Da narrativa literária à narrativa fílmica : Amor de Perdição : um exemplo de transcodificação intersemiótica
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Publication Date: | 2001 |
Language: | por |
Source: | Repositórios Científicos de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP) |
Download full: | http://hdl.handle.net/10400.2/2469 |
Summary: | O tema da presente tese enquadra-se na área da narratologia (que pertence à disciplina da Teoria da Literatura enquanto vertente dos Estudos Portugueses) e assume uma perspectiva comparada, ao procurar estabelecer relações de aproximação e de distinção entre os dois grandes sistemas semióticos que são a literatura e o cinema. Como é sabido, a conhecida novela camiliana teve três adaptações ao cinema, em Portugal: a primeira, na época do cinema mudo, em 1921, por Georges Pallu; a segunda, na fase áurea de um certo cinema clássico a preto e branco, em 1943, realizada por António Lopes Ribeiro; e a terceira, já com o cinema a cores, pelo mais famoso realizador português, Manoel de Oliveira, em 1978. Toda a investigação foi orientada no sentido de procurar estabelecer comparações, do ponto de vista narrativo, entre o texto literário e as versões fílmicas, o que levou, por um lado, a um estudo minucioso das quatro obras e, por outro, a um aprofundamento teórico e a um necessário entrecruzamento de diversas áreas de conhecimento, nomeadamente a Teoria da Narrativa, a História do Cinema e a Teoria do Cinema (trabalho este que é traduzido sobretudo pela Primeira Parte da tese, nos seus dois capítulos, “Narrativa e Temporalidade” e “Narrativa Literária e Narrativa Fílmica”). A partir da defesa da vocação narrativa de ambos os sistemas (o que implicou a definição de um específico conceito de narrativa enquanto «estrutura que organiza a experiência humana da temporalidade», ou seja, manifestação da capacidade de captação do fluxo temporal enquanto sequência causal de acontecimentos organizados segundo uma lógica própria), a investigação desenvolveu-se de modo a identificar a modalidade expressiva específica de cada «medium», assente, essencialmente, na natureza conceptual da literatura, por oposição à natureza perceptual do cinema. A fundamentação narratológica desta tese assenta num conceito de narrativa que, para além de estrutural (como dito acima), é lugar da emergência de sentidos e revela-se como particular modo de conhecimento da realidade. Um dos pontos fundamentais da Primeira Parte do trabalho teve que ver com a análise do vasto fenómeno da adaptação cinematográfica, não nas suas implicações financeiras e industriais, que escapam ao âmbito desta investigação, mas antes numa acepção mais precisa e profunda, que, procurando as razões “últimas” desse fenómeno (desde que não meramente tributário do sucesso comercial), o define como um processo artístico que nasce de um desejo de identificação estética (entre o realizador e a obra literária) e que se constitui como um particular modo de leitura e de interpretação, com vista à “concretização” da realidade manifestada no texto literário (de modo a que a “intuição imaginária” do texto se possa tornar “percepção sensível” no filme). O polémico conceito de fidelidade só pode ser entendido, nesta óptica, como desejo de re-encontro com uma “essência” previamente intuída e expressa e que se pretende, de algum modo, reproduzir criativamente. Finalmente, na abordagem narratológica dos três filmes – feita na Segunda Parte do trabalho, depois da análise das potencialidades “cinematográficas” de uma novela considerada o expoente de uma narratividade de conteúdo dramático -, foi dada particular ênfase ao facto de determinados elementos (da estrutura de profundidade) terem sido mantidos (personagens, eventos, ordem cronológica, etc), enquanto outros (da estrutura de superfície) terem sido, directa ou indirectamente, modificados (temporalidade, focalização, espaço, etc) - apesar de os três realizadores terem afirmado desejar ser fiéis ao livro. Procurou, assim, verificar-se a possível transferência de um particular modo de desvelamento do mundo na passagem do livro para o filme, sendo sublinhado o modo como o tratamento do tempo determinou, em grande medida, a leitura feita por cada um dos realizadores: enquanto que Pallu acentuou a dimensão lírica da novela, através de uma temporalidade "mista" (entre a imagem muda e o intertítulo escrito), Lopes Ribeiro procurou uma temporalidade mimética e "realista", com o objectivo de veicular um determinado ideal romântico, e Manoel de Oliveira radicalizou o drama camiliano, retirando ao tempo a sua dimensão de lugar do acontecimento, e tornando-o, assim, no tempo trágico e imobilizado da frustração amorosa. Mantida a fabula em qualquer dos realizadores, verificou-se uma deslocação de sentido que, porém, nunca chegou a “atingir” a unidade significativa essencial do texto literário. |
