Ciência, indústria e sociedade civil: paradigmas, discursos e disputas no campo da alimentação no Brasil

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2023
Autor(a) principal: Nunes-Galbes, Nadine Marques
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/6/6143/tde-31012024-164747/
Resumo: A insustentabilidade do Antropoceno evidencia a impossibilidade de continuar dissociando o ser humano da natureza, marca da lógica hegemônica de produção de conhecimento. Como elemento central desta época, os sistemas alimentares, enraizados em disputas de poder político e econômico, apresentam inúmeras externalidades negativas sobre as dimensões ambiental e social, inclusive no sentido paradoxal de não garantir segurança alimentar e nutricional à humanidade. Contudo, como fruto da referida lógica, a ciência da Nutrição se desenvolveu sobre bases insuficientes para lidar de forma assertiva com questões tão complexas. Cientes da necessidade de transformação dos sistemas de pensamento científicos e dos sistemas alimentares para que seja possível enfrentar os desafios característicos do Antropoceno, nosso objetivo foi compreender a evolução e estado atual dos paradigmas científicos em Nutrição e sua incorporação em discursos de atores sociais chave nos sistemas alimentares brasileiros. Para tanto, duas pesquisas foram desenvolvidas. A primeira foi uma revisão sistemática da literatura que se utilizou de ferramentas de Inteligência Artificial para análise bibliométrica (bibliometrix R-package), buscando identificar como os paradigmas orientadores da ciência da Nutrição se caracterizam na atualidade, além de investigar a possível incorporação da sustentabilidade como tema. Identificamos um campo de disputas em que os paradigmas evoluem obedecendo uma organização em esferas, não sendo verificada a superação paradigmática, mas um movimento de ampliação em sentidos opostos. De um lado, o paradigma fundador se amplia rumo a uma abordagem molecular voltada ao âmbito individual. De outro, um paradigma mais holístico vem se estabelecendo, marcado pelo estudo dos sistemas alimentares e incorporação da sustentabilidade. Apreendemos, ainda, a relevância brasi.leira nesta discussão epistemológica, destacando-se a implementação pragmática da classificação NOVA e do Guia Alimentar para a População Brasileira. A segunda foi uma pesquisa exploratória documental que objetivou identificar qual(is) paradigma(s) orientadores da ciência da Nutrição são incorporados em discursos de atores sociais chave nos sistemas alimentares brasileiros, e qual sua representação sobre o nexo alimentação-sustentabilidade. Os atores investigados foram a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (ABIA) e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), e foi utilizada como técnica central para análise do discurso a modelagem de tópicos, com auxílio do software T-LAB. Mais uma vez, a disputa se fez presente, uma vez que a narrativa da ABIA foi marcada pela relevância do processamento de alimentos para a promoção da segurança alimentar, e pela composição nutricional como métrica da qualidade dos alimentos, em associação ao não reconhecimento da classificação NOVA. Isso demonstra forte apego ao paradigma reducionista, ao qual também está alinhada sua representação superficial do nexo alimentação-sustentabilidade. A narrativa do Idec, por sua vez, foi marcada pela classificação NOVA e pelos preceitos do Guia Alimentar, indicativos da incorporação de um paradigma ampliado, alinhado também com sua representação mais robusta do nexo alimentação-sustentabilidade. A apropriação de um paradigma científico mais adequado aos desafios do Antropoceno fortalece a transformação necessária aos sistemas alimentares rumo à sustentabilidade e promoção da saúde planetária, enquanto a resistência à ampliação paradigmática é um importante empecilho ideológico e cronológico, num cenário em que já não nos resta mais tempo.