Teoria fundamentada na sobrevivência da pessoa travesti e transexual à ideação suicida

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2021
Autor(a) principal: Silva, Glauber Weder dos Santos
Orientador(a): Miranda, Francisco Arnoldo Nunes de
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Programa de Pós-Graduação: PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Brasil
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://repositorio.ufrn.br/handle/123456789/44910
Resumo: Introdução: o suicídio, fenômeno complexo, é um grave problema de saúde pública e a ideação suicida tem sido identificada na literatura como melhor preditor para preveni-lo, em particular entre pessoas travestis e transexuais. Descobrir as estratégias, mecanismos e dispositivos para superação da ideação suicida entre travestis e transexuais, constituem, per si, um importante passo para valorizar suas vidas. Objetivo: compreender como pessoas travestis e transexuais lidam com a ideação suicida. Métodos: Pesquisa desenvolvida em duas etapas. Na primeira etapa desenvolveu-se estudo com triangulação concomitante de dados no período de 2015 a 2016. Participaram 58 travestis e transexuais de organizações nãogovernamentais do Rio Grande do Norte/Brasil. Com os dados quantitativos, verificou-se a prevalência de ideação suicida por meio da The Beck Scale for Suicide Ideation (BSSI) e recebeu tratamento estatístico descritivo. Com os dados qualitativos descreveu-se os significados atribuídos ao suicídio por meio da análise temática de conteúdo. Os dados quantitativos e qualitativos foram analisados na medida que se apresentavam similares, complementares ou contrapostos. Posteriormente, na segunda etapa, entre 2018 e 2021, utilizou-se os procedimentos da Grounded Theory na vertente proposta por Strauss e Corbin. Foram elegíveis para o primeiro grupo amostral as 24 pessoas travestis e transexuais com ideação suicida na etapa anterior. A partir das hipóteses aventadas no processo de análise e pelo princípio da saturação teórica, o estudo arrolou 18 participantes divididos em cinco grupos amostrais: primeiro - nove pessoas travestis e transexuais com ideação suicida na primeira fase; segundo - três pessoas travestis e transexuais líderes/ativistas sociais; terceiro - dois familiares do primeiro grupo; quarto - duas pessoas travestis e transexuais em hormonioterapia; quinto - duas profissionais de saúde do ambulatório trans do Rio Grande do Norte, Brasil. Os dados foram coletados por meio de entrevistas em profundidade no período de 2016 a 2021, com coleta e análise dos dados simultâneos, com procedimentos de codificações aberta, axial e seletiva e construção de diagramas, memorandos e matrizes consequenciais. Elaborou-se um modelo teórico-explicativo do fenômeno identificado. Estudo aprovado pelo CEP/UFRN nas duas fases: pareceres nº 1.314.559 de 09/11/2015 e nº 3.187.452 de 08/03/2019, respectivamente. Resultados: a prevalência de ideação suicida entre os participantes foi de 41,4% (n=24) (IC% 41,3 -54,51%). Da análise estatística descritiva em consonância com o processo de codificação, classificação e categorização, elaborou-se um joint-display com três fases: 1ª fase "Ele chegava e me colocava debaixo dos braços dele": os avós como núcleo familiar, "O que estou fazendo aqui nessa vida?": elaborando os sentimentos e razões para cometer suicídio e item BSSI “razões para tentativa de suicídio”; 2ª fase "Tendo um segundo de coragem você vai e faz": experimentando o suicídio e itens BSSI “tentativa de suicídio anterior, desejo de morrer e tentativa de suicídio ativa”; 3ª fase "Nunca irão aceitar a nossa transexualidade": vivenciando a transfobia na família e sociedade, "Ombro amigo e de mãe": superando o comportamento suicida e item BSSI “atitude em relação à ideação”. Buscando compreender como as pessoas travestis e transexuais lidavam com a ideação suicida, três componentes, onze temas, quarenta conceitos, 115 categorias e 799 códigos emergiram nos procedimentos de teorização que integram a categoria central (teoria substantiva) – “Aceitação da pessoa travesti e transexual”: 1º componente: a outorga familiar (condições) – convivendo em família (a não aceitação dos pais, o pai violando o filho trans, sofrendo por rejeição familiar vs. aceitação materna, acolhimento dos avós e compreensão familiar sobre transexualidade); 2º componente: A socialidade (ações/interações) – o ativismo social (sentindo a responsabilidade do ativismo vs. identificando-se com o ativismo trans, tornando ativista, superando a ideação suicida no ativismo e agindo pela saúde trans); as redes sociais (rejeitando pessoas trans, violentando pessoas trans, vivendo relações abusivas vs. suporte para pessoas trans); a escola (rejeitando pessoas trans vs. estudando para viver); o mundo do trabalho (não acessando o mercado de trabalho, sendo estigmatizado no mercado de trabalho vs. sendo aceito no mercado de trabalho, sobrevivendo com ajuda do trabalho); os serviços de saúde (sendo rejeitado em serviços de saúde vs. recebendo atenção em saúde especializada); os profissionais de saúde (negatividade atitudinal vs. ofertando atenção integral); 3º componente: a Autoafirmação (resultados/consequências) – a autorregulação (mutilando-se); o comportamento suicida (surgindo a ideação suicida, tentando suicídio vs. eliminando a ideação suicida); a hormonização (frustrando-se pela falta de apoio, autohormonização, consequências do uso indevido vs. ajudando na aceitação de si, alcançando autenticidade, recebendo acompanhamento profissional, podendo não usar); e sendo quem é (inconformando-se com a pele que habita, sofrimento psíquico vs. entendendo ser trans e tornando-se quem é). Considerações finais: A articulação teórica-metodológica entre os dados mostrou que a sobrevivência das pessoas travestis e transexuais alicerça-se na aceitação da pessoa trans nos cenários que ocupa, integrando a família, o contexto social e a autoafirmação de quem é. Considera-se as convergências e divergências dos resultados para sustentar a tese: a sobrevivência da pessoa travesti e transexual à ideação suicida é possível quando a família e sociedade lhes aceitam e conferem identidade social e condições de acesso ao mundo do trabalho e do alcance das políticas de saúde que lhes concedam autonomia sobre seu corpo, a expressão libertária da identidade de gênero e o direito a ser quem é, de fato.