Resumo: |
Esta pesquisa se propõe a investigar as marcas da cultura audiovisual contemporânea inscritas nas propagandas produzidas pela Al Hayat Media Center, braço midiático do Estado Islâmico (EI) especializado na produção de conteúdos em inglês e idiomas europeus. A investigação cerca-se de um repertório teórico que procura elucidar os motivos por trás das escolhas discursivas e técnicas que dão forma a essas produções, o que nos conduz a três etapas iniciais de trabalho. A primeira é o mapeamento do processo de ascensão dos movimentos fundamentalistas islâmicos modernos, o que nos dá um vislumbre da narrativa que influenciou o pensamento dos ideólogos criadores do Islamismo no século XX, cujas ideias servem como base para a construção do discurso do EI. O passo seguinte é desvelar as práticas midiáticas do movimento do qual o grupo deriva, mostrando como elas evoluíram paralelamente ao processo de globalização e disseminação de novas tecnologias da comunicação. Reflexões sobre os processos constitutivos da cultura e os impactos dos novos sistemas de informação e comunicação sobre eles, sob o viés da midiatização, completam a apreensão do fenômeno, assim como os parâmetros da cultural audiovisual contemporânea que nos ajudam a situar as ações do Estado Islâmico numa sociedade permanentemente "atacada" por bombas de imagens que reavivam o poder do realismo. A partir dessa base teórica, analisamos 10 vídeos lançados pela Al Hayat Media Center entre 2014 e 2016. Disponibilizados no repositório online mantido por Aaron Zelin, pesquisador do The Washington Institute For Near East Policy, eles atendem dois critérios principais: foram divulgados no período de ascensão do Estado Islâmico como personagem global (por isso sintetizam seus anseios e estratégias publicistas) e constituem uma rica amostra do hibridismo das peças audiovisuais do grupo destinadas à audiência ocidental, sustentando a hipótese de que elas fundem elementos da cultura audiovisual contemporânea e da cultura jihadista, neste caso fortemente representada pelo formato do vídeo nashīd. Nos propomos a identificar as características de cada produção e traçar pontos de conexão que nos permitem agrupá-las em grandes categorias, que chamamos de "marcas audiovisuais" e cujo objetivo é provar onde a propaganda do Estado Islâmico busca seu respaldo. Para tanto, propomos um método de análise baseado no esqueleto metodológico criado por Francis Vanoye e Anne Goliot-Lété (1994) para analisar os spots publicitários. Ele baseia-se em dois eixos centrais: estilo e discurso. O primeiro é composto por quatro diretrizes que nos ajudam a descrever a estrutura dos vídeos e determinar suas particularidades estilísticas: duração, matéria visual, característica dos planos e montagem. O segundo eixo procura determinar como a mensagem do grupo é articulada em cada vídeo. Para isso, propõe três locais de observação baseados na funcionalidade do "contrato de comunicação" proposto por Patrick Charaudeau (2006). A combinação desses dois polos nos permite comprovar que a propaganda do EI dispõe de lógicas construtivas e ferramentas de edição naturalizadas pela cultura audiovisual contemporânea, o que converte o arsenal simbólico do Estado Islâmico num exímio exemplar da nova face do terror. |
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