Origem e evolução dos mocororôs (ironstones) da Volta Grande do Xingu

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2024
Autor(a) principal: Freire, Marilia Prado
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Biblioteca Digitais de Teses e Dissertações da USP
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/44/44141/tde-04102024-075129/
Resumo: A presença de ironstones na Volta Grande do Xingu, popularmente chamado de mocororô, foi documentada por pesquisadores que aventaram a possibilidade da sua origem biogênica com base em texturas e estruturas bacteriomórficas. Estes depósitos foram datados pelo método de (U-Th) /He em goethita e as idades obtidas variam ente 0,1 a 1,2 Ma, desde o Pleistoceno até Holoceno. Por outro lado, datações realizadas por outros pesquisadores através de métodos de luminescência opticamente estimulada em quartzo, e radiocarbono em matéria orgânica, encontraram apenas idades holocenas. A despeito da origem biogênica demonstrada anteriormente, esta pesquisa de doutoramento tem como objetivo principal contribuir para o entendimento paleobiológico dos mocororôs. Os objetivos específicos desta pesquisa foram: verificar a ocorrência dos ironstones ao longo do rio com destaque para os locais com maior desenvolvimento; identificar e detalhar seus litotipos, determinar as relações entre as litotipos presentes; elucidar mineralogicamente as diferentes fases do óxido-hidróxido de ferro (HFO); caracterizar geoquimicamente o HFO em seção colunar e ao longo do rio para verificar suas possíveis variações; e elucidar as diferentes texturas do HFO com ênfase nos registros fósseis. Para isso, um conjunto de métodos e técnicas, foi utilizado: análise faciológica; análise petrográfica, análise mineralógica através de DRX, MEV/EDS; análise morfológica com ênfase nos microfósseis através de imagens de MEV/EDS; análise geoquímica através de ICP-MS, ICP-AES e microssonda; e análise da matéria orgânica através da espectroscopia Raman. A pesquisa teve parceria internacional do Instituto de Geociências na USP, com o Institut des Sciences de la Terre (ISTerre), Universidade de Grenoble Alpes. Este trabalho revelou que os ironstones apresentam-se concentrados na área de Volta Grande do Xingu como corpos tabulares contínuos, com centenas de metros de extensão, parcialmente erodidos. O conjunto tem espessura variável, desde alguns centímetros a poucos metros, podendo, em casos excepcionais, atingir cerca de 3 metros. Os ironstones destacam-se fortemente das rochas e depósitos sobre a qual se depositaram, dada a sua coloração marrom a preta, enquanto as tonalidades do seu embasamento apresentam-se em colorações bem mais claras. O contato com o substrato rochoso cristalino ou com as barras fluviais é abrupto. Embora aparentem homogeneidade litológica, esses depósitos podem ser subdivididos em três litofácies: crosta laminada ferruginosa, arenito ferruginoso com estratificação plano-paralela, e arranjos heterolíticos que exibem recorrência de crostas e arenitos ferruginosos. A feição mais notável da crosta ferruginosa, em todas as escalas, são suas laminações que mostram tendência plano- paralela a moderadamente convexa, de herança laminar e zona axial moderada e relevo baixo ondulado a crenulado. Sua macroestrutura apresenta formas dômicas, abobadadas, enrugadas, crenuladas e convolutas. Além disso, a laminação apresenta outras características comuns aos microbialitos como presença de formas cilíndricas, alongadas, curtas, equidimensionais, esferoidais e cúbicas, interpretadas como microfósseis de células bacterianas. Junto a isso, a presença de mucilagem composta de substâncias polimérica extracelular de colônia microbiana. Esses elementos convergem para a interpretação de estromatólitos, sugerindo um ambiente de formação biogeoquímica ativo. Além disso, na interface dos depósitos heterolíticos, observam- se feições sugestivas das estruturas sedimentares induzidas microbianamente (microbially induced sedimentar structure MISS), tais como, grãos orientados e a trama característica do tapete microbiano (mat fabric). Estas estruturas evidenciariam influência microbiana desempenhando um papel crucial na formação e organização dos depósitos, refletindo a interação entre processos biológicos e geológicos. Ainda que esses depósitos ferruginosos pareçam ser homogêneos mineralogicamente, os resultados apontam para uma diversidade com a presença de goethita, caulinita e quartzo, subordinadamente lepidocrocita e psilomelano. Estes minerais apresentam distribuições variadas nas três litofácies identificadas, com domínio de quartzo nos arenitos e de oxi-hidróxidos de ferro na litofácies crosta laminada. Embora a mineralogia principal da crosta ferruginosa seja a goethita atribuída às condições oxidantes, foi identificada também a lepidocrocita, que pode estar relacionada a ambiente redutor local, rico em matéria orgânica. No caso da goethita, ela se apresenta micro a criptocristalina, de hábito grumoso. Além disso, na goethita, o Fe pode ser substituído pelo Al em até 11 %. Outros elementos, tais como, K, Mn, Si, Ba, Ca e P aparecem junto da goethita por adsorção. Esse alto grau de heterogeneidade da crosta, pode estar associado ao ferro de precipitação biogênica (BIOs). Os estudos geoquímicos apontam para uma assinatura geoquímica caracterizada por valores anomalamente altos de elementos traços como: Ti, V, Ni, Zn, Ba, As, Pb, Th, U e Zr, e de terras raras leves, como: La, Ce, Pr e Nd. Pesquisa em ferrobactérias recentes demonstram que essas anomalias geoquímicas poderiam ser resultantes do metabolismo bacteriano. Hipótese que precisa de mais evidências, dado que no ambiente supergênico, os óxi-hidróxido de ferro são produtos comuns dos fenômenos de intemperismo. A diferenciação entre os materiais ferruginosos biogênicos e não biogênicos não é tarefa trivial. Como se trata de fronteiras do conhecimento da microbiologia, geoquímica e bioquímica, é prudente buscar mais proxies que possam elucidar o quanto as ferrobactérias são as responsáveis pela origem e desenvolvimento do ironstones microbialíticos quaternários do Xingu.