Resumo: |
Fundamentação: O acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico apresenta alta morbidade, sendo responsável por sequelas motoras, sensoriais e cognitivas. A predição de desfechos após o evento isquêmico agudo é de interesse de médicos, pacientes e seus familiares para definições de tratamentos e de medidas de reabilitação, bem como para determinação de cuidados paliativos. Na prática clínica, a avaliação prognóstica está baseada em escalas neurológicas validadas, no entanto, as escalas apresentam limitações, não sendo capazes de avaliar todas as dimensões da doença. Dessa forma, a dosagem de biomarcadores sanguíneos associada à utilização de escores já amplamente usados pode melhorar a predição das sequelas. A isquemia cerebral causa a liberação de componentes altamente imunogênicos ou padrões moleculares associados a danos (DAMPs) do cérebro para a circulação sistêmica. Esses DAMPs ativam e recrutam células imunes periféricas para regiões cerebrais lesionadas. Como consequência, processos tóxicos ou pró-inflamatórios e protetores ou anti-inflamatórios são ativados após o acidente vascular cerebral isquêmico. O presente estudo objetiva investigar a associação de alguns biomarcadores sanguíneos com as escalas de AVC, bem como avaliar a capacidade dos biomarcadores selecionados na predição de desfechos neurológicos durante o tempo de acompanhamento hospitalar e após quatro anos. Para este estudo, selecionamos quatro importantes biomarcadores envolvidos no processo inflamatório pós-isquêmico: receptor desencadeador expresso nas células mielóides tipo 1 (TREM-1), receptor desencadeador expresso nas células mielóides tipo 2 (TREM-2), interleucina 23 (IL -23) e interleucina 17 (IL-17). Material e Métodos: Incluímos cinquenta pacientes consecutivos com AVC isquêmico agudo admitidos na unidade neurovascular da emergência ou na unidade de medicina intensiva do Hospital de Clínicas de Porto Alegre dentro de 24 horas após o início dos sintomas. Foram coletadas amostras sanguíneas nas primeiras 24 horas, no terceiro e no quinto dias após o AVC para dosagem de TREM-1, TREM-2, IL-23 e IL-17. A gravidade do AVC e o grau de dependência funcional dos pacientes foram mensurados através da escala do National Institutes of Health Stroke Scale (NIHSS) nas primeiras 24 horas do evento agudo, no terceiro e quinto dias após o AVC e no momento da alta hospitalar. Também foi aplicada a escala de Rankin modificada (mRS) nos três momentos das coletas sanguíneas, na alta hospitalar e após quatro anos. Para análise dos desfechos neurológicos de curto e longo prazos, os pacientes foram subdivididos em dois grupos, considerando desfecho favorável (NIHSS ≤ 6 e mRS ≤ 2) e desfecho desfavorável (NIHSS > 6 e mRS > 2). Resultados: A taxa de mortalidade atingiu 28% após quatro anos. Analisando as correlações entre os biomarcadores e as escalas de AVC, o TREM-1 exibiu correlações com as escalas de NIHSS e mRS dentro de 24 horas (NIHSS e TREM-1: p=0,029; mRS e TREM-1: p=0,023) e a IL-23 exibiu correlação apenas com a mRS em 24 horas (p=0,017). Os níveis séricos de TREM-1 e IL-23 em 24 horas também apresentaram a melhor correlação com os resultados neurológicos na alta hospitalar (NIHSS e TREM-1: p=0,021; mRS e TREM-1: p=0,049; mRS e IL-23: p=0,033). Ambos os escores neurológicos para desfecho favorável (NIHSS ≤ 6 e mRS ≤ 2) na alta hospitalar correlacionaram-se com as concentrações de TREM-1 nas primeiras 24 horas e com os níveis de IL-23 nas primeiras 24 horas e no quinto dia, com baixo valor preditivo. As demais medidas não mostraram capacidade preditiva durante o tempo de observação hospitalar ou após quatro anos. As concentrações séricas de TREM-1 nas primeiras 24 horas após o AVC foram significativamente maiores em pacientes com desfecho desfavorável (mRS > 2) na alta hospitalar (p=0,021). Todavia, não houve associação entre os níveis de TREM-2, IL-23 e IL-17 e a dicotomização dos resultados neurológicos na alta hospitalar e após quatro anos. Conclusão: Os biomarcadores séricos podem ser úteis na avaliação da severidade do AVC, correlacionando-se com achados clínicos e apresentando valor prognóstico. Neste estudo, TREM-1 e IL-23 foram os melhores biomarcadores prognósticos. |
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