Efeitos do fogo de superfície experimental na ecologia de palmeiras (Arecaceae) de sub- bosque em uma floresta na Amazônia ocidental

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2014
Autor(a) principal: Liesenfeld, Marcus Vinicius Athaydes
Orientador(a): Vieira, Gil
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA
Programa de Pós-Graduação: Ciências de Florestas Tropicais - CFT
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://repositorio.inpa.gov.br/handle/1/4978
http://lattes.cnpq.br/0521283245281146
Resumo: Arecaceae é uma família botânica bem conhecida da flora mundial, facilmente reconhecida nas florestas onde habita e muito utilizada pela população. A família tem relevante participação nos diferentes ecossistemas mundiais, tanto em riqueza quanto em abundância. Palmeiras são citadas como resistentes ao fogo em diversos ecossistemas pelo mundo, no entanto, a literatura é escassa abordando o tema. Associado ao desmatamento o fogo de superfície é considerado hoje como principal ameaça às florestas da Amazônia. Na ecologia do fogo intensidade e severidade são conceitos distintos, porém, severidade pode ser conectada diretamente à mortalidade e quanto maior a severidade, maior a chance de mortalidade. A resposta de mortalidade é consequência das injúrias provocadas pelo calor: i) queima da copa; ii) queima do caule e iii) aquecimento da raiz (não abordado neste trabalho). No entanto, a planta pode rebrotar mesmo havendo morte do caule. Objetivamos portanto: i) descrever a riqueza de Arecaceae de sub-bosque em um trecho de floresta aberta; ii) amostrar a variação microclimática e o índice de área foliar do gradiente borda – interior desta floresta; iii) relacionar composição florística, abundância e variáveis abióticas; e iv) testar um conjunto de indivíduos de palmeiras de sub-bosque para avaliar quais características morfológicas estão relacionadas à mortalidade, rebrote e resistência pós-fogo de superfície experimental. Para tanto a) comparamos as respostas pós-fogo para cada espécie; b) ajustamos modelos de mortalidade em função das variáveis de severidade – proporção de queima da copa e proporção de queima do caule, distância da borda da floresta e variáveis microclimáticas; e c) avaliamos quais características morfológicas influenciam na relação das plantas com a severidade do dano pós-fogo e mortalidade. A área de estudo está localizada no município de Cruzeiro do Sul -AC, Brasil e a tipologia florestal é a Floresta Aberta com Palmeiras. Para o estudo florístico foram inventariadas 30 parcelas de 50 x 50 m em cinco transecções cada uma com comprimento de 600 m, orientadas no sentido borda-interior (total = 7,5 ha; indivíduos de estipe DAP >20 cm). Cada 50 x 50 m contém uma sub-unidade de 25 x 25 m (total = ~1,88 ha; indivíduos DAP > 2 cm e < 20 cm, ou folhas > 1 m de comprimento). Foram coletadas as variáveis físicas: temperatura ( o C), umidade relativa do ar (UR%), abertura do dossel (m 2 m -2 ) e variáveis edáfico-topográficas: topografia e profundidade de serapilheira. A abertura do dossel foi medida com o LAI – 2200. Para as medidas de microclima, foram utilizados seis sensores HOBO ® . Foi utilizada uma Análise de Componentes Principais para selecionar a variável física explicativa das diferenças entre as parcelas. A influência desta variável sobre a abundância das espécies de sub-bosque foi posteriormente testada usando Modelos Lineares Generalizados. A técnica do escalonamento não-métrico multidimensional (NMDS) foi usada para acessar as diferenças entre parcelas de borda e do interior da floresta. As queimadas experimentais tiveram ignição auxiliada por 20 ml de querosene. O experimento de queima foi dividido em três fases iguais para duas etapas de análise: Etapa 1: todas as espécies (169 ind. de estipe aéreo e subterrâneo). Etapa 2: somente espécies de sub-bosque com estipe aéreo, mais indivíduos jovens de Euterpe precatoria Mart. (80 ind.). Na Fase I selecionamos os indivíduos presentes nas parcelas previamente marcadas. Na Fase II, cada indivíduo foi submetido à queima controlada, sendo as temperaturas monitoradas com três termopares tipo K: temperatura (T1) na base da planta; (T2) na gema apical (para indivíduos de estipe aéreo) e (T3) ambiente. Na fase III, ~140 dias pós-fogo, foi obtida a proporção de queima da copa, mortalidade dos estipes e número de indivíduos rebrotando. As queimas de