Investigação da atuação de mecanismos genéticos, epigenéticos e ambientais no desenvolvimento da obesidade

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2024
Autor(a) principal: Pellenz, Felipe Mateus
Orientador(a): Crispim, Daisy
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Não Informado pela instituição
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Palavras-chave em Inglês:
Link de acesso: http://hdl.handle.net/10183/280511
Resumo: A obesidade é uma doença crônica caraterizada pelo acúmulo de gordura no tecido adiposo, sendo decorrente do desequilíbrio entre a ingesta e o gasto calórico. Devido ao aumento exponencial da prevalência da obesidade no mundo, esta doença tem sido considerada como a epidemia do século 21. Além de ser frequente em indivíduos adultos, a frequência em crianças também tem crescido mundialmente e estudos mostram que a doença tende a permanecer na vida adulta. A obesidade é uma doença complexa e multifatorial visto que sua fisiopatologia envolve a interação entre fatores genéticos, epigenéticos e ambientais. Diversos fatores genéticos influenciam a suscetibilidade à obesidade, explicando cerca de 65% da variabilidade da doença. A análise integrativa de dados genéticos de diferentes populações, através de biologia de sistemas, pode contribuir para um melhor entendimento da fisiopatologia da obesidade infantil. Dessa forma, no primeiro artigo, realizamos uma busca sistemática de genes candidatos relacionados à obesidade infantil utilizando o banco de dados público DisGeNET. Foram identificados 191 genes associados com a doença, sendo que 12 destes genes foram considerados como hubbottleneck (INS, LEP, STAT3, POMC, ALB, TNF, BDNF, CAT, GCG, PPARG, VEGFA e ADIPOQ) após análises de rede de interação proteína-proteína. As análises de enriquecimento funcional indicam que estes genes estão envolvidos em vias relacionadas à inflamação, termogênese, metabolismo de glicose e lipídeos e sinalização de citocinas. Além disso, foram identificados 4 módulos funcionais para este grupo de 191 genes. De um modo geral, este estudo foi capaz de identificar um grupo de genes altamente interconectados associado com a obesidade infantil. Os fatores genéticos não conseguem explicar isoladamente a variabilidade e o aumento da prevalência de obesidade. Neste contexto, mudanças em mecanismos epigenéticos foram observadas em adultos e crianças com obesidade. A metilação, um dos principais mecanismos epigenéticos, regula negativamente a expressão gênica em resposta a fatores ambientais. Apesar de alguns estudos sugerirem que genes diferencialmente metilados (DMGs) estão associados com a obesidade infantil, os resultados ainda são inconclusivos. Além disso, padrões de metilação tendem a ser persistentes ao longo da vida. Dessa forma, a identificação de genes diferencialmente expressos (DEGs) regulados por metilação (MeDEGs) pode contribuir para o entendimento dos eventos moleculares complexos envolvidos na obesidade infantil. Neste contexto, no segundo artigo da tese, investigamos MeDEGs associados com a obesidade infantil através de uma análise integrativa in silico. Para isto, 4 datasets contendo dados globais de expressão (um de expressão gênica e 3 de metilação) foram obtidos no banco de dados público Gene Expression Omnibus. Após a sobreposição das listas dos 859 DEGs e 3,455 DMGs, foram identificados 70 MeDEGs. Entre eles, 25 genes apresentaram padrão hipermetilado-expressão reduzida e 45 apresentaram padrão hipometilado-expressão aumentada no tecido adiposo visceral (TAV) de crianças com obesidade comparado a crianças sem obesidade. A rede de interação proteína-proteína desses MeDEGs apresentou 3 genes hub-bottleneck (CCL5, STAT1 e GATA3) e dois módulos funcionais. Análises de enriquecimento funcional demonstram que estes MeDEGs estão envolvidos em processos de diferenciação celular, inflamação, sinalização de citocinas, metabolismo de glicose e lipídeos, resistência à insulina (RI) e apoptose. Os resultados deste estudo indicam uma lista de MeDEGs envolvidos na obesidade infantil, bem como identifica vias metabólicas em que eles atuam, fornecendo uma compreensão mais profunda dos mecanismos reguladores da obesidade infantil mediados por metilação de