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Toda a investigação foi orientada no sentido de procurar estabelecer comparações, do ponto de vista narrativo, entre o texto literário e as versões fílmicas, o que levou, por um lado, a um estudo minucioso das quatro obras e, por outro, a um aprofundamento teórico e a um necessário entrecruzamento de diversas áreas de conhecimento, nomeadamente a Teoria da Narrativa, a História do Cinema e a Teoria do Cinema (trabalho este que é traduzido sobretudo pela Primeira Parte da tese, nos seus dois capítulos, “Narrativa e Temporalidade” e “Narrativa Literária e Narrativa Fílmica”). A partir da defesa da vocação narrativa de ambos os sistemas (o que implicou a definição de um específico conceito de narrativa enquanto «estrutura que organiza a experiência humana da temporalidade», ou seja, manifestação da capacidade de captação do fluxo temporal enquanto sequência causal de acontecimentos organizados segundo uma lógica própria), a investigação desenvolveu-se de modo a identificar a modalidade expressiva específica de cada «medium», assente, essencialmente, na natureza conceptual da literatura, por oposição à natureza perceptual do cinema. A fundamentação narratológica desta tese assenta num conceito de narrativa que, para além de estrutural (como dito acima), é lugar da emergência de sentidos e revela-se como particular modo de conhecimento da realidade. Um dos pontos fundamentais da Primeira Parte do trabalho teve que ver com a análise do vasto fenómeno da adaptação cinematográfica, não nas suas implicações financeiras e industriais, que escapam ao âmbito desta investigação, mas antes numa acepção mais precisa e profunda, que, procurando as razões “últimas” desse fenómeno (desde que não meramente tributário do sucesso comercial), o define como um processo artístico que nasce de um desejo de identificação estética (entre o realizador e a obra literária) e que se constitui como um particular modo de leitura e de interpretação, com vista à “concretização” da realidade manifestada no texto literário (de modo a que a “intuição imaginária” do texto se possa tornar “percepção sensível” no filme). O polémico conceito de fidelidade só pode ser entendido, nesta óptica, como desejo de re-encontro com uma “essência” previamente intuída e expressa e que se pretende, de algum modo, reproduzir criativamente. Finalmente, na abordagem narratológica dos três filmes – feita na Segunda Parte do trabalho, depois da análise das potencialidades “cinematográficas” de uma novela considerada o expoente de uma narratividade de conteúdo dramático -, foi dada particular ênfase ao facto de determinados elementos (da estrutura de profundidade) terem sido mantidos (personagens, eventos, ordem cronológica, etc), enquanto outros (da estrutura de superfície) terem sido, directa ou indirectamente, modificados (temporalidade, focalização, espaço, etc) - apesar de os três realizadores terem afirmado desejar ser fiéis ao livro. Procurou, assim, verificar-se a possível transferência de um particular modo de desvelamento do mundo na passagem do livro para o filme, sendo sublinhado o modo como o tratamento do tempo determinou, em grande medida, a leitura feita por cada um dos realizadores: enquanto que Pallu acentuou a dimensão lírica da novela, através de uma temporalidade "mista" (entre a imagem muda e o intertítulo escrito), Lopes Ribeiro procurou uma temporalidade mimética e "realista", com o objectivo de veicular um determinado ideal romântico, e Manoel de Oliveira radicalizou o drama camiliano, retirando ao tempo a sua dimensão de lugar do acontecimento, e tornando-o, assim, no tempo trágico e imobilizado da frustração amorosa. 