ignição por querosene aconteceram na época de menor pluviosidade e umidade do ar na região amazônica (verão amazônico; agosto e setembro de 2013), entre 11h00min e 17h00min. Foram feitas regressões logísticas entre as variáveis significativas independentes e as duas variáveis resposta do destino pós-fogo (sobrevivência ou mortalidade). O critério de informação de Akaike (AIC) foi utilizado como índice de escolha do melhor modelo ajustado. O poder de predição da equação de probabilidade de mortalidade foi testada a posteriori por meio da área sob a curva ROC (Curva de Sensibilidade do Operador). Os resultados prévios à queima nas 30 parcelas são de 1.750 indivíduos amostrados com 19 espécies de palmeiras, em 14 gêneros. A variação da umidade e temperatura no gradiente de borda – interior da floresta é evidente para julho, agosto e setembro, geralmente com temperatura maior e umidade menor na borda. O Índice de Área Foliar (LAI) aumenta da borda para o interior. A composição das espécies de sub- bosque não difere entre a borda e o interior da floresta. Attalea butyracea (Mutis ex L.f.)Wess.Boer e Attalea maripa (Aubl.) Mart. aparecem com maior densidade na borda, enquanto Oenocarpus bataua Mart. aparece com maior densidade no interior. O NMDS rodado somente para estas espécies indica distanciamento da composição florística entre borda e interior da floresta (stress = 0,1177). No entanto, o LAI explica a distribuição somente de O. bataua no gradiente borda e interior. Nos resultados do experimento de queima indivíduos de espécies de estipe aéreo (todos com caules finos) tiveram maior mortalidade que indivíduos de estipe subterrâneo. Por outro lado o rebrote basal pós- fogo é maior nos indivíduos de estipe aéreo. A. maripa foi a espécie que obteve melhor desempenho considerando o rebrote total (91,7%). O. bataua teve o menor sucesso no rebrote (31,8%) e maior proporção de mortalidade pós-fogo (59,1%). O modelo logístico de sobrevivência para as nove espécies de estipe subterrâneo, indica que a mortalidade aumenta na medida em que são maiores as médias de temperatura na base da planta. No tocante às espécies de estipe aéreo no sub-bosque mais a fase jovem de E. precatoria a mortalidade varia entre as espécies. Quanto maior é o diâmetro da base do estipe, menor será a mortalidade. Hyospathe elegans Mart. (65%) e Chamaedorea pauciflora Mart. (55%) são as espécies com maior número de estipes perdidos no pós-fogo. Além disso, a mortalidade dos juvenis de E. precatoria e das outras quatro espécies do experimento foi fortemente influenciada pelo padrão de queima da copa. A probabilidade de mortalidade aumentou com o aumento da queima das folhas. A temperatura na gema apical é variável, no entanto, não explica a mortalidade dos estipes. A altura do estipe e a altura total do indivíduo também não influenciam na mortalidade. O rebrote também variou entre as espécies. Bactris maraja Mart. teve o maior número de rebrotes basais por indivíduo (total de rebrotes = 20; 1,43 ±1,5 rebrotes ind -1 ) e maior altura dos rebrotes (34,6 ±27,5 cm ind -1 ). Nossos resultados indicam que a mortalidade pós-fogo da parte aérea em palmeiras de sub- bosque com estipe aéreo depende quase que exclusivamente da falha do sistema hidráulico na base do estipe, causada pelo fluxo de calor do fogo. Mortalidade das plantas pós-fogo é um descritor bem conhecido da intensidade do fogo, por haver correlação direta entre severidade-fogo-causal e mortalidade. Traduzir intensidade do fogo em severidade do fogo é uma maneira bastante apropriada de compreender o impacto do fogo nos ecossistemas. Apesar de 2013 ter sido um ano de verão chuvoso, espécies comerciais como o açaí (Euterpe precatoria) e o patauá (Oenocarpus bataua) tiveram considerável resultado negativo pós-fogo, fato que provavelmente se agravaria em verões mais secos (fenômenos climáticos). Não obstante, nossos resultados não tenham estabelecido relação entre mortalidade e baixa umidade ou menor distância da borda, as alterações microclimáticas causadas tanto pela reincidência do fogo nas bordas, quanto pela alteração climática global podem elevar nossas predições de mortalidade para as espécies amostradas. O conhecimento gerado sobre a capacidade das espécies em ter resiliência pós-distúrbio contribui para a previsão desta resiliência em um futuro caracterizado por mudanças nas frequências e no regime de fogo na Amazônia.