DNA. Embora a suscetibilidade genética e os mecanismos epigenéticos apresentem papel importante no desenvolvimento da obesidade, fatores ambientais, como sedentarismo e padrões de dieta, são considerados fatores-chave por trás do aumento exponencial de doenças metabólicas relacionadas à obesidade. A dieta de cafeteria (DCAF) ou dieta ocidental é hipercalórica e rica em alimentos ultraprocessados e de baixa densidade nutricional, possuindo potencial inflamatório e oxidativo. A exposição de camundongos à DCAF mimetiza os padrões de consumo alimentar humano e serve como modelo de estudo da obesidade; entretanto, as alterações metabólicas e nutrigenômicas nesse modelo são pouco conhecidas. Sendo assim, no 3° artigo da tese, implementamos um modelo de obesidade induzida por DCAF em camundongos para investigar as alterações metabólicas associadas, bem como a expressão de diversos genes relacionados a rotas das adipocitocinas, inflamação, apoptose e metabolismo da glicose no TAV, tecido adiposo subcutâneo (TAS), fígado e músculo. Para isto, foram incluídos 40 camundongos C57BL/6 machos, sendo 20 que receberam dieta padrão (DP) e 20, DCAF (CAF). Após 16 semanas de seguimento, o grupo CAF ganhou mais peso e apresentou uma glicemia média maior comparado aos controles. Ainda, o escore de esteatose hepática, índice de RI e níveis de adiponectina e leptina foram maiores no grupo CAF. Com relação às análises de expressão gênica, observou-se 19 genes desregulados no TAV, 6 genes no TAS, 11 genes no fígado e 4 genes no músculo esquelético destes animais comparados ao grupo DP. Além disso, a relação Itgax/Llgl1 foi aumentada no TAV dos camundongos expostos à DCAF, indicando uma mudança no fenótipo dos macrófagos de M2 para M1, que é o inflamatório. Com isso, foi possível padronizar um modelo de DCAF em camundongos C57BL/6 e descrever as alterações metabólicas e moleculares associadas a este modelo. Alguns estudos têm demonstrado que o mirtilo apresenta ação benéfica na obesidade, reduzindo a inflamação e o estresse oxidativo, bem como atenuando o ganho de peso em humanos e em modelos animais. Entretanto, nenhum estudo testou a eficácia da adição do mirtilo a uma dieta como a DCAF. Dessa forma, no nosso 4° artigo, avaliamos o efeito do consumo de mirtilo sobre parâmetros biométricos, metabólicos e nutrigenômicos em camundongos expostos à DCAF. Foram incluídos 32 camundongos C57BL/6 machos distribuídos em 3 grupos experimentais: controle (n= 10; DP), DCAF (n= 12, CAF) e mirtilo + DCAF (n= 10, BB). O consumo de mirtilo preveniu o ganho de peso induzido pela DCAF visto que após 16 semanas de seguimento, os animais apresentaram peso similar aos animais do grupo DP. O índice de Lee (equivalente ao índice de massa corporal) e o delta-peso (peso final - peso inicial) também foram maiores no grupo CAF comparado aos grupos DP e BB. Além disso, o mirtilo foi capaz de prevenir parcialmente o aumento da glicemia de jejum, RI e protegeu contra a esteatose hepática e estresse oxidativo no fígado e hipotálamo. As análises de expressão gênica demonstraram que o mirtilo foi capaz de modular 16 genes no TAV, 10 genes no TAS, 4 no tecido adiposo marrom, 12 genes no fígado, 5 no músculo esquelético e 4 no hipotálamo dos animais do grupo BB. Ainda, a relação Itgax/Llgl1 também foi aumentada no TAV dos camundongos DCAF comparado aos grupos BB e DP. Em conclusão, os estudos incluídos nesta tese evidenciaram o papel de fatores genéticos, epigenéticos e ambientais no desenvolvimento da obesidade. Em especial, foram identificados genes candidatos e MeDEGs envolvidos na patogênese da obesidade infantil, bem como as vias e processos biológicos nas quais estes genes estão envolvidos. Ainda, foi possível implementar um modelo de DCAF para a indução de obesidade em camundongos C57BL/6, bem como avaliar as alterações biométricas, metabólicas e nutrigenômicas envolvidas neste modelo. Por fim, foi possível investigar o importante efeito do consumo de mirtilos para tratamento da obesidade, o qual melhorou desfechos biométricos, glicêmicos, metabólicos, de estresse oxidativo e nutrigenômicos. Assim, podemos considerar o consumo de mirtilo como uma estratégia dietética promissora para prevenir disfunções metabólicas associadas à obesidade.