Corpos exauridos: relações de poder, trabalho e doenças nas plantações açucareiras (Zona da Mata de Pernambuco, 1963-1973)

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2012
Autor(a) principal: Marcelo Marques Ferreira Filho, José
Orientador(a): Paulette Yves Rufino Dabat, Christine
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Dissertação
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade Federal de Pernambuco
Programa de Pós-Graduação: Não Informado pela instituição
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Não Informado pela instituição
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/7916
Resumo: A história das condições de vida na Zona da Mata de Pernambuco é indissociável do processo de trabalho na agroindústria açucareira. Nos discursos da classe patronal canavieira, o precário estado de saúde em que se achava a classe trabalhadora não possuía vínculo com as relações de trabalho em seus domínios. A maior parte das doenças que acometiam os trabalhadores, bem como seu envelhecimento prematuro, era explicada como um processo natural da vida, ou ainda como má condição física, inerente aos indivíduos. Entretanto, na contramão de tal linha argumentativa, a presente pesquisa defende que uma série de fatores, condicionados historicamente, predispunha a classe trabalhadora do açúcar a acidentes e doenças decorrentes do trabalho. O objetivo do presente estudo é fazer emergir as conexões, nem sempre manifestas entre processo de trabalho, em sua categorização ampla, e doenças. Concentração fundiária, monocultura e regime de trabalho forçado compõem, basicamente, os elementos que marcaram a vida dos trabalhadores das terras do açúcar. Esta combinação produziu uma sociedade crônica e endemicamente patológica. Nesse cenário, a história das condições de vida e saúde dos canavieiros e operários do açúcar projeta-se em dimensões, ao mesmo tempo, distintas e inseparáveis: as deformações corporais e os efeitos deletérios de doenças e acidentes do trabalho que os atingiam, estavam intimamente relacionados à lógica capitalista de produção na qual se inseriam. A assistência médica aos trabalhadores era precária e permaneceu assim mesmo após a construção do Hospital Barão de Lucena, conhecido como Hospital das Usinas , em 1958. Através de uma análise pormenorizada de 6.290 prontuários médicos, buscou-se classificar o perfil dos trabalhadores atendidos (sexo, idade, município de procedência, setor de produção na agroindústria), bem como discutir seus problemas de saúde tomando por referência diversos riscos aos quais eram submetidos no trabalho. Ao mesmo tempo, um estudo detalhado com 3.256 processos trabalhistas das Juntas de Conciliação e Julgamento de Escada e Palmares entre 1964 e 1968 permitiu identificar os discursos das classes trabalhadora e patronal em torno das questões trabalhistas e condições de vida dos trabalhadores. O choque entre o aparato legal do Direito e da Justiça do Trabalho permitia que a maior parte das reclamações trabalhistas favorecesse o setor agroindustrial, perpetuando, sem alterações significativas, a miséria da classe trabalhadora. Dessa forma, a pesquisa permitiu reconstruir os caminhos pelos quais indivíduos saudáveis adquiriam o estatuto de doentes em potencial decorrente do trabalho. A naturalização das doenças do trabalho, no discurso da classe patronal canavieira, escondia o fato de que a exploração quase sem limites da mão-de-obra mantida, em certa medida, pela omissão consentida do Estado era o principal agente causador da maior parte das doenças dos trabalhadores. Quase como uma equação natural , as plantações de açúcar em Pernambuco instituíram, por meio de uma perfeita aritmética da exaustão , uma duradoura indústria dos corpos exauridos