Os lagostins de água doce da América do Sul (Crustacea: Decapoda: Parastacidae) : modelagem de distribuição e diversidade genética

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2017
Autor(a) principal: Gomes, Kelly Martinez
Orientador(a): Araujo, Paula Beatriz de
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Não Informado pela instituição
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Palavras-chave em Inglês:
Link de acesso: http://hdl.handle.net/10183/180494
Resumo: Os lagostins de água doce são crustáceos encontrados em várias regiões do mundo, com a ocorrência das famílias Astacidae e Cambaridae no hemisfério norte e Parastacidae no hemisfério sul. Os parastacídeos estão distribuídos em quase todos continentes, com a exceção da Antártida e o continente africano. Na América do Sul são conhecidas 16 espécies, pertencentes a três gêneros: Virilastacus Hobbs 1991, Samastacus Riek 1971 e Parastacus Huxley 1879, que podem ocupar ambientes permanentes e temporários. Embora existam informações sobre riqueza de espécies, distribuição e biologia, os dados são insuficientes. Assim, o primeiro capítulo traz a atualização dos dados sobre a distribuição e o reconhecimento de registros de espécies simpatria e sintopia para as espécies sulamericanas. A caracterização dos habitats ocupados pelos lagostins foi também realizada, mas somente para as espécies da porção Atlântica do continente. Os dados de ocorrência foram compilados das coleções zoológicas (CZ), da literatura publicada e das amostragens na região sul do Brasil (Rio Grande do Sul - RS e Santa Catarina - SC). No total, foram obtidos 51 novos registros de ocorrência para América do Sul; incluindo a presença de Parastacus fluviatilis Ribeiro & Buckup, 2016 no lugar mais alto do RS e a captura de P. saffordi Faxon, 1898 quase quatro décadas após a revisão taxonômica do gênero Parastacus. A ocorrência de espécies em simpatria e sintopia foi confirmada, destacando o registro inédito de quatro espécies em um buffer < 5 km no Chile. Os dados obtidos neste estudo representam um avanço sobre o conhecimento da distribuição e a ocupação do habitat, podendo ser usados para melhorar a precisão da avaliação dos riscos de extinção, por exemplo. As ameaças à sobrevivência dos lagostins de água doce na América do Sul são numerosas e estão relacionadas aos impactos diretos na estrutura do hábitat, como poluição, canalização de cursos d’água e drenagem de áreas úmidas. Entretanto, uma potencial e silenciosa ameaça não tem sido considerada, que são as mudanças climáticas ao longo da distribuição das espécies. O segundo capítulo utilizou o conhecimento atual da ocorrência das espécies para projetar os efeitos das mudanças climáticas sobre a distribuição delas. As principais alterações estimadas foram expansão ou redução do tamanho da área geográfica em dois cenários: atual e 2070. Os dados de ocorrência contabilizaram 216 locais de presença que foram reunidos em quatro grupos: aquáticos, semiaquáticos, semiterrestres Atlântico e semiterrestres Pacífico. O desempenho dos modelos foi avaliado de bom a ótimo e a adequabilidade das áreas no cenário atual foi < 100.000 km² para todos os grupos. A temperatura foi a variável que mais contribuiu para a construção dos modelos (presente e futuro). Potencialmente, esta variável foi responsável pela expansão da área de distribuição das espécies em 2070. Assim, os lagostins apresentaram uma tendência à ocupação de regiões mais altas e menos impactadas pelas ações humanas. Portanto, sugerimos que a atenção seja voltada à conservação das espécies dos grupos semiterrestres da porção Atlântico e do Pacífico. As áreas ocupadas pelas espécies apresentaram alta complexidade ambiental e diferentes níveis de fragmentação. Além disso, as zonas úmidas tendem a desaparecer mais rápido, devido às interferências do clima na dinâmica dos ecossistemas de água doce. Diante das potenciais modificações do hábitat das espécies e a perda recente de áreas dentro da distribuição dos lagostins, a caracterização genética das populações traz uma nova abordagem sobre a fauna e a conservação dos organismos. Dessa forma, o terceiro capítulo investiga a diversidade genética intraespecífica de Parastacus brasiliensis (von Martens 1869) no sul do Brasil. A reconstrução filogenética foi utilizada para identificar a diversidade críptica a partir de marcadores mitocondriais e nucleares. As análises indicaram a existência de cinco unidades evolutivas e somente uma pode ser considerada como Parastacus brasiliensis sensu stricto. A distância genética entre P. brasiliensis sensu stricto e as demais linhagens “A”, “B” e “C” aumenta com distância geográfica, sugerindo que o isolamento por distância pode ser um importante fator de diversificação e eventualmente especiação para os lagostins escavadores. Além disso, uma das quatro linhagens corresponde à subespécie Parastacus brasiliensis promatensis Fontoura & Conter 2008, que foi elevada para o nível de espécie. De acordo com esta pesquisa, P. brasiliensis ocorre principalmente na Bacia do Lago Guaíba. As populações estudadas no Guaíba I e Guaíba II apresentaram conectividade e fluxo gênico limitado, provavelmente devido à fragmentação do habitat. Com base nos dados de distribuição e genética, o estado de conservação de P. brasiliensis foi estabelecido como Quase Ameaçada - “Near Threatened”, conforme a IUCN. Estes resultados nos encorajam a propor uma área de preservação para a população isolada do Guaíba II e enfatiza a importância de preservar estes distintos “pools” para a manutenção da diversidade genética desta espécie. O conhecimento limitado sobre os lagostins de água doce e os efeitos das ações antrópicas sobre as populações, reforçam a importância da continuidade de investigações desse cunho. Outras abordagens podem ser conduzidas a partir dos dados gerados nesta tese como ponto de partida, utilizando os lagostins como uma ferramenta de análise da paisagem, mudanças climáticas e urbanização.