Resumo: |
Marina Silva, nortista, mulher negra de origem pobre, ganhou projeção no cenário da política nacional após participar de três processos eleitorais para a Presidência da República. No primeiro deles, em 2010, obteve mais de 19 milhões de votos, conquistando ali o terceiro lugar. No segundo processo, em 2014, Marina também conseguiu o terceiro lugar, com 22 milhões de votos. Já em 2018, obteve resultado inexpressivo, com apenas pouco mais de 1 milhão de votos, ficando em oitavo lugar. Diante desse cenário, esta pesquisa buscou entender como Marina Silva é percebida pelo público enquanto figura política, no cenário político brasileiro dominado em sua maioria por homens brancos. Ao se dirigir para o comentarista, o sujeito receptor, a investigação pretende compreender como ele se apropria das mensagens midiáticas, se ele dá novos significados àquelas ou se corrobora com os significados já estabelecidos nos processos socioculturais e os amplia (BARBERO, 2003). A ideia nasceu da nossa observação de um discurso difuso, nas mídias sociais, que questiona a capacidade de Marina Silva pela sua “fragilidade” física e emocional, aspectos que fazem parte da construção social do gênero feminino, como afirmam Beauvoir (1970) e De Lauretis (1994). Esses elementos são, no caso de Marina, ressaltados pela sua condição física, resultados do histórico de doenças contraídas quando morava em região de floresta, no Norte do país, e dos cuidados médicos decorrentes. Neste estudo, analisamos comentários de internautas feitos a partir de postagens de Marina em seu perfil no Twitter em 2020, em que ela deixa claro sua oposição ao governo de Jair Bolsonaro. A escolha dessa plataforma se deu por entendermos a importância dela na arena política atual, em que as estratégias partidárias são fortemente midiatizadas, e os algoritmos das mídias sociais colaboram para fomentar a desinformação e o discurso de ódio em torno dos processos políticos. No total, analisamos 935 comentários, seguindo o método da análise de conteúdo (BARDIN, 1977). Como resultado, as críticas e rejeição que encontramos, por parte da maioria dos interlocutores nas postagens selecionadas, não estão ligadas aos seus posicionamentos políticos, mas têm uma carga de violência com caráter racista e misógino. Encontramos caracterizações dela como “sumida” da cena pública e discursos que a desumanizam através de ataques violentos à sua aparência física, comparando-a com animais e extraterrestres. Reconhecemos que essas representações fazem parte da construção social da mulher negra, algo que encontramos nos estudos interseccionais de gênero e raça (GONZALEZ, 2020), que mostram justamente como a mulher negra vem sendo invisibilizada e animalizada por conta de sua potência física ao longo do tempo. Marina, no entanto, parece se afastar também desta última representação, e aqui parece como um ser bestializado, e que, por isso, deve ser eliminado, associado ainda a preconceitos regionais, devido à sua origem nortista. Ressalta, assim, a necessidade de se combater a violência de gênero e raça também no campo político, e fortalecer estratégias de transparência nas redes sociais. |
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