Uma Transferência do Objetivo para a Subjetividade

Detalhes bibliográficos
Autor(a) principal: Vesting, Thomas
Data de Publicação: 2019
Tipo de documento: Artigo
Idioma: por
Título da fonte: Direito Público (Brasília. Online)
Texto Completo: https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/direitopublico/article/view/3366
Resumo: A fórmula da “Transferência do Objetivo para a Subjetividade” surge com Charles Bally, um aluno de Saussure1. Bally utilizou essa fórmula em um ensaio sobre o estilo livre indireto no francês moderno (Le style indirect libre en francais moderne), o qual foi publicado em 1912, no jornal mensal germânico-românico (Germanisch-Romanischen Monatsschrift). Nesse ensaio, trata-se de um discurso indireto ou livre indireto. Quem havia experimentado pela primeira vez com o discurso livre indireto – assim como Franco Moretti em O burguês (2013) – foi o Romance de Formação.  Madame Bovary, de Flaubert, era, portanto, desde já, o ponto final lógico de um desenvolvimento, no qual a literatura europeia deixava para trás sua função didática e substituía o contador de histórias onisciente por uma longa passagem de discurso indireto livre2. Algo como, quando Emma Bovary, depois de sua primeira infidelidade, tranca-se em seu quarto e, imediatamente, como em “Taumel”, caminha em direção ao espelho: Claro que, quando ela se deparou com seu rosto no espelho, ficou surpresa. Nunca antes estiveram seus olhos tão grandes, tão escuros, tão profundos. Ela havia transformado algo extremamente delicado em toda a sua fisionomia. Várias vezes disse ela: “Eu tenho um amor! um amor!” e ela se intoxicava com a ideia, de que lhe foi concedido um segundo desabrochar. Ela experimentaria a partir de agora finalmente o prazer do amor, essa sorte febril, na qual ela já havia deixado de acreditar. Ela deparava-se com algo maravilhoso, e tudo prometia paixão, êxtase, euforia; a imensidão azul brilhante estava ao redor dela, o cume do sentimento brilhava perante seus pensamentos, e a vida habitual mostrava-se simplesmente muito distante, profundamente para baixo, na escuridão, ao pé dessa altura.Segundo Franco Moretti, o discurso indireto livre pertence ao estilo prosaico específico do romance burguês. O estilo burguês de prosa é para Moretti não apenas um indicador, mas também um fator, um tipo de ação, um “instrumento” linguístico (no sentido de Emile Beneviste), com cuja ajuda o mundo e a sociedade são colocados em ordem4. A fórmula de Bally acerca da transferência do objetivo para a subjetividade significa, então, mais precisamente, a predominância de descrições analíticas, impessoais e imparciais na prosa burguesa5. Justamente o discurso livre indireto possibilita um tipo de cruzamento de duas vias da fala, uma forma literária que permite oscilar entre subjetividade e objetividade. Como Moretti também disse, a forma prosaica original do discurso livre indireto assegura, por um lado, a perspectiva da figura, mais especificamente não esconde a subjetividade do protagonista6. Por outro lado, por causa de elementos próprios da fala suprapessoal, o protagonista seria submetido a uma “uniformização” e a uma padronização7. Como exemplo, Moretti refere-se a Emma, de Jane Austen, onde a “narrativen Verbtempi objetifica sua conduta e seus sentimentos e, como consequência disso, de alguma forma a aliena de si mesma
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