do decidir morrer: uma vinculação entre viver, sofrer e morrer; o suicídio como uma saída de emergência; o ato de se matar como uma resposta sobre si e sobre a vida; e a morte autoinfligida como uma abdicação simultânea de si e do outro. A escrita de mensagens e o movimento de se matar são atos humanos vívidos e radicais, reveladores de imprevisibilidades e de descontinuidades de modos de viver que desencadeiam alternâncias de afetos no irromper de um instante. Assim sendo, é preciso repensar ideias de prevenção do suicídio que se baseiem em tentativas de cerceamentos e controle da condição viva e indomável do existir humano. Ao abrir espaço para a expressão das vozes de pessoas que se mataram foi possível se aproximar do campo vivido do suicídio, que se fundamenta na interação entre um \"eu\" e seu mundo circundante. Conclui-se que a experiência vivida do suicídio não se reduz a uma subjetividade isolada, mas se movimenta em um espaço articulado e mutuamente constituído por um \"eu\", um \"tu\" e um horizonte histórico. Essa mútua constituição carrega uma potência latente de participar tanto da preservação quanto da corrosão de elementos estruturantes do viver e da decisão de morrer. Nas vivências das seis pessoas que acompanhamos foi possível ouvir ecos de suas lutas existenciais, vividas e desencadeadas em um espaço de interações sociais: uma luta transcrita em palavras e que impele à intensificação do esforço de compreensão e acompanhamento a pessoas que estejam vivendo experiências em torno do suicídio