A Lontra Neotropical (Lontra longicaudis) no Nordeste brasileiro: distribuição, uso do habitat e diversidade genética

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2017
Autor(a) principal: Ribeiro, Patrícia Farias Rosas
Orientador(a): Eduardo Martins Venticinque
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Não Informado pela instituição
Programa de Pós-Graduação: PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Brasil
Palavras-chave em Português:
Área do conhecimento CNPq:
Link de acesso: https://repositorio.ufrn.br/jspui/handle/123456789/24679
Resumo: A distribuição geográfica de uma espécie é uma informação básica essencial para planejamentos de conservação. Esta informação, no entanto, muitas vezes é tendenciosa para algumas regiões ou grupos taxonômicos, de acordo com as facilidades de acesso e características da história natural. A lontra neotropical [Lontra longicaudis (Olfers,1818)] é uma espécie pouco estudada devido ao seu comportamento discreto e a consequente baixa detectabilidade na natureza. Essa situação é agravada na região Nordeste do Brasil, que por muito tempo foi considerada como uma lacuna nos seus mapas de distribuição, sendo atualmente apontada como uma região prioritária para estudos com a espécie. Este projeto teve o objetivo de entender como a L. longicaudis está distribuída no Nordeste brasileiro e os fatores estruturantes da sua distribuição, uso do habitat e diversidade genética. Este foi o primeiro estudo com enfoque para a espécie na região, realizado através de uma amostragem padronizada em 17 bacias hidrográficas do Nordeste brasileiro ao Norte do Rio São Francisco, entre os estados de Alagoas e Piauí. Cada bacia hidrográfica foi amostrada em três trechos (alto, médio e baixo curso), sendo em cada trecho percorridos aproximadamente 5km, repetidos ao longo de 4 dias, em busca de indícios de presença da espécie. Isto resultou em 726 km, percorridos em 45 trechos de rio amostrados. No primeiro capítulo discutimos a ocorrência da L. longicaudis na Caatinga, bioma semiárido onde existia apenas um registro de ocorrência da espécie relatado na literatura, e que por isso não tem sido considerado como parte da sua distribuição em planejamentos e estratégias de conservação. São apresentados registros históricos e atuais inéditos de ocorrência da L. longicaudis na Caatinga, discutidos os fatores que podem estar influenciando sua ocorrência na região, e é proposta a atualização do mapa de distribuição da espécie, com base na confirmação de uma real lacuna na sua distribuição atual. No segundo capítulo nós analisamos os fatores ambientais, climáticos e antrópicos que influenciam no padrão de ocupação, detecção e uso do habitat da L. longicaudis nas bacias hidrográficas do Nordeste Brasileiro. A probabilidade de detecção da L. longicaudis na região foi alta e negativamente influenciada pela ordem do rio, variável relacionada à localização do trecho de rio na rede de drenagem. A sazonalidade da precipitação foi o principal fator determinante da ocupação da espécie na região, que se apresenta concentrada na subregião das bacias que drenam para o leste, onde a sazonalidade da precipitação é menor. Esta variável climática também foi importante para a ocorrência e uso do habitat pela espécie, mais intenso nas áreas com menor sazonalidade, relacionadas à Floresta Atlântica. A Floresta Atlântica nordestina é a porção menos conservada deste bioma. Nesta região as lontras utilizaram mais os rios com menor área de captação de água a montante, que correspondem a tributários menores, que podem oferecer melhores condições ambientais que os rios principais, funcionando como um refúgio para a espécie. Mesmo utilizando refúgios, o uso do habitat foi negativamente correlacionado com a porcentagem de remanescentes naturais, uma consequência indireta do estado de degradação das áreas mais utilizadas pela espécie, o que coloca a L. longicaudis em um estado de alerta na região. Para entender como está estruturada a população de lontras do Nordeste brasileiro e fornecer subsídios para a sua persistência a longo prazo, no terceiro capítulo nós analisamos a diversidade genética e fluxo gênico da espécie na região, através de DNA mitocondrial e da análise de cinco cenários alternativos de dispersão. Para isto foram analisadas 36 amostras não invasivas (fezes frescas, muco e tecido), provenientes de oito bacias hidrográficas. Destas amostras, 17 amplificaram os três segmentos analisados e foram consideradas indivíduos distintos pela localização amostral e composição genética. Estes indivíduos são representativos de 7 haplótipos, dos quais 4 foram identificados pela primeira vez neste estudo. A espécie apresentou alta diversidade haplotípica, mas baixa variabilidade nucleotídica na região. A maior diferenciação genética foi observada em duas amostras do Piauí, acima da área de Caatinga onde a ausência da espécie foi confirmada neste estudo, corroborando a existência de uma barreira climática por onde o fluxo gênico pode estar interrompido há mais tempo. A população de lontra do Nordeste apresentou diferença genética significativa em relação aos grupos geográficos da Amazônia e do Leste da América do Sul, o que indica menor fluxo gênico entre essas regiões. O cenário que atribuiu um custo elevado para a dispersão por terra foi o que apresentou relação mais forte com a divergência genética observada entre as amostras da região nordeste, indicando que a espécie é capaz de se dispersar por terra, mas em situações extremas. Já a divergência genética entre as bacias costeiras apresentou relação mais forte com as distâncias geográficas (euclidiana e trecho de bacias), o que pode ser resultado de uma região mais homogênea, sujeita a alagamentos, onde a paisagem impõe menos resistência à dispersão por animais semiaquáticos. Análises do caminho de menor custo indicam o Rio São Francisco como uma importante rota de dispersão, conectando as bacias costeiras do Nordeste com as bacias localizadas ao Norte da Caatinga, o que ressalta a importância da sua preservação para a manutenção da diversidade genética na região. As três questões abordadas neste estudo preenchem uma importante lacuna de conhecimento sobre a lontra neotropical no Nordeste do Brasil, uma das regiões mais secas da sua área de distribuição, atendendo a ações prioritárias do plano nacional de ações para a conservação da espécie.