A Pedagogia de Leonardo Coimbra

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Patrício, Manuel Ferreira
Data de Publicação: 1983
Idioma: por
Título da fonte: Repositórios Científicos de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP)
Texto Completo: http://hdl.handle.net/10174/11435
Resumo: "Sem resumo feito pelo autor"; INTRODUÇÃO - Objecto e propósito do estudo Desejamos que o presente trabalho seja um estudo da pedagogia de Leonardo Coimbra, nas vertentes complementares da teoria e da prática. As relações entre a teoria e a prática são complexas. Essa complexidade é particularmente acentuada no que concerne às questões pedagógicas que são, por sua natureza, indissoluvelmente teórico-práticas. No seu nível de maior exigência analítica, uma teoria da educação tem que envolver uma teoria da teoria e uma teoria da prática. Aceitamos, mas não prezamos muito, o termo consagrado "pedagogia". Com efeito, não pensamos que a educação diga respeito apenas à criança. Convénio preferiu dizer "paideía", como é visível e inteligível na sua famosa P"aedía (1). No final do século XV já se dizia em língua francesa "pedagogia", e o termo vingou (2). No nosso século, sensível de certos modos à problemática e ã programática da educação dos adultos (outros dizem, decerto melhor, da educação permanente), Pierre Furter lançou a dado passo e a UNESCO aceitou e difundiu — o termo "andragogia"(3). É um termo obviamente cheio de defeitos. Nas nossas meditações e na nossa modesta docência universitária temos proposto, defendido e utilizado outro, que nos parece mais perfeita mente adequado ã essência e finalidade da educação: "antropagogia". Por antropagogia entendemos a teoria e a prática da formação do homem na plenitude da sua humanidade. 0 estudo que faremos do pensamento e da acção de Leonardo Coimbra será, pois, um estudo da sua antropagogia. Leonardo pensou muito no homem e pensou muito o homem. Se não andássemos tão atentos aos outros e tão desatentos a nós mesmos saberíamos que, ao mesmo tempo que na Alemanha o fazia Max Scheler, constituis Leonardo Coimbra em Portugal as bases da antropologia filosófica. Porém, não quis Leonardo Coimbra apenas conhecer e compreender o homem. Quis, mais vasta e radicalmente, esforçar-se pela sua formação na plenitude da sua humanidade. Há no nosso Leonardo, por conseguinte, uma antropologia. Mas há também, como natural e explicito prolongamento ou cumprimento desta, uma antropagogia. A antropologia que nele encontramos é filosófica, com um envolvente horizonte te odiceico. A antropagogia que nele encontramos é igualmente fílosófica, com um envolvente -também — horizonte teodiceico. Fica explicado o que entendemos, genericamente, pela "pedagogia" de Leonardo Coimbra e delineado, por conseguinte, o essencial do nosso desígnio. Nós sabemos perfeitamente — temo-lo sentido na carne, se e que nao mesmo na alma — que a hora i poderosamente anti-filosófica. Hoje, porventura mais realmente do que na época em que viveu e pensou Leonardo Coimbra, o positivismo e o materialismo dominam quase impantemente a vida das: sociedades, dos Estados e dos homens. É, desde logo, uma ousadia abordar os problemas pedagógicos numa perspectiva filosófica. 0 que os poderes nacionais e internacionais querem que façamos — poderes políticos, económicos, sociais e culturais - é executar os programas pedagógicos que nos fornecem já feitos: executá-los a luz dos princípios, meios e fins que os enformam e acompanham. A Verdade é que — apesar das reiteradas declarações em contrário — esses poderes não querem que nós pensemos a educação do homem Com a liberdade e a radicalidade com que o homem deve pensar tudo e deve, principalmente, pensar-se a si próprio. E por isso — admitimos - nós — que está, ou tem estado, fora de moda pensar radicalmente a educação, ou seja, pensar filosoficamente a educação. Nós queremos afastar-nos, decididamente, do que vem sendo o caminho dominante desde há séculos e ligar de novo, indissoluvelmente, a pedagogia e a filosofia. Procuraremos mostrar que essa indissolúvel ligação impregna toda a teoria e prática pedagógicas de Leonardo Coimbra. Queremos mostrar que a educação humana dos portugueses pode ser pensada em Portugal pelos portugueses e dar um exemplo superior dessa possibilidade. 