Do social à questão social: Hannah Arendt entre a Zoologia e a Teologia da compaixão

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2020
Autor(a) principal: Almeida, Cleber Ranieri Ribas de
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8133/tde-04032020-161329/
Resumo: Nesta tese, proponho-me distinguir entre o social descrito por Hannah Arendt nA Condição Humana (1958), e a questão social tal como exposta em Sobre a Revolução (1963). Em verdade, o social e a questão social devem ser compreendidos como fenômenos, e não apenas como conceitos. Ambos têm origens históricas e institucionais particulares. Demonstrarei que Arendt define o social como um conjunto de sucessivos experimentos realizados com assuntos humanos; tais experimentos desencadearam processos anônimos e concrescentes cujo propósito, desde a origem, era abolir a ação política pessoal. Portanto, o desenvolvimento do social ocorreu a partir do desenvolvimento dos métodos experimentais e processuais científicos; mediante o uso de tais métodos, a elite científica europeia passou a realizar, ao longo dos últimos três séculos, uma série de experimentos com as necessidades biológicas () dos homens. Demostrarei também que, por ser um processo, o social descrito por Arendt não pode ser plenamente compreendido como uma estrutura estática; contrariamente, deve ser compreendido a partir de uma fenomenologia da fluência. Arendt extraíra esta imagem concrescente do social da filosofia do organismo de Alfred North Whitehead, especificamente do livro Processo e Realidade (1929); igualmente, a tese dos experimentos com assuntos humanos fora extraída da Antropologia política de Karl Polanyi, especificamente do livro A Grande Transformação (1944). Segundo a narrativa histórica proposta por Arendt, o social surgiu de um pacto secular estabelecido entre o Estado-nação moderno e as sociedades científicas reais. Já a questão social, segundo a tese que ora sustentarei a partir das evidências textuais deixadas por Arendt, surgiu como um dos desdobramentos dos processos cartesianos da dúvida; tais processos foram responsáveis pelo desenvolvimento da mentalidade crítica europeia, assim como pelo nascimento da opinião pública. Desde Descartes, o questionamento acerca da origem natural e teocêntrica da desigualdade social e da pobreza tornou-se progressivamente público; a partir do século XVIII, tal questionamento passou a ser feito pelos revolucionários segundo o princípio iluminista do libre-pensée, isto é, o livre pensamento emancipado dos limites da experiência, da tradição e da fé cristã. Portanto, neste estudo tentarei comprovar que a interpretação do social na obra de Hannah Arendt seguiu dois caminhos: o caminho da interpretação zoológico-científica do social nA Condição Humana e o caminho da interpretação cartesiano-teológica da questão social em Sobre a Revolução. Tentarei provar, ainda, como o diálogo com o poeta W. H. Auden (1907-1973) fora de suma relevância para que Arendt passasse a compreender a questão social como uma tentativa revolucionária de levar a compaixão cristã à praça pública e instrumentalizá-la para fins políticos. Por fim, veremos como Arendt distinguiu, ainda que de modo ambíguo, duas modalidades de ação: a ação tradicional legada pela experiência política helênica e a ação processual-científica moderna (ou ação processual whiteheadiana). Defenderei, a partir de diversos excertos extraídos dA Condição Humana, que estas duas modalidades de ação política têm características antitéticas e, portanto, mutuamente excludentes.