Do existencialismo sociológico à epistemologia insana: a ordem social como problema psíquico

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2014
Autor(a) principal: Peters, Gabriel Moura
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Centro de Ciências Sociais::Instituto de Estudos Sociais e Políticos
Brasil
UERJ
Programa de Pós-Graduação em Sociologia
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: http://www.bdtd.uerj.br/handle/1/18682
Resumo: As abordagens praxiológicas na teoria social convergem na tese de que a ordem societária não constitui um dado, mas um resultado contingente de condutas habilidosas levadas a cabo em uma multiplicidade de cenários. O acento sobre a contingência da ordem social acarreta, entretanto, investigar por que os agentes investem, afinal, na inteligibilidade, na organização e na previsibilidade dos seus contextos de ação. Cada uma à sua maneira, as praxiologias de Peter Berger, Pierre Bourdieu e Anthony Giddens desaguaram na visão de que esse investimento responde a um anseio por segurança ontológica (lato sensu), um anelo vital por uma experiência do mundo e da própria existência como dotados de ordem, justificação e sentido. Com base nesses autores, a primeira parte da tese esquadrinha os mecanismos sociopsicológicos de produção da segurança ontológica, bem como algumas situações-limite ou “ameaças marginais” (Berger) que a perturbam, tais como o sonho, a psicose e a morte. O programa de investigação do “existencialismo sociológico” explora, assim, a conexão entre a contingência da ordem social, tal como pintada nas teorias praxiológicas, e o impulso existencial humano na direção de uma vivência ontologicamente segura do mundo e de si. Por sua feita, o estudo de “epistemologia insana” ou “heurística da insanidade” tecido nas partes subsequentes da tese faz uso de um artifício metodológico que se provou frutífero em uma variedade de domínios de pesquisa acerca da conditio humana (da psicanálise do século XX até a neurociência mais recente), qual seja, o mergulho no âmbito do “patológico” com vistas à iluminação de modalidades “normais” de ação e experiência. Lançando mão deste estratagema no plano das caracterizações sociológicas da conduta humana, o trabalho mobiliza descrições fenomenológicas e existenciais de vivências esquizoides e esquizofrênicas não apenas para compreendê-las à luz da teoria praxiológica da ação, mas também para aprofundar a teoria praxiológica da ação à luz do que aquelas descrições nos ensinam sobre a multiplicidade de modos de “ser-no-mundo” exibida pelo anthropos. O senso da autoevidência da realidade inscrito na “atitude natural”, a orientação fundamentalmente pragmática em relação ao ambiente objetal e intersubjetivo, o caráter corporalmente engajado da ação cotidiana, o apoio prático em crenças e habilidades tácitas (não apenas no cumprimento de tarefas rotineiras, mas também como o pano de fundo indispensável de deliberações reflexivas) – estes e outros traços de nosso ser-no-mundo, hegemonicamente incluídos em retratos da agência humana na teoria social contemporânea graças à influência de perspectivas praxiológicas, estão precisamente entre as disposições subjetivas mais radicalmente transformadas em diversos processos esquizoides ou esquizofrênicos. Calcada nos trabalhos de psiquiatras como Louis Sass e Thomas Fuchs, a tese defende que tais transformações, a despeito de seus custos psíquicos e sociais, não devem ser concebidas como meros déficits agenciais e experienciais, mas como atitudes existenciais complexas que requerem uma descrição tão minuciosa quanto possível. A relação pragmática com objetos materiais dá lugar a uma perplexidade quase-filosófica em face de sua mera realidade, os acordos intersubjetivos que oferecem familiaridade e ordem à realidade social em dada cultura são percebidos na sua arbitrariedade ontológica radical e o estranhamento quanto ao próprio corpo deixa de ser um lúdico ceticismo cartesiano para tornar-se uma vivência existencial profunda.