0 problema da educação dos portugueses tem ocupado alguns dos nossos mais notáveis espíritos nos últimos dois séculos. Mencionemos, sem intenção de exaustividade: Garrett, Herculano, Castilho, João de Deus, D. António da Costa, Antero, Oliveira Martins, Ferreira Deusdado, Cunha Seixas, Junqueiro, Sampaio Bruno, Teixeira de Pascoaes, Adolfo Coelho, Bernardino Machado, João de Barros, António Sérgio, Fernando Pessoa, Adolfo Lima, Faria de Vasconcelos, Delfim Santos, Álvaro Ribeiro... Neste quadro ocupa uma posição central Leonardo Coimbra, mas esse facto é normalmente omitido. A figura de António Sérgio tem sido apresentada como a do pedagogo por excelência do século XX português. Desde o incidente dos anos vinte havido entre a Seara Nova e Leonardo Coimbra e, sobretudo, desde a polémica (in feliz!...) de António Sérgio com Sant’Anna. Dionísio em torno de Leonardo (4) que a oposição entre Sérgio e Leonardo ficou estabelecida. Sérgio aparece como o oposto de Leonardo: as trombetas sergianófilas tem o seu complemento natural no silêncio leonardófobo. A exaltação do primeiro tem sido feita também com o silenciamento do segundo. Nós não negamos a importância de António Sérgio no panorama do pensamento pedagógico nacional. Estamos, no entanto, convencidos da superior importância do pensamento de Leonardo Coimbra. Não nos move o intuito de diminuir Sérgio. Move-nos, sim , o intuito de estudar Leonardo Coimbra, para o devolver inteiro à Pátria que injustamente o tem esquecido, principalmente com grave dano para si própria, porque o legado espiritual de Leonardo é dos mais ricos que possui. Não queremos, medir a grandeza de um nem do outro; não queremos, por conseguinte, compará-las. Precisamos todos, antes de mais, e de os estudar e de os conhecer. A verdade é que mesmo Sérgio tem sido mais exaltado e utilizado como bandeira (como equívoca bandeira!...) do que estudado e conhecido com rigor e objectividade. Quanto a Leonardo Coimbra... tem sido vítima de uma espessa e afinal ignara conspiração de silêncio. 0 que pretendemos é estudar a pedagogia de Leonardo Coimbra, na sua teoria e na sua prática. Estudar uma pedagogia, quando ela efectivamente exista, será sempre um empreendimento vasto e complexo. Tal vastidão e complexidade derivam naturalmente do próprio conceito de Pedagogia. Expliquemos um pouco melhor, ainda que sempre com brevidade, o que entendemos por pedagogia, por teoria e por prática. A pedagogia é correntemente definida como a disciplina que tem por objecto a educação da criança, implicando assim a ciência da criança (pedologia), o conhecimento das técnicas educativas (didáctica) e a arte de as pôr em prática (pedagogia propriamente dita). É este o sentido próprio que encontramos no Dictíormire de Ia Langue Pédagogique, de Paul Foulquié (5). Falta nesta definição qualquer referência ao conteúdo e fins da educação, o que implica a omissão de todo o relacionamento da pedagogia com a filosofia. A pedagogia não envolve apenas o educando e o conhecimento teórico e prático das técnicas educativas. Envolve também, indubitavelmente, a determinação dos conteúdos educativos e a configuração do horizonte axiológico para que toda a actividade educativa é ordenada. A este respeito, Paul Foulquié mostra-nos uma outra definição bem mais compreensiva. É ela de P. Louchet: "A pedagogia tem por objecto o estudo, a escolha, a aplicação de acções educativas, empreendidas em quadros institucionais dados, e tendendo a realizar fins socialmente definidos por considerações éticas e filosóficas" (6). 0 termo "pedagogia" – insistimos- hoje inadequado para exprimir o conceito actual da disciplina e actividade humanas que tem por objecto a educação. A educação é o da criança por sê-lo do homem. Falou-se (continua-se falando!...) da pedagogia dos adultos. A expressão envolve, evidentemente, contradição nos termos. A educação dos adultos - e, dizendo com maior rigor de pensamento, a educação permanente - e, no entanto, uma realidade.