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O tema da presente tese enquadra-se na área da narratologia (que pertence à disciplina da Teoria da Literatura enquanto vertente dos Estudos Portugueses) e assume uma perspectiva comparada, ao procurar estabelecer relações de aproximação e de distinção entre os dois grandes sistemas semióticos que são a literatura e o cinema. Como é sabido, a conhecida novela camiliana teve três adaptações ao cinema, em Portugal: a primeira, na época do cinema mudo, em 1921, por Georges Pallu; a segunda, na fase áurea de um certo cinema clássico a preto e branco, em 1943, realizada por António Lopes Ribeiro; e a terceira, já com o cinema a cores, pelo mais famoso realizador português, Manoel de Oliveira, em 1978. Toda a investigação foi orientada no sentido de procurar estabelecer comparações, do ponto de vista narrativo, entre o texto literário e as versões fílmicas, o que levou, por um lado, a um estudo minucioso das quatro obras e, por outro, a um aprofundamento teórico e a um necessário entrecruzamento de diversas áreas de conhecimento, nomeadamente a Teoria da Narrativa, a História do Cinema e a Teoria do Cinema (trabalho este que é traduzido sobretudo pela Primeira Parte da tese, nos seus dois capítulos, “Narrativa e Temporalidade” e “Narrativa Literária e Narrativa Fílmica”). A partir da defesa da vocação narrativa de ambos os sistemas (o que implicou a definição de um específico conceito de narrativa enquanto «estrutura que organiza a experiência humana da temporalidade», ou seja, manifestação da capacidade de captação do fluxo temporal enquanto sequência causal de acontecimentos organizados segundo uma lógica própria), a investigação desenvolveu-se de modo a identificar a modalidade expressiva específica de cada «medium», assente, essencialmente, na natureza conceptual da literatura, por oposição à natureza perceptual do cinema. A fundamentação narratológica desta tese assenta num conceito de narrativa que, para além de estrutural (como dito acima), é lugar da emergência de sentidos e revela-se como particular modo de conhecimento da realidade. Um dos pontos fundamentais da Primeira Parte do trabalho teve que ver com a análise do vasto fenómeno da adaptação cinematográfica, não nas suas implicações financeiras e industriais, que escapam ao âmbito desta investigação, mas antes numa acepção mais precisa e profunda, que, procurando as razões “últimas” desse fenómeno (desde que não meramente tributário do sucesso comercial), o define como um processo artístico que nasce de um desejo de identificação estética (entre o realizador e a obra literária) e que se constitui como um particular modo de leitura e de interpretação, com vista à “concretização” da realidade manifestada no texto literário (de modo a que a “intuição imaginária” do texto se possa tornar “percepção sensível” no filme). O polémico conceito de fidelidade só pode ser entendido, nesta óptica, como desejo de re-encontro com uma “essência” previamente intuída e expressa e que se pretende, de algum modo, reproduzir criativamente. Finalmente, na abordagem narratológica dos três filmes – feita na Segunda Parte do trabalho, depois da análise das potencialidades “cinematográficas” de uma novela considerada o expoente de uma narratividade de conteúdo dramático -, foi dada particular ênfase ao facto de determinados elementos (da estrutura de profundidade) terem sido mantidos (personagens, eventos, ordem cronológica, etc), enquanto outros (da estrutura de superfície) terem sido, directa ou indirectamente, modificados (temporalidade, focalização, espaço, etc) - apesar de os três realizadores terem afirmado desejar ser fiéis ao livro. Procurou, assim, verificar-se a possível transferência de um particular modo de desvelamento do mundo na passagem do livro para o filme, sendo sublinhado o modo como o tratamento do tempo determinou, em grande medida, a leitura feita por cada um dos realizadores: enquanto que Pallu acentuou a dimensão lírica da novela, através de uma temporalidade "mista" (entre a imagem muda e o intertítulo escrito), Lopes Ribeiro procurou uma temporalidade mimética e "realista", com o objectivo de veicular um determinado ideal romântico, e Manoel de Oliveira radicalizou o drama camiliano, retirando ao tempo a sua dimensão de lugar do acontecimento, e tornando-o, assim, no tempo trágico e imobilizado da frustração amorosa. Mantida a fabula em qualquer dos realizadores, verificou-se uma deslocação de sentido que, porém, nunca chegou a “atingir” a unidade significativa essencial do texto literário. |
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