Ações afirmativas com recorte racial no ensino superior e disputas de identidade nacional no Brasil

Detalhes bibliográficos
Ano de defesa: 2018
Autor(a) principal: PORTELA JÚNIOR, Aristeu
Orientador(a): SOARES, Eliane Veras
Banca de defesa: Não Informado pela instituição
Tipo de documento: Tese
Tipo de acesso: Acesso aberto
Idioma: por
Instituição de defesa: Universidade Federal de Pernambuco
Programa de Pós-Graduação: Programa de Pos Graduacao em Sociologia
Departamento: Não Informado pela instituição
País: Brasil
Palavras-chave em Português:
Link de acesso: https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/31840
Resumo: O trabalho analisa os discursos de identidade nacional brasileira presentes no debate acerca das políticas de ação afirmativa com recorte racial no ensino superior, entre os anos de 2004 e 2012. Partindo da compreensão de identidade nacional como construção discursiva, observamos como os textos opinativos sobre as ações afirmativas publicados no jornal O Globo construíram representações acerca da “memória histórica”, do “caráter nacional” e de “antecipações e orientações para o futuro” do Brasil. Sistematizamos os argumentos dos textos contrários e favoráveis às ações afirmativas, e mostramos como eles são acompanhados de posicionamentos acerca das relações raciais no Brasil, isto é, de um modo particular de interpretá-las. E destacamos que tais discursos são construídos a partir de diálogos interdiscursivos com discussões, temas e conceitos presentes, há décadas, no estudo das relações raciais no país. Mostramos que o discurso de identidade nacional construído pelos textos contrários às ações afirmativas acentua: uma “memória histórica” do Brasil que o caracteriza como uma nação fundada na mestiçagem, entendida tanto como sinal de uma população indistinguível em termos raciais, quanto como indicador de relações raciais harmoniosas; um “caráter nacional” em que o racismo e as distinções raciais não são considerados aspectos centrais; e uma “orientação para o futuro” que aponta para o perigo da “racialização” da sociedade representado pelas políticas de ação afirmativa. Argumentamos que os elementos definidores desse discurso de identidade nacional foram construídos em diálogo com as formulações de Gilberto Freyre acerca das relações raciais no Brasil, mas que adquiriram sua forma atual a partir do Seminário Multiculturalismo e Racismo, de 1996, e sobretudo nas obras de Peter Fry e Yvonne Maggie, principais formuladores teóricos desse discurso de nação, cuja marca é a revitalização e ressignificação do mito da democracia racial, agora visto como ideal civilizacional a ser alcançado. Já os textos favoráveis às ações afirmativas constroem: uma “memória histórica” que enfatiza, no passado, a escravização violentadora da população negra e o abandono por parte do Estado, quando do fim do regime escravocrata – e, no presente, um cenário de desigualdades a dividir brancos e negros, além da presença marcante do racismo; um “caráter nacional” marcado pela negação da existência desses problemas; e uma “orientação para o futuro” relacionada à possibilidade de as ações afirmativas contribuírem para a discussão dessas questões e a criação de uma igualdade de oportunidades. Mostramos que os diálogos interdiscursivos que orientaram essa representação de nação remetem ao Projeto Unesco, e à caracterização da democracia racial como “mito”, por parte de Florestan Fernandes e do movimento negro, bem como à reflexão de Abdias Nascimento e Kabengele Munanga sobre as especificidades do racismo no Brasil. A caracterização das desigualdades raciais é estabelecida no diálogo com a obra de Carlos Hasenbalg e com a ampla divulgação de pesquisas quantitativas no início dos anos 2000. Terminamos por observar como a noção de “mito da democracia racial” aproxima e distancia os dois discursos de identidade nacional, e acentuamos a impossibilidade de conciliação dessas posições, dados os seus posicionamentos acerca das relações raciais amplamente divergentes.