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No nosso século, sensível de certos modos à problemática e ã programática da educação dos adultos (outros dizem, decerto melhor, da educação permanente), Pierre Furter lançou a dado passo e a UNESCO aceitou e difundiu — o termo "andragogia"(3). É um termo obviamente cheio de defeitos. Nas nossas meditações e na nossa modesta docência universitária temos proposto, defendido e utilizado outro, que nos parece mais perfeita mente adequado ã essência e finalidade da educação: "antropagogia". Por antropagogia entendemos a teoria e a prática da formação do homem na plenitude da sua humanidade. 0 estudo que faremos do pensamento e da acção de Leonardo Coimbra será, pois, um estudo da sua antropagogia. Leonardo pensou muito no homem e pensou muito o homem. Se não andássemos tão atentos aos outros e tão desatentos a nós mesmos saberíamos que, ao mesmo tempo que na Alemanha o fazia Max Scheler, constituis Leonardo Coimbra em Portugal as bases da antropologia filosófica. Porém, não quis Leonardo Coimbra apenas conhecer e compreender o homem. Quis, mais vasta e radicalmente, esforçar-se pela sua formação na plenitude da sua humanidade. Há no nosso Leonardo, por conseguinte, uma antropologia. Mas há também, como natural e explicito prolongamento ou cumprimento desta, uma antropagogia. A antropologia que nele encontramos é filosófica, com um envolvente horizonte te odiceico. A antropagogia que nele encontramos é igualmente fílosófica, com um envolvente -também — horizonte teodiceico. Fica explicado o que entendemos, genericamente, pela "pedagogia" de Leonardo Coimbra e delineado, por conseguinte, o essencial do nosso desígnio. Nós sabemos perfeitamente — temo-lo sentido na carne, se e que nao mesmo na alma — que a hora i poderosamente anti-filosófica. Hoje, porventura mais realmente do que na época em que viveu e pensou Leonardo Coimbra, o positivismo e o materialismo dominam quase impantemente a vida das: sociedades, dos Estados e dos homens. É, desde logo, uma ousadia abordar os problemas pedagógicos numa perspectiva filosófica. 0 que os poderes nacionais e internacionais querem que façamos — poderes políticos, económicos, sociais e culturais - é executar os programas pedagógicos que nos fornecem já feitos: executá-los a luz dos princípios, meios e fins que os enformam e acompanham. A Verdade é que — apesar das reiteradas declarações em contrário — esses poderes não querem que nós pensemos a educação do homem Com a liberdade e a radicalidade com que o homem deve pensar tudo e deve, principalmente, pensar-se a si próprio. E por isso — admitimos - nós — que está, ou tem estado, fora de moda pensar radicalmente a educação, ou seja, pensar filosoficamente a educação. Nós queremos afastar-nos, decididamente, do que vem sendo o caminho dominante desde há séculos e ligar de novo, indissoluvelmente, a pedagogia e a filosofia. Procuraremos mostrar que essa indissolúvel ligação impregna toda a teoria e prática pedagógicas de Leonardo Coimbra. Queremos mostrar que a educação humana dos portugueses pode ser pensada em Portugal pelos portugueses e dar um exemplo superior dessa possibilidade. 0 problema da educação dos portugueses tem ocupado alguns dos nossos mais notáveis espíritos nos últimos dois séculos. Mencionemos, sem intenção de exaustividade: Garrett, Herculano, Castilho, João de Deus, D. António da Costa, Antero, Oliveira Martins, Ferreira Deusdado, Cunha Seixas, Junqueiro, Sampaio Bruno, Teixeira de Pascoaes, Adolfo Coelho, Bernardino Machado, João de Barros, António Sérgio, Fernando Pessoa, Adolfo Lima, Faria de Vasconcelos, Delfim Santos, Álvaro Ribeiro... Neste quadro ocupa uma posição central Leonardo Coimbra, mas esse facto é normalmente omitido. A figura de António Sérgio tem sido apresentada como a do pedagogo por excelência do século XX português. Desde o incidente dos anos vinte havido entre a Seara Nova e Leonardo Coimbra e, sobretudo, desde a polémica (in feliz!...) de António Sérgio com Sant’Anna. Dionísio em torno de Leonardo (4) que a oposição entre Sérgio e Leonardo ficou estabelecida. Sérgio aparece como o oposto de Leonardo: as trombetas sergianófilas tem o seu complemento natural no silêncio leonardófobo. A exaltação do primeiro tem sido feita também com o silenciamento do segundo. Nós não negamos a importância de António Sérgio no panorama do pensamento pedagógico nacional. Estamos, no entanto, convencidos da superior importância do pensamento de Leonardo Coimbra. Não nos move o intuito de diminuir Sérgio. Move-nos, sim , o intuito de estudar Leonardo Coimbra, para o devolver inteiro à Pátria que injustamente o tem esquecido, principalmente com grave dano para si própria, porque o legado espiritual de Leonardo é dos mais ricos que possui. Não queremos, medir a grandeza de um nem do outro; não queremos, por conseguinte, compará-las. Precisamos todos, antes de mais, e de os estudar e de os conhecer. A verdade é que mesmo Sérgio tem sido mais exaltado e utilizado como bandeira (como equívoca bandeira!...) do que estudado e conhecido com rigor e objectividade. Quanto a Leonardo Coimbra... tem sido vítima de uma espessa e afinal ignara conspiração de silêncio. 