"Por que você não pegou Miguel Otávio no colo?" Branquitude e negligenciamento das crianças negras

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2024
Autor(a) principal: Batista, Amanda Massucci [UNIFESP]
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Dissertação
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade Federal de São Paulo
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://hdl.handle.net/11600/71881
Resumo: A presente pesquisa tem por objetivo analisar como a branquitude percebe as crianças negras, verificando quais caminhos são percorridos para a constituição do discurso de supremacia branca que culmina no negligenciamento dessas crianças. Trata-se de pesquisa qualitativa, baseada no estudo de caso da morte evitável de Miguel Otávio Santana da Silva, aos cinco anos de idade, em Recife/PE. No dia 02 de junho de 2020, Miguel Otávio, filho de Mirtes Renata Santana de Souza, ficou sob a responsabilidade de Sarí Mariana Gaspar Corte Real, então patroa de sua mãe, enquanto a empregada doméstica levava a cachorra da família para fazer suas necessidades. Ao buscar pela mãe, Miguel é deixado sozinho no elevador, desce no nono andar do edifício em que se encontrava, de onde cai e morre. A partir deste caso, realizo uma reflexão acerca do trabalho doméstico no âmbito do cuidado de crianças pequenas e bebês, que no Brasil é historicamente realizado por mulheres negras. Além dessa primeira reflexão, a pesquisa analisa o discurso de defesa de Sarí Corte Real em dois documentos jurídicos; uma entrevista realizada com a acusada no programa Fantástico da Rede Globo de televisão; e, comentários que defendem a ex-patroa de Mirtes Renata na rede social X (antigo Twitter). O conceito de branquitude é o principal eixo de tal análise e o referencial teórico utilizado considera a infância como uma construção social, além de partir da perspectiva de autores afrocentrados e/ou críticos ao adultocentrismo. Nos dados analisados foi possível encontrar elementos discursivos que explicitam e contribuem para a manutenção da forma social escravista (Sodré, 2023), preservando uma sensibilidade coletiva concreta na qual mantém-se as hierarquias raciais. Nas construções narrativas da defesa de Sarí Corte Real, menor é o descritor mais utilizado para referir-se a Miguel Otávio, enquanto agente é o descritor mais utilizado para Sarí. A defesa pauta-se em adjetivar Miguel Otávio, construindo um espectro, além de reduzido, pejorativo em relação ao seu comportamento. No que diz respeito à análise da repercussão do caso, foi possível verificar aspectos cruciais relacionados ao modo de funcionamento do pacto da branquitude (Bento, 2002), como a reiteração do argumento utilizado pela defesa da acusada, de que a mesma fez tudo o que estava em seu alcance, em um dos programas de maior índice de audiência da televisão nacional. Na análise da opinião pública foi possível perceber que os comentários que defendem Sarí Corte Real, por mais que existam em menor quantidade do que os que pedem justiça por Miguel, afirmam-se por discursos adultocêntricos e racistas, culpabilizando ora Mirtes Renata, ora Miguel Otávio por sua própria morte.