Conectividade neural e dor na fibromialgia : efeitos da estimulação transcraniana de corrente contínua domiciliar

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2023
Autor(a) principal: Alves, Rael Lopes
Orientador(a): Caumo, Wolnei
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Não Informado pela instituição
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Palavras-chave em Inglês:
EEG
Link de acesso: http://hdl.handle.net/10183/271260
Resumo: A Fibromialgia (FM) é uma síndrome de dor crônica generalizada, abrangendo aspectos sensoriais e emocionais, o que resulta em padrões de processamento cerebral anômalos nas áreas relacionadas à dor. O mecanismo central na fisiopatologia da FM é a síndrome de sensibilização central (SSC) que se caracteriza pelo aumento da atividade neural devido ao desequilíbrio entre processos excitatórios e inibitórios, ocasionando hiperalgesia, alodinia e somação. Esse desequilíbrio pode explicar a dor migratória, fadiga generalizada, distúrbios do sono, déficits de memória, humor depressivo e pensamentos catastróficos. Essas alterações prejudicam as conexões de estruturas corticais e subcorticais que compõem a rede neural denominada neuromatriz da dor, incluindo o córtex somatossensorial primário (SI) e secundário (SII), córtex cingulado anterior (CCA), córtex insular, córtex pré-frontal (CPF) e o tálamo. Medicamentos como os anticonvulsivantes, antidepressivos duais e tricíclicos afetam a transmissão desses circuitos neurais. Além disso, uma terapia não farmacológica, como a Estimulação Transcraniana por Corrente Contínua (ETCC), pode reorganizar esses circuitos disfuncionais ligados à origem e persistência dos sintomas. A eletroencefalografia (EEG) analisa a atividade elétrica cerebral sendo considerada como possível biomarcador na neurofisiologia da dor crônica oferecendo insights dos processos neurais relacionados à percepção da dor de modo a auxiliar no diagnóstico da dor crônica. No entanto, é importante notar que a pesquisa nesse campo está em andamento. Esta tese busca responder a questões que estimulam os dois estudos que a compõem: o EEG pode ser um marcador de disfunção relacionada à gravidade dos sintomas da FM e um indicador neural do efeito terapêutico da ETCC? No primeiro estudo, comparamos a coerência defasada da conectividade entre as seguintes regiões de interesse associadas à neuromatriz da dor, ao córtex pré-frontal dorsolateral (CPFDL), CCA, SI e insula, medida por EEG em estado de repouso em mulheres com FM e saudáveis. Avaliamos 64 participantes (49 com FM e 15 controles) realizando EEG nas condições de olhos abertos (OA) e olhos fechados (OF). Além disso, avaliamos os sintomas clínicos e psicológicos, assim como os níveis séricos do fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF, do inglês: brain-derived neurotrophic factor). Calculamos a coerência defasada da conectividade em oito bandas de frequência do EEG. Quanto aos resultados, o grupo de mulheres com FM apresentou maior coerência defasada da conectividade entre o CPFDL e o CCA, na banda de frequência beta-3 (t=3,441, p=0,044), na condição de OA. Entre as condições de olhos abertos e fechados (OA-OF), observamos nas mulheres com FM maior conectividade inter-hemisférica na frequência beta-3 entre as ínsulas esquerda e direita (t=3,372, p=0,024) e entre a insula esquerda e o CPFDL direito 5 (t=3,695, p=0,024). Também identificamos uma correlação negativa entre a disfunção devido à dor e conectividade na frequência beta-3 entre o CCA esquerdo e o SI esquerdo (r=-0,442, p=0,043) na condição de OF. Por outro lado, na condição de OA, o grupo de mulheres com FM mostrou correlação positiva entre a coerência defasada da conectividade e a gravidade da sensibilização central na frequência alfa-2 entre o CCA e SI (r=0,428, p=0,043). Além disso, na diferença OA-OF, a coerência defasada da conectividade entre o CPFDL esquerdo e o córtex insular direito demonstrou uma correlação negativa com os níveis séricos de BDNF na frequência gama (r=-0,506, p=0,012). Assim, esses resultados indicam que o aumento da coerência defasada da conectividade, especialmente na faixa de frequência beta-3 durante o EEG em estado de repouso, pode servir como um biomarcador neural associado à neuroplasticidade mal-adaptativa e à gravidade dos sintomas da FM. No segundo estudo, realizamos um ensaio clínico randomizado que comparou a aplicação de vinte sessões da ETCC ativa com a ETCC simulada realizada em ambiente domiciliar e direcionada ao CPFDL e ao córtex motor primário (M1). O objetivo foi analisar a coerência defasada da conectividade das oito regiões de interesse em oito bandas de frequência por meio de EEG em estado de repouso nas condições de OA e OF. O estudo incluiu 48 mulheres com FM, com idade entre 30 e 65 anos, distribuídas aleatoriamente em uma proporção de 2:1:2:1 para os grupos de ETCC ativa no CPFDL esquerdo (n=16); ETCC simulada no CPFDL esquerdo (n=8); ETCC ativa no M1 esquerdo (n=13) e ETCC simulada no M1 esquerdo (n=6). Registramos o EEG antes e depois do tratamento. Na condição de OF, comparando o pré e o pós-tratamento, a ETCC ativa sobre o CPFDL esquerdo diminuiu a conectividade na frequência delta entre a ínsula direita e o CCA esquerdo (t=-3,542, p=0,048). Quanto ao tratamento da ETCC ativa com a ETCC simulada sobre CPFDL esquerdo, observamos uma diminuição da conectividade na frequência delta entre a ínsula direita e o CCA esquerdo (t=-4,000, p=0,017). Na condição de OA, a ETCC ativa no CPFDL esquerdo, em comparação à ETCC simulada no M1 esquerdo, resultou em aumento da conectividade entre CPFDL esquerdo e o CCA esquerdo na frequência teta (t=-4,059, p=0,048). Em análises de regressão, verificamos que o tratamento da ETCC ativa sobre o CPFDL esquerdo apresentou correlação positiva da coerência defasada da conectividade e a qualidade do sono. A ETCC ativa sobre o M1 apresentou uma correlação positiva entre a conectividade e a catastrofização da dor. Assim, concluímos que a aplicação da ETCC ativa sobre o CPFDL resultou na modulação da coerência defasada da conectividade entre as regiões envolvidas nos aspectos afetivos e de atenção associados à dor, especialmente nas bandas de frequência mais baixas do EEG durante o estado de repouso. Essas descobertas sugerem que os efeitos da ETCC ativa sobre as 6 oscilações neurais podem caracterizar um marcador neural associado ao impacto dos sintomas na FM.