Os limites e desafios do pensamento militar brasileiro em relação à questão ambiental

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2005
Autor(a) principal: Andrade Júnior, Hermes de
Orientador(a): Rozemberg, Brani
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Não Informado pela instituição
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Link de acesso: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/4579
Resumo: Neste trabalho, nos dedicamos a investigar a relação entre a instituição militar brasileira e a questão ambiental no Brasil, mediante pesquisa exploratória e avaliativa, onde optamos por metodologias qualitativas variadas para a verificação e ampliação do entendimento do pensamento militar. Usamos a triangulação metodológica compondo a partir das técnicas do estudo de caso, entrevista exploratória e análise de conteúdo dos documentos coletados. Analisamos os currículos da Academia Militar das Agulhas Negras, do Centro de Instrução de Guerra na Selva à busca de evidências ambientais. Escolhemos o Clube Militar e a Escola Superior de Guerra para apreender o pensamento militar sobre as questões ambientais, com ênfase do olhar para a Amazônia. No Clube Militar, foram analisados 62 artigos existentes na Revista do Clube Militar no período de 1980-2000 em que vários articulistas generais, coronéis, sócios e convidados escreveram sobre o tema Amazônia, com a finalidade de: (1) ampliar a compreensão sobre o pensamento militar como um todo; (2) identificar a que tendência ambiental se associaria cada artigo (antropocêntrica ou ecocêntrica) e (3) ver como se comportaria a tese majoritária, observada preliminarmente dentre o segmento militar, de que há ameaças deliberadas de internacionalização da Amazônia. Posteriormente, procurando fazer uma análise temática, selecionamos mais de 40 monografias e publicações da Escola Superior de Guerra. Mantivemos o corte temporal de 1980-2000, que coincide com os primórdios das discussões ambientais no Brasil e procuramos dialogar com a literatura o emitido pela fonte. Em geral, grande parte da coletividade militar expressa a idéia de um meio ambiente exclusivamente brasileiro, revelando incompleta formação de seus quadros quanto à problemática ambiental e uma postura de afirmação da soberania nacional nos moldes da doutrina de segurança nacional aplicada aos tratos ambientais, que é materializada pela crença hegemônica na ameaça da internacionalização da Amazônia. Em face dos valores e de sua cultura organizacional, as manifestações do segmento militar em prol de ações ecológicas estão orientadas por uma racionalidade distinta daquela na qual se apóia o pensamento ambiental. A cultura organizacional militar tende a influir negativamente no desempenho militar em relação ao meio ambiente. As conseqüências disso são o cumprimento de missões que tendem a menosprezar os delicados meandros da prática de conservação e de preservação ambientais. A mínima inclusão de assuntos ambientais em currículos de escolas militares e a falta de prática em assuntos ambientais trazem dificuldades para que militares conheçam, interpretem e decidam acertadamente sobre aspectos ambientais dos seus papéis e lides profissionais. Ainda assim, organizações militares podem apresentar contribuições aos interesses ambientais, mesmo que por motivações e pressupostos distintos, em razão de que as táticas militares empregadas na área de floresta úmida incentivam um cuidado com a liberação de resíduos e um bom relacionamento com a população regional. Alguns casos de adestramento de militares, como o do Centro de Instrução de Guerra na Selva, oferecem contribuições originais à educação ambiental. Isso se faz importante para a interlocução com outras entidades científicas e organizações sociais que já desenvolvem trabalhos na temática ambiental e que provavelmente interagirão em qualquer projeto de monitoramento e de manejo em que militares venham a participar. O pensamento militar brasileiro tende a articular-se dentro do conceito de “segurança ambiental” e de afastar-se do da “segurança ecológica”. Isso poderá afetar as complexas relações ecossistêmicas e sociais e comprometer com ações antrópicas e profissionais a biodiversidade no Brasil. Além de provocarem significativos impactos ambientais nos tempos de guerra, as atividades militares nos períodos sem guerra também são ambientalmente degradantes. Se os militares não estão lutando nas guerras, estão qualificando-se e adestrando-se para a próxima guerra. Teremos, ao aceitar a força armada, um estado de continuidade dos conflitos de baixa intensidade com impactos ambientais cumulativos, que incluem o uso e a degradação da terra, a poluição e o uso do espaço aéreo e marítimo, o uso da energia e recursos materiais e a geração de resíduos tóxicos. Como vimos, os militares, em suas atividades específicas, algumas vezes podem trazer vantagens para a conservação e restauração ambientais. Algumas porções de terra sob jurisdição militar são mais bem cuidadas pela contenção do cinturão de isolamento como área militar do que pela devolução ao poder público quando não sensibilizado com as questões ambientais em seus procedimentos diários. No caso do Brasil, a ocupação do território possui marcas da presença do exército por toda a parte e em algumas localidades é o “quartel” o maior provedor de oportunidades diretas e indiretas, até hoje. Como não estamos em guerra, os efeitos nocivos observados pela longa permanência de unidades americanas no exterior, usando terras de outros países não se aplicaria ao Brasil e da mesma forma o impacto social recorrente a isso. Recomendando que as instituições militares tenham cuidado com seus próprios impactos ambientais, existem outros nichos de atuação para os militares. Os militares podem ajudar no reforço de atividades ambientais padronizadas, podem colaborar com suas agências de inteligência no monitoramento e na coleta de informações sobre degradação ambiental e podem ajudar em papéis não violentos de conservação e restauração. Sabemos que o problema de utilizar os militares nessa atividade é que isso possibilita que eles venham a “colonizar” sob o propósito de cooperação. Por outro lado, é potencialmente benigna a idéia de envolver militares e as suas agências de inteligência para monitorar e processar problemas ambientais. Uma melhor formulação (e isso já de forma inicial acontece no Brasil através do SIVAM/SIPAM) é a de uma condição de responsabilidade coletiva e partilhada pela capacidade técnica e instalada da instituição militar em atuar com múltiplos propósitos na coordenação e na vigilância, monitorando sistemas complexos de natureza ambiental. Como trabalhos desta forma poderiam integrar civis e militares (com comunicação, transporte, infra-estrutura viária e aérea) na comunidade local, pensa-se que os sinais de danos ambientais seriam mais eficazmente identificados e abordados. Propõe-se o envolvimento militar nas questões ambientais como estratégia, encorajando e sensibilizando os militares a participarem desta nova proposta, assim conduzida de forma moral e praticamente aceitável, o que significaria não somente dar um passo na direção da proteção e restauração ambiental, mas também de outro para a segurança ecológica e para a modificação estrutural dessas instituições totais modeladas na visão hegemônica da segurança nacional.