Ela vai para estudar e me ajudar em casa: vivências subjetivas de mulheres amazônidas a partir da inserção no trabalho doméstico
Ano de defesa: | 2024 |
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Autor(a) principal: | |
Outros Autores: | , |
Orientador(a): | |
Banca de defesa: | |
Tipo de documento: | Dissertação |
Tipo de acesso: | Acesso aberto |
Idioma: | por |
Instituição de defesa: |
Universidade Federal do Amazonas
Faculdade de Psicologia Brasil UFAM Programa de Pós-graduação em Psicologia |
Programa de Pós-Graduação: |
Não Informado pela instituição
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Departamento: |
Não Informado pela instituição
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País: |
Não Informado pela instituição
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Palavras-chave em Português: | |
Link de acesso: | https://tede.ufam.edu.br/handle/tede/10609 |
Resumo: | Trabalhar compreende um modo de engajamento subjetivo diante da pressão para a execução de tarefas delimitadas. As atividades assalariadas que envolvem meios de produção de mais-valia distinguem-se das atividades de produção de menos-valia. Assim, os trabalhadores assalariados podem ser divididos em dois grupos: os trabalhadores produtivos, que produzem e transformam a natureza nas fábricas, no transporte e no trabalho agrário, e os trabalhadores improdutivos, que realizam atividades no setor de serviços, como as trabalhadoras domésticas. Na organização do trabalho, que é construída a partir das necessidades institucionais ou de um grupo, desenvolvem-se padronizações e generalizações na forma de trabalho. O trabalho prescrito, no entanto, não abrange todas as atividades necessárias para a realização das tarefas no ambiente de trabalho. Essa organização pode ser vista como violenta para o trabalhador, pois limita seus comportamentos e sua subjetividade na execução do trabalho. O prazer e o sofrimento no trabalho advêm da dinâmica que ocorre no trabalhador, resultado do confronto entre o indivíduo e a empresa. O sofrimento se manifesta pela falta de comunicação e diálogo entre o patrão e o trabalhador, uma vez que não há a preocupação do patrão em compreender os desejos e a subjetividade do trabalhador, que muitas vezes se opõem às normas e regras estabelecidas. Mesmo que existam mobilizações subjetivas para lidar com as situações cotidianas no ambiente de trabalho, a longo prazo, caso o empregador não busque melhorias para oferecer condições adequadas de trabalho, o adoecimento pode se tornar presente, afetando aspectos importantes da produtividade e da organização do trabalho na empresa. As estratégias defensivas pessoais nem sempre são eficazes; elas se debilitam progressivamente, dando origem a novas formas de defesa, como as defesas secundárias: o adoecimento psicossomático e o adoecimento nas relações de trabalho. Diante do sofrimento, são desenvolvidas estratégias defensivas com o intuito paradoxal de preservar a saúde psíquica do trabalhador, permitindo que ele suporte as diversas situações do trabalho. Já as estratégias de enfrentamento buscam alterar, dentro do ambiente de trabalho, os aspectos que potencializam ou causam sofrimento ao trabalhador. Ao falarmos de trabalhadoras domésticas, estamos nos referindo a uma categoria específica de trabalhadoras, sujeitos de extrema invisibilidade e desvalorização, que não são adequadamente abordadas nas pesquisas atuais da psicologia, nem nas discussões sobre os vínculos tradicionais de emprego no contexto brasileiro e amazônico. O trabalho feminino na Amazônia, particularmente no setor doméstico, possui diversas pluralidades no que se refere às possibilidades de melhorias socioeconômicas para as mulheres da floresta. O tema desta dissertação insere-se no campo da Psicologia, com a Psicodinâmica do Trabalho e a Interseccionalidade como aporte teórico. O primeiro capítulo consiste em um estado da arte sobre o trabalho doméstico no Brasil nos últimos cinco anos. O segundo capítulo aborda a trajetória das mulheres amazônidas trabalhadoras domésticas, destacando quem são as entrevistadas, como surgiu a oportunidade de morar em casa de família e como foi a chegada até a nova moradia. O terceiro capítulo discute a organização do trabalho doméstico e a exploração vivenciada nessas casas. O quarto capítulo descreve as vivências de prazer e sofrimento no trabalho doméstico, enquanto o quinto capítulo examina as estratégias defensivas e de enfrentamento utilizadas pelas trabalhadoras domésticas. Os resultados indicam a escassa produção acadêmica sobre empregadas domésticas na região Norte do Brasil. As participantes da pesquisa foram mulheres amazônidas, trabalhadoras domésticas, que, durante a infância, adolescência ou início da fase adulta, receberam o convite para estudar ou morar em casa de família e migraram para a capital Manaus, no estado do Amazonas, Brasil. O convite, realizado por conhecidos, familiares ou como uma possibilidade de acesso à educação básica ou até mesmo ao ensino superior, inicialmente não era reconhecido por elas como uma forma de trabalho doméstico. No entanto, ao longo do tempo, essas trabalhadoras se deparam com uma realidade de exploração, que inclui trabalho infantil, trabalho escravo, condições precárias e exaustivas de trabalho. O trabalho realizado por essas mulheres é desvalorizado, mas, na ausência de sua execução, elas são punidas, o que gera desconfortos, conflitos, desconfianças e adoecimentos que perduram até os dias atuais. Essas trabalhadoras domésticas tinham direito a um lugar para morar e a um horário para ir à escola, sendo que ajudar em casa e atuar como babá não era considerado trabalho. Assim, formava-se uma relação de obediência, em que as trabalhadoras realizavam as tarefas necessárias nas residências onde moravam, muitas vezes antecipando o trabalho enquanto os demais moradores dormiam. Apesar da dedicação dessas trabalhadoras, situações como assédio moral, assédio sexual e acusações de roubo foram vivenciadas, levando as trabalhadoras a desenvolverem estratégias pessoais para lidar com essas situações de exploração em casas de família. Por fim, observamos que os afetos desempenharam um papel mobilizador entre as trabalhadoras, sendo usados de forma contínua para impedir o rompimento dos vínculos de exploração, o que resultou em uma culpabilização desproporcional à situação vivida. Esse tipo de vivência se perpetua, especialmente quando consideramos a cultura de apadrinhamento presente na sociedade brasileira. Tais temáticas devem ser discutidas nos mais diversos setores da sociedade. Como forma de prevenção e promoção da saúde dessas trabalhadoras, uma possível solução seria a implementação de políticas públicas eficientes, capazes de divulgar e orientar sobre a exploração e o trabalho escravo contemporâneo, que se manifesta no trabalho doméstico disfarçado de “ajuda em casa” ou “somente auxiliar nos afazeres domésticos”. |