0 que pretendemos é estudar a pedagogia de Leonardo Coimbra, na sua teoria e na sua prática. Estudar uma pedagogia, quando ela efectivamente exista, será sempre um empreendimento vasto e complexo. Tal vastidão e complexidade derivam naturalmente do próprio conceito de Pedagogia. Expliquemos um pouco melhor, ainda que sempre com brevidade, o que entendemos por pedagogia, por teoria e por prática. A pedagogia é correntemente definida como a disciplina que tem por objecto a educação da criança, implicando assim a ciência da criança (pedologia), o conhecimento das técnicas educativas (didáctica) e a arte de as pôr em prática (pedagogia propriamente dita). É este o sentido próprio que encontramos no Dictíormire de Ia Langue Pédagogique, de Paul Foulquié (5). Falta nesta definição qualquer referência ao conteúdo e fins da educação, o que implica a omissão de todo o relacionamento da pedagogia com a filosofia. A pedagogia não envolve apenas o educando e o conhecimento teórico e prático das técnicas educativas. Envolve também, indubitavelmente, a determinação dos conteúdos educativos e a configuração do horizonte axiológico para que toda a actividade educativa é ordenada. A este respeito, Paul Foulquié mostra-nos uma outra definição bem mais compreensiva. É ela de P. Louchet: "A pedagogia tem por objecto o estudo, a escolha, a aplicação de acções educativas, empreendidas em quadros institucionais dados, e tendendo a realizar fins socialmente definidos por considerações éticas e filosóficas" (6). 0 termo "pedagogia" – insistimos- hoje inadequado para exprimir o conceito actual da disciplina e actividade humanas que tem por objecto a educação. A educação é o da criança por sê-lo do homem. Falou-se (continua-se falando!...) da pedagogia dos adultos. A expressão envolve, evidentemente, contradição nos termos. 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No nosso século, sensível de certos modos à problemática e ã programática da educação dos adultos (outros dizem, decerto melhor, da educação permanente), Pierre Furter lançou a dado passo e a UNESCO aceitou e difundiu — o termo "andragogia"(3). É um termo obviamente cheio de defeitos. Nas nossas meditações e na nossa modesta docência universitária temos proposto, defendido e utilizado outro, que nos parece mais perfeita mente adequado ã essência e finalidade da educação: "antropagogia". Por antropagogia entendemos a teoria e a prática da formação do homem na plenitude da sua humanidade. 0 estudo que faremos do pensamento e da acção de Leonardo Coimbra será, pois, um estudo da sua antropagogia. Leonardo pensou muito no homem e pensou muito o homem. Se não andássemos tão atentos aos outros e tão desatentos a nós mesmos saberíamos que, ao mesmo tempo que na Alemanha o fazia Max Scheler, constituis Leonardo Coimbra em Portugal as bases da antropologia filosófica. Porém, não quis Leonardo Coimbra apenas conhecer e compreender o homem. Quis, mais vasta e radicalmente, esforçar-se pela sua formação na plenitude da sua humanidade. Há no nosso Leonardo, por conseguinte, uma antropologia. Mas há também, como natural e explicito prolongamento ou cumprimento desta, uma antropagogia. A antropologia que nele encontramos é filosófica, com um envolvente horizonte te odiceico. A antropagogia que nele encontramos é igualmente fílosófica, com um envolvente -também — horizonte teodiceico. Fica explicado o que entendemos, genericamente, pela "pedagogia" de Leonardo Coimbra e delineado, por conseguinte, o essencial do nosso desígnio. Nós sabemos perfeitamente — temo-lo sentido na carne, se e que nao mesmo na alma — que a hora i poderosamente anti-filosófica. Hoje, porventura mais realmente do que na época em que viveu e pensou Leonardo Coimbra, o positivismo e o materialismo dominam quase impantemente a vida das: sociedades, dos Estados e dos homens. É, desde logo, uma ousadia abordar os problemas pedagógicos numa perspectiva filosófica. 