O uso da ayahuasca na dependência do crack

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2013
Autor(a) principal: Cruz, Joselaine Ida da [UNIFESP]
Orientador(a): Não Informado pela instituição
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Dissertação
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: http://repositorio.unifesp.br/handle/11600/23003
Resumo: Introdução: O abuso do crack tem-se constituído em um grande problema de saúde pública e social. Seus efeitos e o comportamento destrutivo têm movimentado a sociedade na busca de uma estratégia efetiva de tratamento para os usuários dessa droga. A fissura, fator determinante no estabelecimento da dependência e recaídas, tem sido o foco principal da luta do usuário que tenta deixar a droga. A ayahuasca, chá enteógeno utilizado em contexto religioso, tem sido utilizada como uma opção para alcançar a abstinência do crack. Objetivo: O presente trabalho identificou os resultados da experiência através daqueles que utilizam ou utilizaram a ayahuasca como estratégia alternativa para alcançar a abstinência do crack. Metodologia: Utilizou-se metodologia qualitativa, a qual permite o conhecimento do fenômeno a partir dos valores e opiniões daqueles que o vivenciaram ou vivenciam. Empregou-se a Etnografia, método qualitativo de pesquisa, como forma de desvendar a cultura do uso da ayahuasca e a sua influência na dependência de crack Uma amostra intencional, selecionada por critério, composta por 40 usuários e ex-usuários de crack foi recrutada por intermédio de informantes-chave e método de amostragem em cadeias, especialmente a técnica bola-de-neve (snowball). Os entrevistados foram submetidos à entrevista semi-estruturada guiada por roteiro de questões. A observação participante foi utilizada para o conhecimento do fenômeno estudado nas comunidades ayahuasqueiras. Resultados e Discussão: Em sua maioria, o usuário de crack que recorre a ayahuasca como estratégia para se manter abstinente é caracterizado como homem, numa faixa etária entre 31 a 39 anos, com escolaridade alta, predominantemente da classe social C. A maioria dos entrevistados teve influência dos princípios da religião católica e analisando o papel das religiões anteriores a ayahuasca na vida dos participantes da amostra, percebe-se que essas não foram suficientes para protegê-los do uso de drogas, devido ao pouco envolvimento dos entrevistados com a religião adotada. A maioria buscou a ayahuasca para alcançar a abstinência do crack; enquanto que outros foram ao encontro da espiritualidade, de uma vida social mais organizada; por curiosidade em experimentar uma substância alucinógena ou para manter a abstinência. A ayahuasca não foi a primeira opção da maioria da amostra para tentar chegar à abstinência do crack; o insucesso dos tratamentos convencionais levou-os a busca de uma estratégia alternativa como a ayahuasca. A ayahuasca em uso ritualístico mostrou-se eficiente para o alcance da abstinência do crack, com apenas 8 sujeitos apresentando recaídas Ocorreram mudanças na vida do usuário de crack após a busca da ayahuasca, como: a inserção social, com 95% declarando-se com alguma ocupação de trabalho; a interrupção do abuso de psicoativos; reestruturação da vida; reestruturação familiar, como a retomada do relacionamento com os filhos Conclusão: Existe uma conexão intensa e profunda entre a manutenção da abstinência dos usuários de crack com a própria comunidade ayahuasqueira tendo em vista que mais de um terço dos participantes que voltou a usar crack, atribuiu ao afastamento das respectivas comunidades (47%). Entre esses, haviam adeptos da doutrina de longa data, podendo ser indício que o tempo de uso da ayahuasca não tem relação com a manutenção da abstinência alcançada. A “cura” para os sujeitos da amostra foi considerada o alcance da abstinência e a maioria considerou-se curado da dependência do crack. Não se observou semelhanças nos efeitos provocados pela ayahuasca com os do crack. Comunidades ayahuasqueiras que apresentam adeptos e dirigentes com comportamentos mais dirigidos à disciplina, religiosidade, espiritualidade e afetuosidade, com participação ativa na vida comunitária apresentaram menos índices de recaídas. Alterações comportamentais como o aprimoramento da paciência, tolerância, reflexão antes das tomadas de decisões, caridade, respeito, preocupação com o desenvolvimento pessoal/espiritual e elevação da autoestima foram observadas. A ausência de distinção entre os adeptos da doutrina, a afetuosidade, o toque, o cuidado, a preocupação e o respeito entre os membros foram itens fundamentais no auto reconhecimento dos sujeitos da amostra como “ser-no-mundo”, tornando possível a elaboração e concretização de novos projetos de vida. A ingestão de um chá enteógeno pode ter sido um grande atrativo para os usuários de crack chegarem às comunidades ayahuasqueiras. A ayahuasca reduz a fissura causada pelo crack, sendo intensificada pela consagração do “Daime de Guarda”. O efeito da ayahuasca e influência dos rituais é um processo indissociável, ou seja, neste estudo, os usuários de crack que recorreram à ayahuasca como estratégia para manterem-se abstinentes da droga obtiveram sucesso, pela associação do chá e o ritual religioso.