Ecologia da herbivoria por peixes-papagaio no Atlântico Oeste: organização social, ontogenia e papel funcional

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2014
Autor(a) principal: FEITOSA, João Lucas Leão
Orientador(a): FERREIRA, Beatrice Padovani
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade Federal de Pernambuco
Programa de Pós-Graduação: Programa de Pos Graduacao em Oceanografia
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Brasil
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/18857
Resumo: A herbivoria é um dos fatores responsáveis pelo controle da biomassa e cobertura de algas, bem como molda a composição específica de suas assembleias. Vários organismos são herbívoros, dentre eles os peixes-papagaio (família Scaridae), que através do consumo de algas abrem espaço para o assentamento e crescimento de corais juvenis, realizando um papel central na manutenção dos recifes de coral. Estudos recentes têm associado a diminuição da cobertura viva de recifes de coral à diminuição da abundância de peixes herbívoros da família Scaridae, causada pela intensa pesca dirigida a estas espécies, várias ja classificadas como ameaçadas ou quase ameaçadas segundo critérios da IUCN. Vários trabalhos têm sido desenvolvidos abordando a função dos peixes-papagaio, porém a maioria das teorias que envolvem a herbivoria por peixes recifais foi desenvolvida no Indo-Pacífico e no Caribe. Entretanto, tais estudos geralmente tratam a alimentação como uma característica de cada espécie, negligenciando potenciais efeitos da organização social e ontogenia em sua composição alimentar. Nesse âmbito, a presente tese teve como objetivo elucidar três pontos principais, que resultaram na composição de três capítulos, analisando: (1) a influência de distintas organizações sociais na alimentação de peixes-papagaio; (2) a influência de mudanças ontogenéticas e no uso de distintos habitats na alimentação de peixes-papagaio; (3) o efeito da herbivoria por peixes-papagaio nos recifes de coral brasileiros. Para o primeiro capítulo, a espécie Scarus iseri, uma das espécies de peixe-papagaio mais abundantes do Caribe, foi selecionada tendo em vista que a maioria dos estudos abordando a ecologia social de peixes-papagaio foram realizados com esta espécie. Durante o presente trabalho, foram identificadas duas distintas organizações sociais para esta espécie, os grupos estacionários e os territoriais, ambos consistindo de poucos indivíduos que usam uma área limitada, mas agressivamente defendida por seus membros apenas no último grupo. Foi observado que indivíduos em diferentes grupos sociais se distribuíram de forma distinta no ambiente recifal e que possuíam estruturas de tamanho diferenciadas, sendo os indivíduos jovens mais abundantes nos ambientes de grupos estacionários, devido a exclusão competitiva por indivíduos territoriais. As agressões intraespecíficas, mais frequentes nos grupos territoriais, foram utilizadas para defender habitats com maior disponibilidade de alimento preferido por S. iseri. Os indivíduos em grupos territorialistas se alimentaram principalmente de algas filamentosas, um item de maior palatabilidade e alta produção, enquanto que a dieta de indivíduos em grupos estacionários foi composta por detritos presentes no substrato e sobre esponjas. Foi possível observar que os peixes-papagaio podem mudar sua ecologia alimentar de acordo com sua organização social, alterando por conseguinte sua função do ambiente recifal. No segundo capítulo a espécie estudada foi Sparisoma axillare, o peixe-papagaio mais abundante na maioria dos recifes de coral brasileiros. Este estudo focou sua ecologia alimentar na fase jovem em quatro diferentes habitats dos recifes de Tamandaré: (1) os bancos de algas, (2) o back reef, (3) o topo recifal e (4) o fore reef. Os indivíduos menores de 5 cm preferiram habitar os bancos de macroalgas e o topo recifal, enquanto os indivíduos maiores que 5 cm habitaram em maior número o back e o fore reef, diferença devida a distintas condições pós-assentamento entre estes habitats. Interações agressivas com o peixe-donzela Stegastes fuscus foram o principal fator influenciando essa distribuição e as taxas de alimentação de S. axillare. Indivíduos menores ocorreram em habitats dominados por S. fuscus por apresentar comportamento críptico e se alimentaram em baixa frequência, ao crescer estes indivíduos aumentaram suas taxas de alimentação e passaram ao comportamento vagueador. A preferência alimentar dos jovens foi determinada pela disponibilidade de alimento em cada habitat, entretanto algas filamentosas foram o principal alimento de indivíduos menores, enquanto que para indivíduos maiores de 10 cm uma maior ingestão de areia foi constatada. Através deste estudo foi observado que uma espécie de peixe-papagaio pode variar sua dieta de acordo com a disponibilidade de alimento em cada ambiente, o que pode ser dependente do seu tamanho e sua interação com outras espécies. No terceiro capítulo foi abordado o efeito da herbivoria por peixes-papagio nos recifes de coral costeiros do Brasil. Para tal, três experimentos utilizando a exclusão da herbivoria com gaiolas foram realizados, observando: (1) a influência da herbivoria na biomassa de algas; (2) a influência da herbivoria na percentual de cobertura bentônica; (3) a influência da herbivoria na sucessão ecológica da cobertura bentônica. Foi observado que a exclusão da herbivoria não resultou em um aumento da biomassa de algas, como observado na literatura. Entretanto, foi registrado um aumento na cobertura e riqueza das algas filamentosas nos tratamentos de exclusão da herbivoria, que ocorreram de forma elítica e epifítica. Com o aumento da cobertura de algas filamentosas, foi observado uma diminuição na cobertura de algas folhosas e calcárias articuladas, onde o último grupo apresentou uma relação positiva com a temperatura ao longo do experimento. As algas filamentosas também apresentaram uma relação positiva com a temperatura e em períodos de maior turbidez o crescimento de sua cobertura foi interrompido. No experimento de sucessão, a exclusão da herbivoria resultou em uma maior continuidade das espécies pioneiras na sucessão ecológica, as algas filamentosas. Entretanto, apesar da remoção da herbivoria a asesembleia de algas retornou a um estado de dominância de algas calcárias articuladas, um estado sucessional avançado. Os achados obtidos no presente estudo resultaram da baixa densidade de herbívoros raspadores (i.e. peixes- papagaio), capazes de retirar grandes porções de algas calcárias articuladas com sua alimentação, abrindo espaços no substrato para o assentamento de corais. Através da presente tese, se salienta e embasa a prioridade da criação de estratégias de manejo voltadas para a preservação de tal grupo, para que a saúde dos ambientes recifais seja garantida.