Morte súbita e inesperada na infância associada a erros inatos do metabolismo no Brasil : uma abordagem epidemiológica e genética

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2018
Autor(a) principal: Bitencourt, Fernanda Hendges de
Orientador(a): Schwartz, Ida Vanessa Doederlein
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Não Informado pela instituição
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Palavras-chave em Inglês:
Link de acesso: http://hdl.handle.net/10183/193656
Resumo: Introdução: Morte súbita inesperada e inexplicada na infância ou morte súbita infantil inesperada (SUDI, do inglês Sudden unexpected death in infancy) é uma das mais frequentes causas de óbito no primeiro ano de vida. De 3 a 6% das crianças com SUDI podem ter algum erro inato do metabolismo (EIM – doenças genéticas geralmente autossômicas recessivas), sendo que SUDI pode ser a única manifestação dessas doenças. A deficiência de acil-CoA desidrogenase de cadeia media (MCADD), um defeito de beta-oxidação de ácidos graxos, parece ser o principal EIM associado à SUDI. Até o momento, não há na literatura qualquer dado sobre a frequência de SUDI associada a EIM no território brasileiro. Além disso, não existe na literatura dados sobre a frequência de MCADD e suas variantes no Rio Grande do Sul (RS). Como muitos dos EIM são tratáveis, o seu diagnóstico e tratamento precoces poderiam prevenir a ocorrência de SUDI. Objetivos gerais: 1) Estimar e caracterizar por região do Brasil, os óbitos relacionados a EIM associados a SUDI em neonatos e lactentes <1ano de idade no período de 2002 a 2014 2) Avaliar a fração atribuível dos EIM nas situações de SUDI em neonatos e lactentes <1ano de idade na população do RS no período de 2002 a 2014. Metodologia: Etapa 1 (Análise Epidemiológica): estudo transversal de base populacional utilizando as bases de dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) correspondentes ao período 2002-2014. A partir do SIM, foram identificados os óbitos de crianças <1ano no Brasil e no RS cuja causa básica corresponda a alguns dos EIM associados a SUDI (CID10-E70 – distúrbios do metabolismo de aminoácidos aromáticos, E71 – distúrbios do metabolismo de aminoácidos de cadeia ramificada e do metabolismo de ácidos graxos, E72 – outros distúrbios do metabolismo de aminoácidos, E74 – outros distúrbios do metabolismo de carboidratos) e à SUDI (CID10-R95 – Síndrome de morte súbita na infância, R96 – outras mortes súbitas de causa desconhecida, e R99 – outras causas mal definidas e não especificadas de mortalidade). Para os dados do RS, foram solicitadas à Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre as declarações de óbito (DOs) dessas crianças, as quais foram analisadas em relação às variáveis de interesse. Para os óbitos ocorridos no RS, foi realizado o georreferenciamento dos casos a fim de avaliar a presença de cluster de SUDI e de EIM associados a SUDI. Etapa 2 (Análise Genética): Estudo observacional e transversal de detecção de heterozigotos para as variantes patogênicas mais frequentes nos genes ACADM (MCADD; c.985A>G e c.199T>C). Os participantes foram doadores voluntários de sangue que comparecerem ao Banco de Sangue do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Resultados: Etapa 1: de 2002 a 2014 foram registrados 199 óbitos de crianças <1ano no Brasil devido a EIM associados à SUDI, sendo a prevalência de óbitos calculada de 0,67:10.000 nascidos vivos (IC95% 0,58-0,77). Destes 199 óbitos, 18 (9,0%) ocorreram na região Norte do país, 43 (21,6%) na região Nordeste, 80 (40,2%) na região Sudeste, 46 (23,1%) na região Sul e 12 (6,0%) na região Centro-Oeste. Em todo o território nacional, CID10-E74 foi o predominante. Entre 2002 e 2014, 21 crianças <1ano faleceram no RS devido aos EIM pesquisados. No mesmo período, 650 faleceram devido à SUDI, sendo que a taxa calculada foi de 0,53:10.000 nascidos vivos (IC95% 0,33-0,81) e de 16,0:10.000 nascidos vivos (IC95% 15-18), respectivamente. A análise das DOs mostrou que há um alto grau de incomplitude, principalmente no que diz respeito a afecções iniciais, sequenciais e terminais (que levam a identificação da causa básica de óbito) nos casos de SUDI, não permitindo a associação entre SUDI e EIM. O georreferenciamento dos óbitos de criança <1ano por CID10-R95 mostrou que o município de Pejuçara é um isolado geográfico com uma alta taxa de óbitos infantis. Com relação ao CID10-R99, os municípios de Nova Bréscia e Paraí também são isolados geográficos com altas taxas de óbitos infantis por esse CID. Nova Bréscia e Paraí seguem como isolados geográficos quando todos os óbitos por SUDI foram considerados (CID10-R95, R96 e R99). O georreferenciamento de óbitos por CID10-R96 e EIM associados a SUDI não foi realizado devido ao pequenos número de registros de óbitos por esses CIDs no período avaliado (13 e 21 casos, respectivamente). Etapa 2: Até o momento, foram analisados 300 indivíduos para a variante c.199T<C. Não foram encontrados alelos para essa variante no gene ACADM na população estudada. Discussão/Conclusões: Este é o primeiro estudo a avaliar o número de óbitos de crianças <1ano atribuído a SUDI e a EIM associados à SUDI no território nacional e, em especial, no RS num período de treze anos. O baixo número de registros de óbitos por EIM associados à SUDI no Brasil pode ser resultado não da raridade dos distúrbios, mas sim, da subnotificação e/ou subdiagnóstico. Apesar de MCADD ser o principal EIM associado à SUDI, o CID10-E71 (no qual estão incluídos os defeitos de beta-oxidação de ácidos graxos), foi o menos prevalente. No RS, por sua vez, o número de óbitos por EIM associados à SUDI reflete o panorama nacional, com apenas 21 casos registrados no período avaliado. Por outro lado, os óbitos por SUDI não permitem a associação destes com EIM devido à escassez de informações nas DOs, principalmente no que diz respeito às afecções iniciais, sequenciais ou terminais que conduziram ao estabelecimento da causa básica de óbito. A presença de isolados geográficos com altas taxas de óbitos de crianças <1ano nos municípios de Paraí, Nova Bréscia e Pejuçara pode ser um indicador da presença de EIM na região. Essa hipótese é apoiada por fatores tais como a dificuldade de diagnóstico de doenças tão complexas como os EIM; a ausência de necropsia metabólica no Brasil; a ancestralidade europeia dessas regiões, a qual pode estar associada a uma maior incidência de MCADD, principal EIM relacionado a SUDI. Com relação à análise genética do gene ACADM, os resultados ainda são parciais, não permitindo o estabelecimento da frequência de heterozigotos para as mutações c.199T>C e c.985A>G na população saudável do RS, e nem a determinação da incidência de MCADD na região.