Juízes ou burocratas? Práticas, estereótipos e discricionariedade da judicialização da previdência rural no Brasil

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2021
Autor(a) principal: Alves, Clara da Mota Santos Pimenta
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2133/tde-03102022-082152/
Resumo: A judicialização da previdência rural no Brasil movimenta a máquina da justiça federal através do ajuizamento anual de milhares de demandas. Os benefícios previdenciários rurais, pagos aos trabalhadores do campo que realizam atividade de agricultura ou pesca artesanal em regime de economia familiar, atraem uma litigância superior à média daquela que atinge outras prestações sociais. Um quarto das aposentadorias pagas aos rurícolas do país o são por força de decisões da justiça, em processos que se resolvem em audiências de curta duração. Este trabalho apresenta as características dessa judicialização pouco estudada, descrevendo como se operam as suas dinâmicas e quais são os argumentos que informam as decisões judiciais adotadas, seja para negar ou conceder os benefícios. A pesquisa supõe que tanto a intensidade da atuação do Poder Judiciário quanto a forma como ela se dá criaram um caso especial de controle judicial de políticas públicas, no qual os juízes assumem um papel de implementadores diretos, mantendo contato com as partes e lidando com elas em um modo particular e mais acentuadamente discricionário de adjudicação. O grande volume de processos ocasiona uma judicialização que se expressa como segundo round da administração pública, aproximando juízes e burocratas em variados planos. Numa dimensão institucional, a tese descreve as rotinas que gerenciam e endogenizam a judicialização, acomodando-a. No plano jurisdicional, o trabalho mostra que a estratégia de enfrentamento dos processos é marcada pelo exercício de discricionariedade e estereotipização da clientela rural. Utilizando uma estratégia empírica que engloba entrevistas qualitativas e análise de sentenças judiciais, os achados da pesquisa evidenciam que as interações em juízo costumam reforçar uma identidade dos trabalhadores do campo associada à precariedade e pobreza, a estereótipos tradicionais quanto ao gênero e a julgamentos aleatórios. A tese conclui que esse modo de proceder voltado a que as soluções se deem no momento do encontro entre o trabalhador do campo e o juiz não tem sido necessariamente favorável ou desejável para essa população. A proposta do trabalho, cujos marcos teóricos são extraídos da literatura sobre judicialização de políticas públicas e burocracia em nível de rua, desloca o eixo da crítica à judicialização para a perspectiva dos seus usuários, para o trato da clientela rural, projetando algumas possíveis soluções para a política. Num domínio em que a judicialização costuma ser essencialmente criticada pela régua da eficiência econômica e orçamentária, o trabalho contribui ao mudar essa lente de análise. Mapeando algumas discriminações perpetradas pelo Poder Judiciário na seleção daqueles que serão contemplados ou não com os benefícios, a tese sustenta que a \"loteria\" judicial possui também um inafastável custo humano.