0 que os poderes nacionais e internacionais querem que façamos — poderes políticos, económicos, sociais e culturais - é executar os programas pedagógicos que nos fornecem já feitos: executá-los a luz dos princípios, meios e fins que os enformam e acompanham. A Verdade é que — apesar das reiteradas declarações em contrário — esses poderes não querem que nós pensemos a educação do homem Com a liberdade e a radicalidade com que o homem deve pensar tudo e deve, principalmente, pensar-se a si próprio. E por isso — admitimos - nós — que está, ou tem estado, fora de moda pensar radicalmente a educação, ou seja, pensar filosoficamente a educação. Nós queremos afastar-nos, decididamente, do que vem sendo o caminho dominante desde há séculos e ligar de novo, indissoluvelmente, a pedagogia e a filosofia. Procuraremos mostrar que essa indissolúvel ligação impregna toda a teoria e prática pedagógicas de Leonardo Coimbra. Queremos mostrar que a educação humana dos portugueses pode ser pensada em Portugal pelos portugueses e dar um exemplo superior dessa possibilidade. 0 problema da educação dos portugueses tem ocupado alguns dos nossos mais notáveis espíritos nos últimos dois séculos. Mencionemos, sem intenção de exaustividade: Garrett, Herculano, Castilho, João de Deus, D. António da Costa, Antero, Oliveira Martins, Ferreira Deusdado, Cunha Seixas, Junqueiro, Sampaio Bruno, Teixeira de Pascoaes, Adolfo Coelho, Bernardino Machado, João de Barros, António Sérgio, Fernando Pessoa, Adolfo Lima, Faria de Vasconcelos, Delfim Santos, Álvaro Ribeiro... Neste quadro ocupa uma posição central Leonardo Coimbra, mas esse facto é normalmente omitido. A figura de António Sérgio tem sido apresentada como a do pedagogo por excelência do século XX português. Desde o incidente dos anos vinte havido entre a Seara Nova e Leonardo Coimbra e, sobretudo, desde a polémica (in feliz!...) de António Sérgio com Sant’Anna. Dionísio em torno de Leonardo (4) que a oposição entre Sérgio e Leonardo ficou estabelecida. Sérgio aparece como o oposto de Leonardo: as trombetas sergianófilas tem o seu complemento natural no silêncio leonardófobo. A exaltação do primeiro tem sido feita também com o silenciamento do segundo. Nós não negamos a importância de António Sérgio no panorama do pensamento pedagógico nacional. Estamos, no entanto, convencidos da superior importância do pensamento de Leonardo Coimbra. Não nos move o intuito de diminuir Sérgio. Move-nos, sim , o intuito de estudar Leonardo Coimbra, para o devolver inteiro à Pátria que injustamente o tem esquecido, principalmente com grave dano para si própria, porque o legado espiritual de Leonardo é dos mais ricos que possui. Não queremos, medir a grandeza de um nem do outro; não queremos, por conseguinte, compará-las. Precisamos todos, antes de mais, e de os estudar e de os conhecer. A verdade é que mesmo Sérgio tem sido mais exaltado e utilizado como bandeira (como equívoca bandeira!...) do que estudado e conhecido com rigor e objectividade. Quanto a Leonardo Coimbra... tem sido vítima de uma espessa e afinal ignara conspiração de silêncio. 0 que pretendemos é estudar a pedagogia de Leonardo Coimbra, na sua teoria e na sua prática. Estudar uma pedagogia, quando ela efectivamente exista, será sempre um empreendimento vasto e complexo. Tal vastidão e complexidade derivam naturalmente do próprio conceito de Pedagogia. Expliquemos um pouco melhor, ainda que sempre com brevidade, o que entendemos por pedagogia, por teoria e por prática. A pedagogia é correntemente definida como a disciplina que tem por objecto a educação da criança, implicando assim a ciência da criança (pedologia), o conhecimento das técnicas educativas (didáctica) e a arte de as pôr em prática (pedagogia propriamente dita). É este o sentido próprio que encontramos no Dictíormire de Ia Langue Pédagogique, de Paul Foulquié (5). Falta nesta definição qualquer referência ao conteúdo e fins da educação, o que implica a omissão de todo o relacionamento da pedagogia com a filosofia. A pedagogia não envolve apenas o educando e o conhecimento teórico e prático das técnicas educativas. Envolve também, indubitavelmente, a determinação dos conteúdos educativos e a configuração do horizonte axiológico para que toda a actividade educativa é ordenada. A este respeito, Paul Foulquié mostra-nos uma outra definição bem mais compreensiva. É ela de P. Louchet: "A pedagogia tem por objecto o estudo, a escolha, a aplicação de acções educativas, empreendidas em quadros institucionais dados, e tendendo a realizar fins socialmente definidos por considerações éticas e filosóficas" (6). 0 termo "pedagogia" – insistimos- hoje inadequado para exprimir o conceito actual da disciplina e actividade humanas que tem por objecto a educação. A educação é o da criança por sê-lo do homem. Falou-se (continua-se falando!...) da pedagogia dos adultos. A expressão envolve, evidentemente, contradição nos termos. A educação dos adultos - e, dizendo com maior rigor de pensamento, a educação permanente - e, no entanto, uma realidade.
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