"Moçambique é um Mato Grosso no meio da África" : o desenvolvimento e suas fricções em torno ao acontecimento ProSavana

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2020
Autor(a) principal: Camana, Ângela
Orientador(a): Almeida, Jalcione Pereira de
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Não Informado pela instituição
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Palavras-chave em Inglês:
Link de acesso: http://hdl.handle.net/10183/217710
Resumo: Esta investigação debruça-se sobre as temáticas do ambiente e do desenvolvimento, suas composições e fricções, em um cenário de conflitos instaurados pela tentativa de implementação do Programa de Cooperação Tripartida para o Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical em Moçambique (ProSAVANA). Este programa, cujo lançamento data de 2009, é fruto de uma parceria entre Brasil, Japão e Moçambique e tem previstas, em um horizonte de 20 anos, atividades de pesquisa, extensão e transferência de tecnologias no norte moçambicano, em uma região conhecida como Corredor de Nacala, que, em seus 14 milhões de hectares, envolve três províncias e numerosos distritos. O lugar é tradicionalmente ocupado por grupos etnolinguísticos matrilineares emakhuwa, cujos saberes e práticas agrícolas escapam àqueles fomentados no âmbito da cooperação Sul-Sul. O ProSAVANA, defende esta pesquisa, foi o nome pelo qual camponeses e camponesas conseguiram expressar temores, desejos e questões que perpassam suas existências, de forma que este texto o toma como um acontecimento. Com o objetivo de descrever e interpretar as fricções entre distintos modos de identificação provocadas pela emergência do acontecimento ProSAVANA no norte moçambicano, empreendeu-se um trabalho de investigação eminentemente qualitativa e de inspiração etnográfica. A pesquisa de campo que informa este trabalho é do tipo multissituada e contou com dois períodos em Maputo e no norte moçambicano, entre fevereiro e março de 2017 e entre janeiro e abril de 2018, assim como um período de campo no centro-oeste brasileiro e em Brasília, entre outubro e novembro de 2018. A fim de seguir as linhas de história que resultam na cartografia do conflito, foram empregadas técnicas de observação, entrevistas abertas, registros fotográficos e confecção de diários de campo, bem como se obteve acesso a acervos de jornais e documentos. A presente formulação teórico-etnográfica, então, é resultado do encontro entre o trabalho de campo e um quadro epistemológico confeccionado a partir da teoria ator-rede (cfe. Bruno Latour), perspectivas de corte pós-colonial (cfe. Grada Kilomba e Frantz Fanon) e literatura etnológica desenvolvida no norte moçambicano (cfe. Signe Arnfred e Christian Geffray). Considera-se que neste cenário de disputas, as ciências exercem um papel chave, pois, inscritas em um modo de identificação naturalista (cfe. Philippe Descola), produzem similaridades e continuidades entre experiências distintas: o cerrado brasileiro e a savana africana, cuja natureza compartilhada é produzida e reforçada por artefatos como mapas e paralelos geográficos. Na cartografia da rede considera-se que marcadores que produzem diferença e desigualdade precisam ser observados, de forma que é produzida uma reflexão acerca de intersecções entre marcadores sociais (notadamente etnia e gênero) e a própria terra. Estas diferenças se fazem ver por meio da língua e das maneiras de narrar a própria existência. A descrição do acontecimento ProSAVANA no norte moçambicano permite concluir que o desenvolvimento produz fricções entre distintos modos de identificação, dos quais decorrem diferentes mundos. Por fim, o empreendimento teórico-etnográfico realizado considera que a experiência moçambicana matiza as proposições teóricas acerca dos conflitos ambientais ao informar que sujeitos, terra e tempo se constituem mutuamente.