“Tá normal! tá normal! a saúde chegou”: etnografia da atuação do Consultório na Rua de Belo Horizonte nas cenas de uso

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2022
Autor(a) principal: Fraga, Priscilla Victória Rodrigues
Orientador(a): Modena, Celina Maria
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Dissertação
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: s.n.
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Link de acesso: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/56144
Resumo: A presente pesquisa buscou compreender a atuação do Consultório na Rua (CR) de Belo Horizonte com a população em situação de rua no espaço da rua e das cenas públicas de uso de drogas, analisando como se dá a produção do cuidado em saúde nesses lugares - cenas de uso, malocas, viadutos e demais espaços da rua. Trata-se de um estudo qualitativo, de abordagem etnográfica, que buscou compreender a dinâmica do CR e dos usuários no território. O campo etnográfico ocorreu de setembro/2021 a abril/2022, acompanhando 2 equipes, prioritariamente, nas cenas de uso. Também foram realizadas entrevistas com 10 trabalhadoras do serviço. A pesquisa evidenciou que há grande diversidade de pessoas nas cenas de uso, em sua maioria pessoas em situação de rua (PSR), sendo que as drogas não possuíam necessariamente papel central no processo de vulnerabilização. A presença do Estado nas cenas de uso geralmente se faz pela via da repressão, e os usuários que sofrem esse tipo de violência recorrem ao CR para acompanhamentos em saúde advindos dessas situações, o que traz uma dualidade da atuação estatal nesses locais. O tráfico de drogas se mantém presente nos territórios das Cenas de Uso e, também, age com violência para com a PSR. Essa população está submetida a condições de trabalho informais, precarizadas, sendo que a própria comunidade explora a força de trabalho desses sujeitos (mão-de-obra a preço irrisório ou em troca de drogas). Além disso, a PSR possui barreiras simbólicas de acesso que impedem que elas efetivem o acesso ao direito à saúde. Nesses casos, o CR por vezes cria arranjos não institucionalizados na tentativa de garantia de acesso. O serviço é reconhecido nos territórios, principalmente através da imagem da van e das camisetas brancas, e a entrada em campo é interpretada como a chegada do cuidado. Conclui-se que a PSR vive um processo de sobreposição de violências e vulnerabilidades, sendo que a pobreza e a exclusão social são eixos centrais para se pensar a saúde desse grupo populacional. Como resposta, é fundamental que o poder público construa políticas públicas estruturantes (habitação, segurança alimentar, saúde, educação, assistência social, trabalho, cultura e lazer), que garantam dignidade e cidadania a esses sujeitos para que, a partir daí, seja possível um processo concreto de garantia de direitos e superação das mazelas que atravessam violentamente esses corpos. É equivocado pensar no uso prejudicial de drogas pelas PSR descolado da sua realidade de vida, por isso, é necessário contextualizar temas fundamentais, como classe, gênero e saúde mental. O acesso da PSR aos serviços de saúde ainda é muito restrito, se tomarmos por base o acesso pela população domiciliada. A rede SUS BH precisa estar pronta para o atendimento desses sujeitos, diminuindo as barreiras simbólicas e, por vezes, burocráticas que dificultam o acesso aos serviços. Considerando a capilaridade que o CR possui nesses territórios, o serviço é estratégico para acessar os lugares e sujeitos mais vulnerabilizados como a PSR, onde a rede não consegue chegar.