Eu pari foi pra curar: cuidado, itinerâncias e decolonialidades do nascer na tradição.

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2022
Autor(a) principal: Campos, Marta lattes
Orientador(a): Dejo, Vania Nora Bustamante
Banca de defesa: Reis, Ana Paula dos, Mota, Clarice Santos, Carneiro, Rosamaria Giatti, Dejo, Vania Nora Bustamante
Tipo de documento: Dissertação
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade Federal da Bahia
Programa de Pós-Graduação: Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (PPGSC-ISC)
Departamento: Instituto de Saúde Coletiva - ISC
País: Brasil
Palavras-chave em Português:
Área do conhecimento CNPq:
Link de acesso: https://repositorio.ufba.br/handle/ri/37973
Resumo: Esta dissertação aborda um tema pouco estudado na Saúde Coletiva: as práticas de cuidado feitas por parteiras na tradição, integradas à Escola de Saberes Cultura e Tradição Ancestral/ESCTA-Cais do Parto, bem como os itinerários de cuidado vivenciado por casais que escolheram este formato assistencial para o nascimento de seus filhos, no contexto de crise sociossanitária provocada pela pandemia da COVID-19. Tendo como objetivo compreender como o cuidado na tradição é ofertado na gestação, parto e pós-parto, analisei as cosmologias, modos de fazer o cuidado e as metodologias manifestadas nas rodas virtuais de gestantes e casais grávidos da ESCTA/Cais do Parto. Ademais, compreendi, à luz das narrativas dos casais, como estes simbolizaram suas experiências perinatais, os itinerários de cuidado, assim como as relações vinculares tecidas junto às parteiras. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de inspiração etnográfica, desenvolvida durante os meses de outubro/ 2020 a março/ 2021, quando realizei observação participante nas rodas virtuais e conduzi entrevistas com casais cuidados pela tradição. Privilegiei a estratégia da Análise Temática para a organização, decomposição e interpretação dos dados produzidos em campo. Visando compreender o cenário do partejar nacional, apresentei os elementos políticos e sociais envolvidos na geopolítica dos partos no Brasil, para em seguida localizar no gradiente de saberes as práticas feita por parteiras na tradição. Caracterizei as parteiras em questão, apontando que as mesmas produzem práticas contra-hegemônicas e decoloniais de cuidado. Neste sentido, afirmo que ao se aproximarem de uma perspectiva decolonial, constroem movimentos de resistência à lógica moderna/colonial, estruturando pontos de rupturas ao modelo dominante do cuidado no parto e nascimento. Identifiquei que o cuidado na tradição se organizou em torno de três princípios cosmológicos: a espiritualidade, tridimensionalidade e ancestralidade, além de aspectos metodológicos como a oralidade, a educação popular e os rituais. Estes elementos indicaram que o cuidado na tradição reafirma sua diferença ontológica, epistêmica e política do seu fazer, atuando para visibilizar e resgatar os saberes tradicionais no campo da saúde obstétrica brasileira contemporânea. Ademais, analisei as trajetórias dos casais nos momentos anteriores à gestação, na descoberta gestacional, nas buscas e escolhas pela assistência “que mais produziu sentido”, no contexto de parto e pós parto, no encontro com o sistema de registro cível e nas relações de comadrio. Argumento que, apesar das distintas itinerâncias, a escolha pela assistência na tradição acontece, revelando projetos individuais de como parir/nascer cuja centralidade é a autonomia e o desejo de enriquecimento e singularidade das experiências perinatais dos casais. Entretanto, ao se articular ao projeto coletivo decolonial de cuidado na tradição, a escolha inicialmente mediada pelo individualismo se direcionou para a centralização do vínculo com as parteiras, desdobrando-se na relação de comadrio, cuja base foi o comunitarismo. Depreendi, portanto, que os itinerários de cuidado tecidos pelos casais escutados nesta investigação, apresentaram como relevo inter-relações entre autonomia-enriquecimento-relacionalidade, conformando um tipo de individualismo misto, cujas conotações seriam mais relacionais, podendo ser compreendido como um individualismo-relacional.